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AO SOM DE ALGUNS BOLEROS...

 

Era sexta-feira. Uau! Dia de baile para Elvira, naquele salão imenso, onde freqüentava há cinco anos, juntamente com suas duas inseparáveis amigas. Nesse dia, pedia a sua patroa, Dona Luciana, que a liberasse mais cedo de suas tarefas domésticas. Precisava dar um trato no visual. Cabeleireiro, manicure, escolher uma roupa que se ajustasse melhor ao seu corpo – um pouco fora de forma – e, pontualmente, às 23:00 hs., as três se encontravam na porta do salão, para entrarem juntas, tais fossem celebridades! Triunfantes! Era assim que elas se sentiam.

 

A mesa de sempre já se encontrava reservada – um dos garçons era marido de outra amiga, de muitos anos -  e dava uma forcinha, reservando aquela mesa, em local estratégico. Dali elas podiam ver tudo o que acontecia no salão e, o mais importante, ficavam à mostra dos cavalheiros que as tirariam para dançar. E elas eram muito solicitadas!

 

Elvira tinha uma paquera há um tempo, mais ou menos uns três anos, que ficava sempre esperando por ela para dançarem, ao som daquelas belas e românticas canções: Ray Conniff, Frank Sinatra, Bee Gees, Roberto Carlos, Altemar Dutra... Boleros românticos, que lhe permitia dançar agarradinha ao seu escolhido. Um sonho! Muitas vezes eles até se isolavam em uma mesa que ele – Paulo – também reservava, para ficarem a sós, se tocando com as mãos, fazendo carícias, trocando beijos e confissões. Ela o amava e, ao que parecia, ele também a queria muito!

 

Porém, por mais que Paulo insistisse, nunca havia passado daquele ponto. Sempre deixava o coitado na mão e ela também, pois o desejava. Sonhava, continuamente, com uma bela noite ao seu lado, na cama, fazendo tudo o que a paixão lhes permitisse. Mas continha-se. Tinha vergonha de mostrar-se com aquelas gordurinhas a mais. Seu sonho era fazer uma plástica para poder despir-se para ele, sem  nenhuma timidez. Já não era mais jovem e seu rosto e o corpo, mostravam os sinais da vida dura que havia levado.

 

Elvira, apesar da pouca instrução, lia todas as revistas de moda, em que o assunto principal era mulheres lindas, perfeitas! Ela mesma, em sua juventude, havia sido muito bonita. Uma morena de tirar o fôlego. Não era à toa que os homens de sua cidade – um pequeno vilarejo, no interior de Minas Gerais – suspiravam quando a viam passar, rebolando seus belos quadris, seios empinados, rosto lindo, olhos cor de mel. Teve alguns namorados, mas nada sério. Nunca amou  alguém de verdade, nem sabia como era sentir as batidas fortes do coração ao apaixonar-se.

 


E foi o que fez. Enfim, trabalhava na residência de dois conceituados cirurgiões plásticos e, criando coragem, um belo dia, confessou seu sonho à Dona Luciana, que se propôs, imediatamente a atender o seu pedido, o que achou muito justo. Afinal, ela estava naquela família desde os 15 anos de idade, quando veio de sua cidade, trazida por sua mãe, que estava grávida dela – Dona Luciana – e tinha sido sua babá, acompanhou seu crescimento, formatura e, quando conheceu seu marido – Frederico, na Faculdade de Medicina e com ele se casou, a mãe lhe cedera Elvira que, igualmente, a ajudou a criar seus dois filhos, agora adolescentes. Nunca se casara, nem tivera os seus filhos.


Então, em seu período de férias, sua patroa contratou uma substituta para ela, internou-a em seu Hospital e realizou a tão sonhada cirurgia plástica. Retirou todas os excessos de gordura que havia em seu corpo,  cortou-lhe as teimosas rugas – efeito do tempo – ao redor de seus olhos e encaminhou-a à Nutricionista, para que lhe prescrevesse uma reeducação alimentar, que somente a cirurgia não resolveria o problema. E assim foi!

 

Dois longos meses de recuperação, período em que ela teve toda a atenção de seus patrões, cuidando dela como alguém da família que, na verdade, era o que ela havia se tornado. Até que, retiradas as faixas e a cinta usada no abdômem, ela olhou-se no espelho e viu outra pessoa. Magra, sem gorduras localizadas, linda! O rosto lisinho, quase tão belo como fora em sua juventude. Agora, aos 60 anos, julgava-se com 30, no máximo. Exagero?! Talvez... mas sentia-se bem, imaginando-se, novamente jovem e bela!

 

Convidou as amigas, após três meses ausente do salão de baile – período em que elas continuavam freqüentando, todas as sextas-feiras – e lhe levavam notícias de Paulo, o seu amado, que, nas primeiras semanas apareceu mas, depois, deu um sumiço. Ninguém mais o viu por lá. Nem mesmo os garçons, seus amigos, souberam de seu paradeiro. Mas Elvira tinha esperanças. Seu coração lhe dizia que, naquela noite, a de sua reestréia, ele lá estaria, para admirar a outra pessoa em que ela havia se transformado. E, aquela noite não passaria em brancas nuvens. Iria aceitar o insistente convite para irem a seu apartamento – ele era viúvo, morava só  - e viveriam aquela noite de paixão, tão esperada pelos dois! E ela tinha pressa. De fazer amor com ele, de mostrar-se, com o novo visual mais jovem, muito embora ele também não fosse mais nenhuma criança. Já estava lá pela casa dos 68 anos. Um pouco mais, talvez...

(Continua.......)

Um mimo da amiga Cássia Dias:
http://www.recantodasletras.com.br/audios/poesias/13154
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