Sedução à moda antiga

Nove moças no castelo. A décima chegara há dois meses. Viram-lhe apenas a silhueta em sua chegada, e bastou para que a cidadela ficasse em polvorosa. Cocheiros, donos de armazéns e pequenos comércios acendiam novamente as esperanças de casarem bem seus filhos varões.

As moças do castelo não eram ricas nem beldades, e o castelo era assim chamado por causa da estrutura de sua antiga construção. Quatro das meninas eram filhas da casa e seis moças vinham a trabalho. A última é que causara todo o novo entusiasmo e despertara o pacato lugar para sonhos e fantasias.

Tudo porque não se vira de meiga donzela quase nada, exceto um pedacinho do rosto bem feito descoberto dos trajes da viagem. Sabiam que vinha para ensinar às meninas menores noções de bordados e costuras manuais. O dia em que caiu doente a notícia correu. Mas como? O que tinha a pobre? Algum mal crônico? Viera tratar-se, mudando de ares?

Quando as crianças iam ao armazém buscar na pressa farinhas ou frutas para os pratos do almoço, os homens perguntavam pela doentinha ou o dono do armazém cotucava a mulher para que perguntasse e assim a curiosidade parecesse mais natural.

_ Ela já está melhorzinha. Mas o doutor falou que ela ainda está muito fraca _ disse a menina menor, e isto foi tudo o que puderam saber. Depois de alguns dias, para a surpresa de todos, não foi ela mesma à sacada tomar um ar, sentadinha na cadeira, ao sol da manhã? Os moços não disfarçavam, atravessavam a rua e punham-se a espiar a moça sem nenhum cuidado ou cerimônia. Ela é que, distraída ou não refeita, não se dava ao gosto de olhar os pretendentes, até que um arriscou:

_ Está melhor a moça? Nenhuma resposta. Os concorrentes começaram a rir do inquiridor, que falou, dessa vez, mais alto:

_ A jovem da sacada recuperou-se e está agora a aproveitar-se do sol da manhã? Linda manhã, não? _ O rapaz não notou que o dono do castelo vinha apressado em sua direção, passos largos e decididos, olhar fixo, cenho franzido:

_ O senhor pode explicar essa gritaria perturbando o nosso sossego? E os senhores, o que estão a olhar todos para os nossos aposentos? Parece que querem arrancar cá para baixo com os olhos as minhas moradoras? Não vêem que... _ dizia, voltando-se aos outros. A mulher do homem apareceu à porta e pôs-se também ela a gritar, mas para o marido:

_ Não vês que o balcão está ao deus-dará e te juntas a essa cambada? _ De repente a moça lá em cima teve uma vertigem e caiu no chão da sacada. Correram a acudir. O moço mais afoito subiu junto, era quase médico, pois não? E naquele dia o médico quase formado prestou grande serviço ao castelo. Foi a única pessoa de fora a conseguir ver o rosto da moça, ouvir-lhe a fala, pegar-lhe o pulso, medicá-la na ausência do médico local em viagem recente à Europa com a esposa e levá-la consigo para a capital.

Soube-se depois que se casara com Lindaura, que ficou sem rosto na memória do povo do pacato lugarejo que nunca mais teve qualquer alvoroço.

Neusa Storti Guerra Jacintho
Enviado por Neusa Storti Guerra Jacintho em 12/10/2008
Reeditado em 29/11/2009
Código do texto: T1224117
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