O Forasteiro.

Sem forma, sem cor, sem formalidades. Apenas um gosto de fel percorria sua boca e um sentimento sufocante invadia um corpo moribundo. Ele não sabia o que fazer quanto a isso, somente tinha a certeza de que estava morrendo. A cada dia. A cada hora, minuto ou segundo.

Seu corpo era um monumento à morte. Ele sentia isso. E sabia que todas as pessoas ao redor sofriam do mesmo mal. Talvez fosse por isso que a humanidade se entrega a deuses na esperança de um paraíso pós-morte, ou então, procuram realizar grandes feitos para entrar para a história. No fim é tudo medo do vazio, do gosto de fel que percorre a boca de todos e não os deixa sentir o doce da vida.

O que mais lhe passava pela a cabeça era uma pergunta incessante, neurótica para ele. Se essas pessoas sentem o que sinto, como conseguem viver dessa forma, por que apenas existem no automático?

As pessoas à sua volta apenas comiam, bebiam, pagavam suas contas, sustentavam seus casamentos, criavam seus filhos. Mas ele não conseguia perceber de fato vida em seus olhos, em seu ser. Por que todos corriam rumo a lugar nenhum, em uma busca frenética de nada?

Queria cortar seus pulsos e, com isso, fazer uma ode para sua mediocridade, mas somente os vermes que o devorariam poderiam comungar com ele toda a beleza de seu feito, as pessoas normais não entenderiam, iriam o condenar.

“Não dê perola aos porcos, eles se contentam com lavagem.”, pensou.

Não adiantaria fazer de seu cadáver um monumento à morte suprema. Ao vazio existencial que todos sentimos. Isso soava pós-moderno demais, para não dizer idiota.

Juntou então alguns trapos. Tudo que realmente fosse essencial. Duas calcas, duas camisetas, três cuecas e três pares de meia, uma barraca, um caderno e uma caneta. Tudo que precisava.

Não se prenderia mais ao passado, não se preocuparia mais com o futuro, nem com sua morte, nem com sua vida. Apenas o presente e o agora existem. Está é a lei. Seu novo pensamento.

Ligou gás do fogão de sua casa, deixou vazar. Fez um lindo caminho de álcool da cozinha ate o quintal de sua casa. Acendeu um cigarro e jogou o isqueiro sobre o álcool, este foi seu ultimo cigarro. Viu sua casa explodindo e pegando fogo, não se sentiu mal, sentiu-se aliviado. Era como uma tartaruga se livrando do casco.

Virou as costas e foi embora. Nunca mais voltou. Nunca mais visitou o mesmo lugar duas vezes. Viveu um dia de cada vez. Parou de sentir o aquele gosto amargo de fel na boca. Tudo havia virado doce, tanto suas dores quanto sua felicidade.

Aguardo seu comentário. Não apenas sobre como esse texto está escrito, isso também é muito importante e ajuda-me a sempre melhorar minhas letras. Mas, o que realmente me interessa é a relação entre o texto, como obra viva e independente, e você, leitor. A que ele o remete, como, por que? Essa é a beleza de um texto: um sentimento meu cristalizado, conecta-se a um sentimento seu e, assim, torna-se um sentimento universal.

Obrigado.

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