Minha pequena metrópole

Minha saudade é grande. Às vezes fico triste por não tê-lo ao meu lado, no entanto, sei que a dura decisão tomada por mim há trinta anos atrás foi a mais sensata.

A seca tomava conta de toda a região. Nossa cidade ficava no meio do sertão e o gado morria de sede. Todos os dias eu tinha que andar no lombo do burro por mais de 5 km para conseguir água para cozinhar o feijão e matar a sede. Quando liberavam mais de um galão por pessoa, conseguia tomar um banho.

Minha companheira morreu no parto do meu primogênito. Sozinho eu não tinha como criá-lo de forma digna. De tanto rezar, fui atendido. Uma médica que passava pela cidade me pediu a criança. Relutei, chorei, e finalmente cortado por dentro decidi entregá-lo aquela senhora.

Hoje recebi uma carta do meu filho. Ele me descobriu e quer me conhecer. Fiquei muito emocionado e decidi encontrá-lo. Ele me mandou o dinheiro da passagem e um telefone para eu ligar tão logo chegue à rodoviária de lá. A distância entre a minha cidade e a dele é de 1.500 km.

De tanta ansiedade os dois dias que viajei pareceram meses. Finalmente cheguei em São Paulo. Estava muito assustado com o que estava vendo. Muita gente, muito carro, fumaça, barulho, sujeira, grandes prédios de vidro, rapazes de roupas coloridas seguravam cartazes, outros distribuíam folhetos de lojas, nos sinais de trânsito palhaços faziam malabarismos para descolar alguns trocados e ouvi até tiros.

Apesar de assustado, peguei o papel com o telefone e liguei para o meu filho.

- Alô, eu queria falar com Pedro.

- Quem gostaria?

- É José Gondim, o pai dele.

- O pai dele? (perguntou a criança que atendeu ao telefone)

- É... não, diga a Pedro que é o homem que veio do interior.

Esperei um pouco na linha até uma voz grossa me emocionar.

- Pai, você chegou?

Demorei alguns segundos para responder, pois estava chorando.

- Sou eu, José. Já estou na rodoviária.

Não ouvi mais nada. Somente o sinal de ocupado.

Pouco mais de meia hora, tive o momento mais feliz de minha vida. Abracei o meu filho após trinta anos. Conheci os meus netos, minha nora e logo ficamos amigos. Uma semana depois, Pedro resolveu me levar para passear. Saímos de manhã cedo e passei por experiências inéditas; andei de metrô, de elevador, fui ao shopping, ao estádio de futebol e terminei o dia num restaurante em cima de um prédio muito alto.

Como tudo tem início e fim, chegou à hora de voltar pra casa. Apesar da insistência do meu filho para que eu ficasse morando com ele, creio que o meu lugar não era naquela cidade. Passei mais alguns dias e retornei.

A despedida na rodoviária foi triste, porém festiva. Meus três netos foram me deixar e fizeram muito barulho. Brincaram, cantaram e finalmente me abraçaram, me deixando muito feliz. Recebi um forte abraço de Pedro e subi para o ônibus. A volta foi ainda mais lenta. Olhando pela janela, observei cada cidade por onde passava. Constatei que ainda existe muita pobreza no meu país. Cidades sem água, outras sem energia, ruas de areia, esgotos correndo nas calçadas, casas de barro, crianças tristes pedindo esmolas na pista...

Após dois dias, por volta das sete horas da noite, no meio daquele sertão, avistei a minha pequena metrópole. As luzes dos postes da praça já estavam acessas. À medida que o ônibus se aproximava, eu me alegrava mais. As casas apesar de pequenas eram feitas de tijolo, a água era encanada, as crianças sorridentes brincavam na praça onde existia uma quadra de esportes, senhoras se dirigiam para a igreja sem medo de serem assaltadas e os meus velhos amigos se aglomeravam no bar do Zeca, onde tinha uma televisão colorida para assistir o jogo da seleção.

Logo, o ônibus parou na rodoviária, que apesar de pequena era muito limpa. Não hesitei. Ao pisar no solo de minha pequena metrópole, beijei o chão e agradeci a Deus por ter voltado.

Aqui é o meu lugar...