Angola - O Jardim dos Anjos - Os diamantes do Quitexe

Durante os meses de inverno, a Dª Maria Clara ía todas as terças-feiras ao cabeleireiro. Gostava sempre de se sentir bem arranjada.

Passava pela Praça Sá de Bandeira e andava em direcção à Rua Capelo e Ivens, em Santarém. Ela detestava os invernos ribatejanos.

Naquela tarde, quando se sentou em frente ao espelho do salão, sentiu, com mais preocupação, as marcas da idade.

-Como o tempo voa.

-Você está muito bem para a idade – disse a Dª Augusta, também cliente assídua.

No salão, todos se sentiam como se estivessem em casa.

Dª Maria Clara passou as mãos pelos cabelos brancos e disse:

-Se o arrependimento matasse…

-Vá lá, Maria Clara, pára lá com essas coisas!

-Não é nada disso, Augusta. Simplesmente tenho um segredo que, se eu morrer, vai comigo para a cova.

-Um segredo?

Todo o salão parou para ouvir aquela senhora de 77 anos bem estimados.

Sem tirar os olhos do espelho, prosseguiu:

-Em 1974, eu vivia em Angola, na província do Uíge, numa vila simpática chamada Quitexe. Quando começaram os ataques dos terroristas, o meu marido começou a vender tudo. Vendeu as terras, os campos de café. Pronto. Vendeu tudo e eu nunca concordei.

Mas ele foi vendendo e comprando diamantes. Ás vezes, eu dizia que o dinheiro se gasta e a terra fica. Ele respondia a rir que eu bem sabia que os diamantes são eternos.

Já em 1975, ele tinha duas garrafas de vidro de 75 centilitros cheias de diamantes.

Não sei bem como aquilo acontecia, se era o desespero de fugir ou o de ficar, mas a verdade é que se adquiriam diamantes com muita facilidade.

Às vezes, à noite, naquelas noites mais entusiasmadas dos casais, brincávamos com os diamantes na cama.

-Vocês brincavam com diamantes na cama?

-Sim, brincávamos.

Maria Clara percebeu um rubor na sua face que não conseguiu evitar, tal como, uma euforia amigável nas amigas do salão.

Continuou.

-Durante as semanas seguintes a situação agravou-se e ele decidiu esconder as garrafas numa das paredes da casa.

Na altura rimos porque sabíamos que a nossa vivenda agora valia milhões e ninguém que passasse por lá podia adivinhar.

No último dia, já a ouvirmos as bombas à distância e a ver os vizinhos a fugirem só com a roupa que tinham no corpo, mais nada, decidimos fazer o mesmo.

Voltaríamos para casa assim que tudo acalmasse.

Mas nunca mais acalmou e, quando demos por isso, já estávamos em Portugal

A verdade é que nunca mais voltamos.

Ficaram lá os diamantes, emparedados durante 30 anos e nós aqui com tantas dificuldades.

-Mas nem sequer tentaram voltar? – Perguntou alguém.

-Acho que não. Tentar, verdadeiramente, não. A obsessão do meu marido pelos diamantes foi crescendo, envenenando-o cada dia mais, ao ponto de vivermos infelizes e frustrados todos estes anos. Ele acabou por morrer, há 10 anos, com a profunda tristeza de termos vivido sem aquela fortuna que representava uma vida de trabalho.

-Mas, se calhar, ainda estão lá… – disse alguém.

Devem estar. Falei com algumas pessoas que vieram de Angola e disseram que aquela zona não foi muito afectada. Talvez.

A conversa foi seguindo e o tom aumentando, até que esmoreceu e o assunto foi mudando. Mudou para todas menos para Augusta, também ela retornada de Angola.

Nessa tarde fria de inverno em Santarém, Augusta decidiu que iria ficar rica.

À noite fez telefonemas para alguns amigos e familiares em Luanda, incluindo a sua irmã.

-Augusta, o que tu tens de fazer é saber exactamente qual é a casa e, se conseguires, qual a parede que devemos procurar.

-Mas se ela não quiser dizer?

-Diz! Ela é que contou! Diz-lhe que lhe damos 50% dos diamantes.

-Mas…

-Nada de mas! Aqui em Angola eu trato de tudo. Tu só tens de fazer o que eu te disser.

Desligaram.

Nessa noite, em Luanda, Antónia, irmã de Augusta, não dormiu.

Fez os planos.

Tudo o que tinha que fazer era escolher as pessoas certas. Assim que a Augusta mandasse os detalhes, ela iria para o Quitexe e trazia os diamantes. Tudo iria mudar em breve. Tudo.

Pela manhã, em Santarém, a senhora Maria Clara estranhou que tão cedo alguém a visitasse. Abriu a porta e disse:

-Maria Augusta, por aqui e tão cedo?

-Pudemos falar?

Augusta entrou.

Uma semana decorrida depois do telefonema, Antónia estava em posse de tudo o que necessitava. Tinha um mapa minucioso feito pela mão de Maria Clara. Tinha duas pessoas de confiança para ir ao Quitexe, um jipe e algumas ferramentas para partirem a parede. Não deveria demorar muito. Um dia de viagem, um dia para conseguirem ter acesso à casa… Foi aí que se lembrou que a casa devia estar ocupada por alguém. Teria de resolver isso no local e na hora certa.

Partiram.

A estrada de Luanda-Uíge em 2003 era um inferno. Época de chuva e muitos obstáculos no caminho. Nenhum suficiente para impedir Antónia e os seus companheiros.

Ela disse-lhes que havia uma garrafa de diamantes escondida naquela casa. Eles acreditaram.

Um dos companheiros foi escolhido pela sua experiência das estradas de Angola e por sinais evidentes de não ser a pessoa mais inteligente do mundo.

Conseguia coisas brilhantes, como mudar pneus sem macaco, encontrar alternativas nas estradas bloqueadas pelas enchentes dos rios e outras habilidades que convêm aos viajantes natos, mas só isso, nada mais. Este era o Anacleto.

O outro não tinha outra habilidade senão a de ser aldrabão. Persuasivo nos seus jeitos de galã, mas mentiroso compulsivo, vigarista de trazer por casa.

Era perseguido por um passado recente de dívidas e insucessos. Mudava de número de telefone com frequência e estava sempre com aquela expressão de quem já foi ou vai ser apanhado. Este era o Constantino.

Antónia sabia que os podia controlar. Não só pela diferença de idade e dos modos de dama da sociedade, mas especialmente pelo seu faro para uma solução prática para os seus problemas imediatos. Ela seria a chefe da missão.

Só assim ela poderia ficar com a segunda garrafa sem o conhecimento deles.

Faltava recrutar alguém no Uíge ou Quitexe. Essa pessoa teria que ter bons contactos, mas nada de grande, somente com alguma influência. Teria que conseguir que eles passassem despercebidos.

O contacto foi feito previamente.

Gonçalves era um português evidentemente mal sucedido no ramo da construção civil. Os anos foram passando e lá acabou por cair no Uíge, cheio de dificuldades económicas. Havia a promessa da construção de um ou mais hospitais. Mas nunca aconteceu. Foi ficando e por lá ficou.

Conhecia toda a gente e seria o pivot de contacto no Quitexe.

A viagem foi empolgante, cheia de peripécias e, ao fim da tarde chegariam ao Uíge, mas ainda longe de Quitexe.

Durante a viagem a conversa não mudou.

-Isto dos diamantes não é para miúdos – dizia Constantino – Sabem lá a quantidade de gajos que eu conheço que se lixaram. Em Luanda, vende-se mais vidros de pára-brisas a fazer de diamantes do que cerveja.

-Epá, na altura não havia maldade – dizia Anacleto – o pessoal era puro. Isto dos diamantes era para se safarem uns aos outros.

Antónia ouvia e calava.

Quando chegaram ao Uíge, Gonçalves disfarçava mal a sua falta de empolgamento sobre este assunto. A chuva nocturna criava um ambiente sórdido de humidade, calor e mosquitos.

Ficaram instalados na casa de Gonçalves. Era uma vivenda geminada de antigo estilo colonial. Os vizinhos eram um pesadelo diário. A música alta 24 horas por dia, numa cidade sem luz eléctrica, dava com Gonçalves em doido.

-Estes zairenses…- e calava-se numa reflexão ameaçadora.

Durante o jantar, com o som monocórdico do pequeno gerador como fundo, Gonçalves comentou:

-Já vi muitas pessoas virem para cá neste tipo de aventuras. Eu chamo-lhe o sindroma de Indiana Jones!

Na mesa ninguém riu.

Antónia mostrou a diferença de nível que havia entre ela e os restantes com um movimento lento e gracioso acompanhado de uma saudação falsa:

-Boa noite a todos. Por favor, não fiquem a beber até tarde. Amanhã saímos às 6 horas.

-Sr. Gonçalves, onde é o meu quarto?

-Claro, claro. Durma no meu quarto. Nós arranjamo-nos por aqui na sala. Durma bem.

Ficaram a beber até tarde, numa cornucópia de idiotices sem sentido. Contaram histórias impossíveis até ser de manhã.

Antónia ouviu cada palavra que o grupo gritou durante a embriaguez.

De manhã ainda chovia. A chuva parecia lama de quente que era.

O plano estava traçado.

Como Gonçalves conhecia o administrador de Quitexe, iria apresentar os três como investidores estrangeiros.

-Sabe, Sr. Administrador, eles são gente de dinheiro e eu falei logo em si.

Disseram que precisavam de uma casa para montar escritório. Depois iriam fazer uma fábrica de tijolos e uma padaria.

-Sr. Administrador, nós não nos vamos esquecer de si. Vai ver que não fica mal.

Quando chegaram à pequena vila de Quitexe, o administrador suava de entusiasmo.

-Claro que vos ajudo. Sempre pensamos que ninguém mais se lembraria de Quitexe. Precisamos de toda a ajuda possível. Quem sou eu para criar impedimentos a estes senhores tão distintos e à senhora, claro está!

Enquanto saíam do pequeno edifício da administração comunal, o administrador ía falando sem parar. Chamava as pessoas aos gritos e dava ordens em kimbundu.

Juntou-se uma pequena multidão à volta do grupo. As crianças corriam sem parar e entoavam canções de brincadeira para chamarem à atenção. O administrador enxotava-os com maus modos e lá seguiam, sob a chuva miúda, em direcção à casa.

-Isto é que é passar despercebido. – matutava Antónia.

Quitexe tinha apenas 2 ruas e um conjunto modesto de vinte vivendas em alvenaria. Tudo o resto eram kubatas podres devido à humidade e capim.

Em Quitexe chovia todos os dias do ano. Muito ou pouco, mas chovia.

A vila estava envolvida pela mata densa daquela região e dava a sensação de ser uma ilha, rodeada de selva por todos os lados, até aonde a vista alcançava.

Subiram a rua principal e, sem perderem o sangue frio, avistaram a casa.

Antónia ficou surpreendida pela diferença da casa que via, agora à sua frente, daquela que havia imaginado, sem parar, nas últimas semanas.

Era uma casa sombria e sem gosto. A cor azul colonial havia-se transformado num tom de podridão e de abandono. Cheirava a bolor à distância.

À medida que se foram aproximando, a pequena multidão foi-se dispersando, evitando a proximidade daquele mausoléu minúsculo, rodeado de árvores mortas e ervas daninhas até à altura do primeiro andar.

A casa ficou abandonada aqueles anos todos, ninguém ocupou. Um milagre.

Antónia quase soltou um grito de entusiasmo quando soube disso. Os outros mostraram-se estranhamente incomodados.

Subitamente, o administrador também parou. Antónia notou e perguntou:

-Algum problema?

-Bem, não há problema nenhum, mas não temos o hábito de passar à frente desta casa.

Sabe como é o povo. Ouvem uma história e vão-na alterando á medida que a contam. Chegam ao ponto de acreditar naquilo que sabem que foram eles que inventaram.

-O que foi que inventaram, posso saber? – disse Antónia, sempre altiva.

-Nada de interesse, garanto-lhe – despachou o administrador – Se é esta a casa que querem é esta que vão ter!

-É esta a casa que queremos.

Gonçalves aproximou-se e começou a falar com o administrador sobre as condições de aluguer e outros detalhes administrativos.

Antónia e os outros ficaram em silêncio a olhar para a casa.

Durante toda a tarde falaram dos investimentos e das dezenas de empregos que iriam criar.

-O progresso não se pode parar – garantiam.

-Com Angola em paz, quem perder tempo, perde o barco.

Ao final da tarde conseguiram autorização para entrarem na casa desacompanhados, sem muito esforço, visto que ninguém parecia interessado em ali entrar, muito menos à noite.

Entraram os quatro. Antónia tirou da pasta o pequeno manuscrito de Maria Clara e disse:

-É aquela parede. Anacleto, vai buscar a marreta.

-Mas, se nos pomos a martelar a estas horas chama a atenção…

-Vá, vai buscar a marreta que eu depois digo que é para ver se a casa aguenta as obras – rematou, pragmático, Constantino.

Gonçalves estava mais entusiasmado agora, mas coube-lhe a missão de ficar a ver se alguém se aproximava.

Passado alguns minutos Gonçalves voltou.

-Como é que eu sei se vocês encontraram os diamantes?

-Nós dizemos-te – disse Antónia, ríspida.

-E como é que sei que encontraram exactamente a quantidade de diamantes que me mostrarem? Podem tirar parte dos diamantes da garrafa e dizer que foi tudo o que encontraram.

-Pois podemos, Gonçalves. Preferia pensar que não existe margem para desconfianças entre nós. Mas, se quiseres, se achares necessário, podes revistar-nos.

Gonçalves baixou os olhos e disse:

-Não será necessário, Dona Antónia, por favor, perdoe-me.

Alguns minutos depois, Gonçalves começou a ouvir as pancadas na parede da casa. Parecia um martelo pneumático numa igreja. Com aquela húmidade devia-se ouvir no Uíge todo.

Cada pancada era um sobressalto. Gonçalves sentia os pulmões a ferverem.

Dentro da casa, no corredor, Anacleto atacava uma das paredes furiosamente. Antónia suava e estremecia a cada derrocada de cimento e tijolo.

A parede foi cedendo ás pancadas, mas nada.

Antónia, em silêncio, olhou mais uma vez para o mapa e disse:

-Pára, acho que estamos a ver o mapa ao contrário.

Anacleto parou, ofegante, com uma expressão de raiva no rosto.

-Ao contrário como? Está a brincar com esta merda?

-Sim, ao contrário. Estamos no lado errado da parede.

Constantino riu-se um pouco e disse:

-Vá lá. Estamos muito ansiosos. Vamos ver bem o mapa.

Pararam os três e verificaram bem a posição das paredes em relação à porta de entrada, à porta da cozinha, das escadas.

-Tem razão, Antónia. É do outro lado.

Anacleto seguiu decidido e recomeçou o ataque.

Nada.

Perto das 23 horas alguém se aproximou da casa. Não era ninguém. Só um curioso.

Decidiram voltar pela manhã e continuar a tarefa.

-Mas, com todo este aparato, se alguém vem cá durante a noite e encontra os diamantes? – disse Anacleto.

Entreolharam-se.

-Tens razão. Um de nós deve passar aqui a noite – concluiu Constantino.

-Mas qual de nós? E, se quem ficar descobrir os diamantes? Vai dividi-los? Vai dizer a quantidade certa que encontrou? – disse Gonçalves

-Você, às vezes, dá-me cabo dos nervos, homem. Cale-se com isso.

Olharam-se entre si e pela primeira vez todos sentiram que o Gonçalves devia ter mais razão do que aquela que conseguia explicar.

-Dormimos todos aqui!

-Anacleto, como é que vamos dormir aqui?

-Dormimos no carro e vigiamos a casa durante a noite, por turnos.

Passaram a noite no carro, sob uma chuva teimosa e um calor tremendo, atacados por mosquitos do tamanho de abelhas.

Anacleto, dormiu aflito por não ter a certeza se teria partido todos os cantos da parede, se tinha escapado alguma coisa.

Constantino, dorido, remoído pelos minutos que esteve fora da sala, na conversa com Gonçalves, deixando Maria Antónia e Anacleto sozinhos.

Antónia, furiosa por não ter encontrado o seu tesouro logo à primeira pancada.

Gonçalves, dormiu com a certeza que seria enganado.

Assim decorreram os três dias e três noites seguintes, indiferentes ao que o povo de Quitexe pudesse dizer ou pensar.

Destruíram todas as paredes da casa, encontrando forças somente nos pequenos intervalos em que bebiam água ou uma cerveja quente.

Carregaram entulho de uma sala para outra, desfizeram o chão, picaram os tectos todos. Descobriram ecos em pilares de cimento armado, mas nada.

Reviraram o jardim à volta da casa duas vezes.

Nada. Nem uma, quanto mais duas garrafas.

No fim dos três dias desistiram.

-A velha está a esconder alguma coisa.

-Pode ser que não seja esta a casa.

-Se calhar nunca houve diamante nenhum.

Decidiram regressar a Luanda na manhã do quarto dia.

Estafados, desmoralizados, desconfiados e, não menos importante, sem os diamantes.

A viagem de regresso decorreu sem incidentes, porém, sem conversas nem histórias para contar.

À chegada a casa, Antónia, sentiu um burburinho no andar do seu apartamento.

Quando chegou ao cimo das escadas viu a sua filha, Antonieta à sua espera com um grande sorriso.

-Mãe, estávamos todos preocupados. Tantos dias. Nem imaginas quem chegou ontem de Portugal: A tia Augusta.

Maria Augusta estava de pé na pequena sala de jantar de Antónia, mais suada do que o habitual. Já não ía a Angola pelo menos há quinze anos. Tinha perdido a noção do calor de Luanda.

Os cumprimentos foram longos e ternos e as perguntas habituais respondidas, mas havia na cara das duas um sinal de desespero.

-Como não encontraram nada?

-Estou-te a dizer! Nada. Partimos a casa toda, da cabeça aos pés e nada.

Silêncio.

-Se é assim porquê que demoraram tantos dias?

-Para partir as paredes todas ou achas o quê?

-Acho que o mapa era explícito e que em meia hora encontravam os diamantes e voltavam para Luanda, isto é o que eu acho – grunhiu Augusta.

Antónia mirou-a e prendeu a resposta por um segundo.

-Olha, nos últimos quatro dias, viajei nas piores estradas do mundo, apanhei chuva, dormi em carros com três homens bêbados, parti uma casa toda e, agora, chego à minha casa e tu atiras-me à cara que eu te roubei os diamantes!

-Sim, duas garrafas de diamantes!

-Duas garrafas de diamantes, Augusta? – perguntou calmamente Constantino, no fundo da sala, olhando de soslaio para Antónia.

A discussão durou dias, semanas e, não havendo forma de tratar do assunto, Augusta decidiu regressar a Portugal. Regressar aos frios invernos ribatejanos.

Nunca mais telefonou à irmã.

Augusta havia chegado de noite a Santarém. Exausta, decidiu nem desarrumar as malas da viagem. Para quê? Tinha o resto vida para o fazer.

De manhã, ainda na cama, o telefone tocou.

-Sim, quem é? – atendeu Augusta, surpresa pelo cedo da hora.

-Sou eu, Augusta, a Maria Clara. Soube que chegou de Angola.

Augusta ficou em silêncio, petrificada.

-Espero que ainda hoje me traga os meus 50% dos diamantes.

-Sabe, Maria Clara, não encontramos diamantes nenhuns.

-Augusta, ouça com atenção: - Eu sei que os diamantes estavam lá. Não me vai enganar. Escreva o que eu lhe digo. Não me vai enganar!

Augusta nunca mais foi ao salão de cabeleireiro, às terças-feiras de todos os meses de inverno, da Rua Capelo e Ivens, em Santarém.