A casa do Mar e Um Pote de Geléia de Amoras Silvestres

Ela ficou lá por algum tempo, olhando para a tremenda bagunça na sua mesa.

Papéis desordenados, vários cartões, cinzeiro, enfim..uma coletânea considerável de traquitanas importantes ou não, espalhadas sem a menor cerimônia.

Começou lentamente a organizar tudo sem muito ânimo, quando se deparou com

a mensagem dele.

Pegou-a, leu...releu... Seu olhar perdeu-se no vazio.

Acendeu um cigarro e enquanto olhava, sem nada ver, transportou-se em lembranças para o chalé a beira-mar.

Realmente gostava de lá. Transmitia-lhe paz e até aguçava-lhe a imaginação.

Olhou novamente a mensagem dele e então se lembrou do pote de geléia.

Sorriu pensando no universo de emoções que pode conter um simples potinho de vidro, nem tão grande assim!

Desviou as lembranças para seus próprios potes armazenados, sem rótulos, na prateleira. Pousou distraidamente os olhos em alguns deles.

Sorriu um sorriso enigmático e decidiu que, por hora, não era tempo de fazer geléias. Voltaria à casa do mar, com certeza.

Talvez tente fazer compotas! Uma variação de geléia — Sorriu, pegou uma folha em branco e escreveu rapidamente :

"Meu querido vizinho,

Estamos em tempo de reflexão, quer queiramos ou não fazê-las, parece que nesta época elas se nos impõem à revelia.

Por outro lado, o próprio atropelo da situação não nos deixa muito espaço.

Eu particularmente não gosto destas datas. Não mais! De qualquer forma, não por ser uma imposição implícita de comportamento, mas porque é mesmo o meu desejo sincero. envio a você os meus votos de um próximo ano com amplas perspectivas de sucesso. E o meu compromisso de encontrá-lo em breve lá na casa do mar. Quem sabe se depois de passados estes dias conturbados, não possamos os dois tentar fazer uma receita diferente, que possa ser guardada numa forma em vez de pote?

Podemos pensar num recheio diferente e tenho certeza que ambos temos imaginação suficiente pra isso.

Um beijo grande, com muito carinho.

Antonella”

Não voltou à casa da praia. Nunca mais o viu.

- da série “Cartas de Antonella” -

Asta Vonzodas
Enviado por Asta Vonzodas em 12/02/2008
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