O VULTO DO PARQUE

   Eu vejo apenas um vulto a caminhar pelo parque, ou imagino ver, nem sei na verdade o que se passa comigo. Posso estar vendo coisas que ficaram gravadas em meu cérebro durante longos anos e agora despertando como um vulcão a vomitar tudo que estava guardado lá no fundo. Uma tristeza imensa invadiu minh'alma, assim quase de repente, eu que há pouco tempo nem me lembrava mais de tudo que vivi, mergulhado numa solidão, fui acometido dessas lembranças vindo a tona e me deixando a mercê da minha própria sorte. O silêncio era meu companheiro inseparável, com ele presente em minha vida eu jamais imaginei encontrar outro alguém que satisfizesse os meus desejos, mas agora vejo a todo momento aquela imagem no parque, o nosso local preferido durante um bom tempo de uma vivência praticamente feliz. Eu era feliz, eu acreditava nessa hipótese, tenho absoluta certeza, porém o destino mudou todos os meus planos me colocando sozinho no mundo sem mais vontade de amar outra pessoa, não seria possível.

   Eu costumava passar pelo parque todas as vezes que ia ou vinha do trabalho, ele era aconchegante, florido e cheio de pessoas circulando ou fazendo caminhadas, casais de namorados conversavam animadamente, crianças brincavam em balanços e escorregos ali existentes. Eu sentia uma imensa felicidade quando por ali passava, até ria sozinho tamanho era o meu prazer. E foi ali que conheci Laura, uma morena de longos cabelos pretos e muito comunicativa. Começamos a namorar e aquele parque se tornou nosso "ninho de amor". Nos divertíamos bastante, freqüentávamos bares e restaurantes da cidade, curtíamos as noites em baladas ou tomando um drink na praia, mas o nosso recanto preferido era aquele parque.

   Os anos se passaram, fizemos juras de amor e planos para o futuro, estávamos seguros de que a nossa felicidade era inabalável, tínhamos essa certeza. Porém o destino nos traiu e numa fatídica noite de sábado, quando voltávamos de uma festinha com amigos, nosso carro foi atingido por um outro que era dirigido por uma pessoa embriagada e capotamos sem chance nenhuma de evitarmos a colisão. Laura foi atingida em cheio e faleceu no local do acidente. Eu tive alguns ferimentos e me recuperei com o tempo, mas a lembrança da minha amada me deixou abatido e sem vontade de viver. Isso durou anos até que, com grande esforço, consegui superar, no entanto nunca mais procurei outra pessoa para me relacionar, meu coração ficou muito ferido e eu achava que mais ninguém preencheria a minha vida.

   O parque parece não ter ninguém, para mim tornou-se um local ermo, nunca deixei de freqüentá-lo, ele alimentava a minha ilusão e até a minha vida. Me tornei um homem sem rumo, minha única "diversão" passou a ser aquele parque onde passei a imaginar a presença de Laura. Eu a via sempre quase todas as noites, seu sorriso me dava uma força para continuar vivendo. Me sentava em um banco onde sempre ficava com ela como a aguardar a sua chegada. E lá vinha ela, toda elegante como sempre foi, com aquelas roupas que eu já conhecia, mas ela não vinha até mim, apenas passava e me cumprimentava, mostrava o seu sorriso e ia embora. Voltava depois, sorria. E eu fui me acostumando com sua "presença" constante no parque. Não sei até quando isso vai durar, mas enquanto eu estiver vendo a sua imagem, o seu vulto, vou permanecer indo ao parque, não vou deixá-la sozinha.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 28/09/2022
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