LEMBRANÇAS DE UM INTENSO AMOR

Dna. Leonor, aos seus 80 anos, tinha a rotina de todas as tardinhas sentar num banco em seu jardim. Lá ela contemplava, antes do por do sol, as belezas de suas flores, cuidadas com tanto zelo pelo seu jardineiro, o céu azul e as montanhas ao longe que davam um colorido especial à paisagem. Perdera seu marido, ainda jovem, aos 46 anos, num acidente de trânsito. Neste mesmo local os dois sentavam todas as tardinhas, no mesmo horário, onde conversavam sobre os afazeres do dia a dia e trocavam juras de amor. Seu marido era uma pessoa culta e querida na sociedade. Tratava a todos com o mesmo entusiasmo e com o mesmo amor. Buscava a harmonia e o viver bem de todas as pessoas da comunidade.

Esta tarde Dna. Leonor estava mais sensível. Começou a lembrar dos bons tempos com o seu Gustavo (nome do seu marido). Uma lágrima brotou dos seus olhos.

Lembrava que todas manhãs, ainda quando dormia, seu Gustavo – antes de ir para o trabalho - se inclinava e dava-lhe um beijo na face. Ela acordava sonolenta, sorria e voltava a dormir. Lembrou as inúmeras cartas que recebia quando seu Gustavo se ausentava por interesses profissionais. Eram cartas lindas, cheias de amor e as quais elas as mantém guardadas até hoje. Frases como: “...longe de ti mas sinto o teu perfume no ar me envolvendo como se fossem teus braços. Sinto o calor do teu corpo queimando meu desejo de estar contigo. Sinto teus lábios mal tocando os meus num desejo involuntário de unirem-se e selar o nosso grande amor. Sinto uma imensa saudade que inebria minha vontade de trabalhar. E tantas outras frases que traduziam o intenso amor que os envolvia.

Neste momento, escuta a voz de Carlos, de 50 anos, médico, e filho adotivo. Ele, como de costume, sempre passava para visitá-la e, às vezes, jantavam juntos. Ela paralisa momentaneamente seus pensamentos. Carlos se retira e vai para dentro de casa pois tem algumas ligações para fazer.

Dna. Leonor volta a pensar longe. Sorria quando se lembrava do intenso amor que viveu e da união que existia entre os dois. Ela o amava com todas as suas forças. Novamente seus olhos marejaram. Com o lenço ela os secou.

O acidente veio à tona. Um motorista embriagado tinha causado o acidente e a morte precoce do seu marido. Foi um fato muito comentado que lhe tirou longas noites de sono e de tranquilidade. Entrou numa depressão e graças às orações que fazia todas as noites e a vontade de continuar a viver, superou a intensa dor desta tragédia. Num ato de grandeza chegou a perdoar a pessoa que lhe trouxe tanta mal.

Carlos, trouxe um cálice de vinho e deu-lhe um beijo na testa. O mesmo procedimento que seu Gustavo fazia todos os dias. Quantas vezes Carlos deve ter visto esta cena. Carlos amava os dois e sempre agradeceu o amor e o carinho que eles lhe deram na sua criação e a educação que eles lhe tinham proporcionado.

Ela olhou fixa para o horizonte, passou o lenço nos olhos e murmurou: quanta saudade, breve estaremos juntos e sentaremos neste banco, todas as tardinhas, de mãos dadas.