A CAMISOLA ROSA

A CAMISOLA ROSA

Rivaldo e Hercília estavam casados há mais de quinze anos. Era um casamento feliz, por serem ambos muito dedicados um ao outro. Eram muito carinhosos, mesmo em público. Tinham duas filhas adolescentes que se orgulhavam em falar sobre o relacionamento deles, principalmente numa época em que a maioria dos pais dos seus colegas estavam separados.

O Rivaldo trabalhava numa dessa empresas que organizam eventos, shows, feiras, etc. Numa ocasião, ele e um colega de trabalho tinham ido a São Paulo e ficariam na Cidade por três dias. Voltariam exatamente na noite do dia do aniversário da Hercília. Quando eles entraram no quarto que dividiam no hotel onde ficaram hospedados, encontraram uma camisola rosa estendida no encosto de uma cadeira que ficava no quarto, entre as duas camas de solteiro.

Eles falaram com o pessoal da recepção sobre a peça feminina que fora, provavelmente, esquecida pela pessoa que ocupou o quarto antes deles e lhes disseram que mandariam retirar a camisola. Toda vez que passavam pela recepção lembravam aos atendentes. Falaram, inclusive, com uma camareira que encontraram certa vez no corredor, mas a camisola não foi retirada, ficou lá no encosto da cadeira. Eles até brincavam um com o outro a respeito de quem iria dormir com ela.

No último dia de sua estada em São Paulo, com a viagem de volta marcada para a noite, o Rivaldo foi com o amigo comprar um presente para a Hercília. Pretendia, quando chegasse ao hotel, tomar um banho e trocar de roupa e estaria, assim, pronto para sair com a esposa para comemorarem o aniversário. Enquanto olhavam as vitrines das lojas em um shopping, receberam um telefonema da agência de viagens, perguntando se tinham interesse de antecipar a viagem, porque surgiram duas desistências para um voo que sairia em uma hora. Eles aceitaram de imediato. Ligaram para o hotel e pediram que suas malas fossem levadas para a recepção. A do colega dele já estava arrumada e fechada, mas a do Rivaldo ainda estava sobre a cama. Só faltava guardar as roupas que ele usaria para sair com a Cilinha (era assim que ele, carinhosamente a chamava), que ele pediu fossem postas na mala. Eles passariam no hotel para pegar as malas e assinarem a fatura das despesas e seguiriam para o aeroporto no mesmo taxi.

A antecipação da viagem alterou os planos do Rivaldo, mas era melhor chegar mais cedo no Rio. Ele passaria em casa, deixaria a mala e iria a um shopping comprar o presente dela, pretextando ir com o colega na sede da empresa para entregar o relatório do serviço executado. E assim fez. Comentou com o colega que a camisola que estava lá no quarto do hotel tinha dado uma ideia pra ele. Iria comprar uma camisola parecida para a Cilinha, bem sexy, para ela usar depois que voltassem do jantar. “Ele desejava mesmo era curtir a noite num motel, há muito tempo eles não faziam isso, por causa das meninas” - ficou devaneando.

Numa loja, ele viu uma camisola da mesma cor e perguntou à vendedora o que ela achava. Ela respondeu que adoraria ganhá-la de presente. Foi o bastante para ele se decidir. Nada como a opinião de uma vendedora interessante para convencer que o presente vai agradar. “Pode embrulhar que eu vou levar essa” - disse satisfeito.

Estava esperando que a camisola fosse acondicionada em uma bela embalagem, quando o seu celular tocou. Era ela, a Hercília: “Pode começar a pensar numa explicação muito convincente para a camisolinha” - ela disse, enfurecida.

“Será que agora já tem celular com dispositivo de escuta? Só me faltava essa!” – pensou.

- Eu só pedi a opinião da vendedora benzinho. Ela nem é lá suas grande coi...

- Que vendedora Rivaldo? – Esbravejou.

Ela estava zangada mesmo, normalmente o chama de Riva: “Eu não quero saber qual a profissão dela, pra mim é prostituta. Pode ir direto para casa da garotinha, porque ela, inclusive, deve ser bem novinha, dá pra se ver pelo tamanho da camisolinha. A sua mala já está pronta, com a roupinha dela pra você devolver,porque eu já esvaziei o seu armário. Era só o que me faltava meu Deus! Que desgosto! Logo hoje, um presente desses. Tantos anos de casamento. Devia estar sendo enganada o tempo todo sem saber. Eu não quero olhar pra sua cara, nunca mais! Não apareça na minha frente porque eu não sei o que sou capaz de fazer, tamanho o meu ódio!”

Ela desligou e ele ficou com o presente na mão, abobalhado, sem saber o que fazer. Então, de repente, lembrou-se, da camisola do hotel. “Devem tê-la posto na minha mala. Que azar!” – Pensou. Resolveu ligar pra ela.

- Querida, eu vou explicar tudo quando chegar. Eu pedi pra ela tirar a camisola de lá varias vezes, pode perguntar ao Leo, o meu colega.

- Você deve ter bebido! Ainda tem coragem de admitir! Vivi tanto tempo com um homem e agora descobri que não o conhecia. É um cafajeste! Eu não vou estar em casa quando você vier pegar as malas! - Ela disse chorando.

- Eu estou falando da camarei...

Ela desligou o telefone, antes que ele terminasse da falar camareira do hotel.

“Leo, você precisa ir lá em casa comigo pra tentar consertar meu casamento” - disse para o amigo que ainda estava com ele. Você acredita que puseram a camisola na minha mala? A Hercília está uma fera. Disse que vai me botar pra fora de casa. Já até arrumou as minhas malas.

O Leo foi a salvação do Rivaldo, que ainda teve que ligar para o hotel, a fim de que fosse confirmada a história da camisola, para que a Hercília se convencesse. Apesar de tudo, depois de ela finalmente se convencer da inocência do Rivaldo, conseguiram comemorar o aniversário dela em paz. Ela adorou a camisola rosa que ganhou de presente, a outra, souvenir do hotel, deu pra sua irmã. Mas de vez em quando fala na camisola e o Rivaldo sempre conta a mesma história, por isso ela acredita nele.