Quase amor a beira-mar (EC)
 

          Osório, há tempos, tentava conquistar Virgínia e, também, já havia notado que ela até dava sinais de que também queria algo com ele. Um dia, criando coragem ele mandou-lhe um bilhete, convidando-a para “algo mais”:

Oh! musa amada, idolatrada, salve! Salve! Gostaria muito que aceitasses meu convite para um churrasquinho a dois lá em minha casa de praia, no próximo sábado à noite. Há um quintalzinho aconchegante nos fundos, com um jardim muito florido e bem cuidado e lá, estimulados pela brisa marinha, poderemos contemplar um formoso céu, risonho e límpido, enquanto degustamos alguns petiscos e, assim, nos conhecermos um pouco melhor. Tenho certeza que, ao final, tu irás te impressionar com coisas sobre mim que ainda não sabes. Apesar de minha modesta aparência, bem lá no fundo, sou gigante pela própria natureza e não ficarei admirado se terminares a noite com um brado forte depois que experimentares aquilo que em mim é impávido e colosso. Quem sabe até não venhas a passar a noite comigo e, no domingo, acordaremos aninhados, eu repousando em teu seio e tu em meu braço forte. Aguardo ansioso. Beijos! Osório.”

          Virgínia, ao receber o recado, leu-o com detida atenção e se esforçou para não demonstrar a empolgação de que foi tomada. Na verdade, fez-se de difícil por algum tempo para, enfim, acabar aceitando aquele convite. Por fim, no indigitado sábado acabou, de fato, indo visitar Osório. A noite estava muito clara e estrelada e, como ele previra, ela não só consumiu o churrasquinho como, ainda, de fato, lá passou a noite. Entretanto, na manhã seguinte, ela foi-se embora antes mesmo que ele acordasse. 


          Os dias seguintes transcorreram ligeiros, porém Virgínia passou a evitar Osório de forma pouco disfarçada. Ele, não se conformando com a situação, já que ela mal lhe dirigia a palavra, insistiu enviando um novo bilhete:

“Virgínia, querida; desde nosso encontro não consigo parar de pensar em ti. Naquela noite vivi um sonho intenso, um raio vívido, que encheu-me de amor e de esperança. E agora, diante de tua indiferença, sinto uma dor daquelas em que desafia nosso peito a própria morte. Dá-me uma resposta, atende meu clamor! Não me deixes mais nesta angústia atroz. Do sempre teu, Osório.”

          Virgínia recebeu o bilhete em mãos e, fitando nos olhos de Osório, disse-lhe que não tinha coragem de falar-lhe desde a noite do encontro, porque havia coisas a dizer que ela preferia não comentar. Porém, como ele insistisse, ela disse que, ainda naquele dia, responderia tudo em um bilhete, também. E assim o fez:

“Caro Osório; confesso que quando recebi teu convite até me empolguei, porque, se não és belo e forte, ao menos, havia a expectativa de que houvesse, de fato, algo impávido e colosso. Contudo, estranhou-me que, na verdade, tu decepcionas diante do evidente esforço com que ergues a clava forte. Aliás, notei que, por pouco ela à terra desce!  E, não bastasse isso, o pouco que me deste ficou ofuscado por tua atitude que, logo em seguida, manteve-se ali, inerte, deitado eternamente em berço esplêndido. Enfim, dormiste, porém eu fui dar uma volta na praia, aguardando que o dia amanhecesse para poder ir embora. Ali fiquei às margens plácidas do oceano, remoendo idéias ao som do mar e à luz do céu profundo. Depois, voltei e aguardei o amanhecer em teu jardim. Aliás, nisto não mentiste, pois teus risonhos, lindos campos têm mais flores do que eu poderia imaginar. Eu bem queria que tivesse nascido um amor eterno, porém não notei entre nós que o futuro espelha essa grandeza. Eis que o dia amanheceu e o sol surgiu em raios fúlgidos. Na verdade, aquele para mim foi o sol da liberdade, pois, enfim, pude partir. Continuarei minha busca por alguém que possa, mesmo, inspirar-me para que um amor eterno seja símbolo. Porém, esse alguém não és tu. Desejo-te de coração paz no futuro, glória no passado e muita sorte em qualquer tempo. Espero que fiques bem! Virgínia.”

          Osório recebeu a resposta e, decepcionado, chorou. Olhou aos céus e clamou numa prece: “Oh! Meu Pai! Consegue-me outra chance com Virgínia e, desta vez, verás que um filho teu não foge à luta!”. Porém, nunca mais houve outro encontro entre eles. Só restaram as lembranças na casa de praia onde, até hoje, vez por outra, no céu litorâneo  a imagem do Cruzeiro resplandece como única testemunha daquela história de quase amor.

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Este texto faz parte do Exercício Criativo “Hino Nacional”
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