EU AMEI QUEM NÃO DEVIA AMAR

   Nossos olhares se cruzaram e aquela cena que durou menos de sessenta segundos mexeu comigo. Foi assim de repente que o meu coração pulsou exageradamente, foi como se a flecha do cupido tivesse me atingido em cheio e me deixado ababacado por aquela linda mulher que acabara de chegar para proferir uma palestra na empresa onde eu fui recentemente contratado. Ela olhou para todos os presentes antes de iniciar a sua fala, mas para mim eu senti que foi um olhar especial, inclusive com um discreto sorriso que saiu daqueles lábios carnudos. Tinha quase certeza que ninguém havia pressentido aquela ação involuntária dessa jovem senhora que se apresentou com o nome de Morgana, mas eu fiquei impaciente e até abismado com essa situação que eu mesmo identifiquei como real. Depois disso ela não mais dirigiu seu olhar para mim, foi como se tivesse me ignorado, mas eu estava em uma plateia repleta de colegas de trabalho e visitantes e isso era natural, mas eu continuei "necessitando" dos seus olhos em minha direção, me senti seu servo no aguardo de uma nova "investida" dela, o que não ocorreu. Mas... e se essa mulher for comprometida? Ela não é tão jovem assim, calculo que deva ter uns quarenta, quarenta e pouco, bem mais do que a minha idade que é apenas vinte e oito anos. Porém isso não vem ao caso, o que interessa nesse momento é que meu coração se apaixonou, pode até ser esquisito, impossível, sei lá! Foi amor a primeira vista, é isso. Pode ser estranho para qualquer um, mas para mim não é, aconteceu, não tive culpa, gostei dela, me atraiu, mexeu comigo sem que fosse preciso um galanteio, um jogo de charme, qualquer coisa numa aproximação entre duas pessoas.

   Fui contratado por essa empresa como encarregado de manutenção de equipamentos de informática há exatamente três meses, era o meu sonho enquanto desempenhava a função de encarregado de obras de uma construtora, o salário era bom, mas esse era praticamente o dobro. Sobre mim, sou um rapaz que saiu de um relacionamento meio conturbado e procurou viver uma vida tranqüila, sem aperreios e cenas de ciúme, não estava mais agüentando e decidimos romper e dar um tempo, talvez a gente reatasse depois se Sílvia melhorasse o seu comportamento, afinal eu gostava dela e até já tínhamos planos para o casamento. Estava com ela há quase dois anos, nos dávamos bem, só que de uns tempos para cá ela mudou e começou a pegar no meu pé sem motivo aparente, cismou que eu tinha outra e ficou me marcando de perto, o que eu não aceitava, razão de algumas briguinhas e discussões.

   A palestra teve início, Morgana iria palestrar sobre comportamento humano e isso me deixou interessado. Procurei um lugar bem mais perto, queria estar mais na visão dela, talvez seu olhar me fulminasse e aí tudo seria resolvido. Até aí eu nunca a tinha visto, era completamente uma estranha, mas nesse momento, depois daquele olhar que me pareceu natural, eu quiz interpretá-lo como intencional, ela passou a me interessar mais do que a palestra. Escutei atentamente tudo que falou, durou em torno de uma hora e meia a sua palestra, seus olhos olhavam para cada espectador, inclusive para mim, só que eu via isso como intencional, direto e quase como um convite para "algo mais" além do assunto em pauta. Durante sua apresentação ela fez algumas perguntas para os presentes e as respostas eram sempre sinceras, alguns se acanhavam em responder por conta da timidez, outros eram motivos de risadas. Em dado momento ela me olhou diretamente e perguntou se eu tinha alguma pergunta para fazer ou alguma dúvida que me assaltava. Foi aí que meu coração disparou e procurei falar com sinceridade a respeito do problema que ora enfrentava. Na verdade eu apenas criei coragem para lhe dirigir a palavra, queria um contato direto, tête a tête, com ela, mas no fundo eu estava sofrendo, imaginando mil coisas com ela, sobre ela, sobre nós. O que ela me fez entender sobre o meu problema é que a solução existia, que tudo iria depender de ambos, momento em que falou de sua própria pessoa e que era casada, bem casada e nada faria com que a sua união com seu marido fosse por água abaixo. Foi como se um balde de água fria fosse jogado sobre minha cabeça e me fizesse despertar para a realidade.

   A reunião terminou, eu fiz questão de agradecê-la por suas palavras de incentivo, mas eu estava ali diante de Morgana, ou dona Morgana, imaginava aquele "amor" que surgiu de repente, aquela "paixão" inesperada que abalou meu coração sem nem mesmo eu entender a razão. No fundo queria apenas chegar bem pertinho dela, ouvir sua voz, apreciar seu sorriso e dar-lhe os parabéns merecidos por tão brilhante palestra. Se ela soubesse o que passei nem sei como reagiria, mas eu fiz o possível para esquecer esse meu estranho desejo e procurar saber se a minha namorada estaria apta para continuarmos com o nosso romance.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 24/07/2022
Código do texto: T7566820
Classificação de conteúdo: seguro