Fragmento de um diário

Ontem parei meu carro em um semáforo e me deparei com uma cena que não é rara. É difícil eu abaixar os vidros do carro, pois quando faço isso o ar condicionado perde a potencia, mas as vezes é bom sentir o clima das ruas.

Quando abaixei o vidro havia ao meu lado um carro bem velho, porém conservado, no interior do veículo se encontrava um rapaz de aparentemente vinte anos que ouvia uma música (que dias depois pesquisei e vim, a saber, é de um grupo de rap chamado Racionais mcs) nessa música dizia a seguinte frase:” programado pra morrer nós é, certo é, dê no que der” depois vim, a saber, que esse grupo é um grupo que faz uma letra de protesto contra uma sociedade injusta.

Ao abaixar o vidro e olhar para o carro o rapaz que estava no mesmo me olhou como se dissesse “está vendo seu capitalista imundo? Nós da periferia lhes incutimos medo e vocês um dia sentirão a vingança do povo sobre vocês. Como diz a letra estou preparado para morrer por uma causa justa”. Levantei o vidro, pois o calor e a poluição me incomodavam.

Mas confesso que nos últimos dias não pude deixar de pensar no caso e sentir pena daquele pobre rapaz. Ele é uma pessoa que se sente oprimida por uma sociedade injusta e que apesar de tudo, tem esperança em um mundo melhor. Um mundo mais justo onde os pobres tenham um mínimo de paz e dignidade, onde se sofra menos e automaticamente se viva melhor.

Até ai tudo bem que se deseje, algumas pessoas podem querer, mas querer não é poder. Se ele prestasse atenção na história do mundo veria que sempre existiram pobres e ricos e isso é essencial para a subsistência da raça, sendo que existem os oprimidos e os opressores e que a lei da natureza humana é essa. Basta olhar todos os levantes que houve na história e se perceberá que sempre que apenas os pobres se reuniram para uma mobilização eles foram duramente derrotados e punidos, exemplos existem em toda a história da humanidade.

Sempre que pobres chegaram ao poder houve manipulação de alguma minoria que os ajudaram por algum interesse e que após a vitória voltou as costas aos pobres e até mesmo os oprimiram como é o caso de muitos regimes ditatoriais que a história mostra claramente que nações inteiras foram e são oprimidas por ditadores que se dizem do povo e que do povo não tem nada.

Esse rapaz vive a utopia de que os guetos terão em um futuro condições mais humanas e que as pessoas que neles vivem serão conhecedoras de seus direitos e os reinvidicarão um dia. Mas como eles farão isso? Se eles não têm ascesso à educação lazer e nem a cultura e por longos anos não os terão. Esse rapaz acha que ouvindo uma música revolucionária em um som de um carro incomoda alguém ou põe medo na alta sociedade.

Mal sabe ele que as instituições que se dizem democráticas e que de tal não tem nada, estão todas voltadas a favor do favorecidos financeiramente. Se ele soubesse que o ato de um garoto da periferia roubar ou matar está totalmente previsto pelo estado, ele entenderia que quem está sendo vítima é ele e não nós, pois a sensação de impunidade que a mídia passa não existe, se um ladrão não é punido pelas instituições governamentais ele já está sendo punido moralmente no seu cotidiano através do preconceito que os formadores de opinião impõem á grande massa, dizendo que existem pessoas boas e pessoas más e que existem pessoas que já nascem com o caráter deturpado e que ele será ladrão, pois ele nasceu para isso e que por tal deve ser punido.

Confesso que ás vezes me sinto mal com determinadas situações, mas o que posso eu fazer diante de tudo isso? Não pago eu meus diversos impostos todos em dia como um bom cidadão? Se as autoridades não fazem nada direito isso não é problema meu. Eu tenho acesso á educação lazer, cultura e muito mais por que nasci em berço de ouro e pago caríssimo por isso, e em minha mente acho que minha parte está sendo feita e que cada um deve lutar por seus direitos. Mas entenda-se bem, lutar pelos direitos é correr atrás de educação e de seus direitos e não colocar uma música de protesto em um carro em uma área nobre e ficar encarando os burgueses que por lá passam, pois isso não vai adiantar e com certeza não vai nos amedrontar pelo simples fato de que são eles as vítimas e não nós; pois faça uma análise e me diga quantos ricos morrem vítima de violência por armas de fogo por ano em comparação a pobres e classe média? E quando morre um a imprensa cai encima alardeando sobre a violência que está insuportável.

Diante de tudo isso se pode ver que como sempre a população é um suporte para a alta sociedade e que sempre será, pois nós da ponta da pirâmide sempre forjaremos meios de mantê-los presos a crenças deturpadas e estereótipos falsos que eles sempre considerarão essenciais para a sobrevivência. Nós somos os modelos de uma sociedade que impõe suas regras e que faz o mundo caminhar adiante. Somos os seres que pensam pelo povo e, que os domina e os protege deles mesmos, pois imagine um mundo onde não houvesse dominadores o que seria?

Nós criamos as modas e as impomos a eles, somos nós quem estamos sempre á frente quando se trata de tecnologia e somos nós quem ditamos como eles devem se comportar. Ou seja: somos nós quem pensamos por eles e os conduzimos pelas veredas que achamos mais apropriadas pois eles sozinhos não chegariam a lugar nenhum. Por esses motivos eu entendo que alguns entre a população consigam abrir os olhos através da informação, como é o caso desse rapaz, e até os apóio, mas daí eles acreditarem que um dia os olhos da população inteira serão abertos é muita utopia. Se esse rapaz tentasse mudar a ele próprio ao invés de tentar mudar o mundo ele teria mais êxito ele sofreria muito é claro, mas ele estaria com os pés no chão. E às vezes é melhor a dura realidade á mais doce utopia.

O importante é mudarmos a nós mesmos e o nosso mundo, o mundo que nos rodeia, pois quando mudamos nossas atitudes e nos comportamos de modo diferente faz com que as pessoas que nos rodeiam sejam contagiadas e aos poucos nos tornamos melhores. É lógico que o mundo perfeito que ele deve sonhar nunca existirá, mas ele pode passar coisas melhores do que a revolta aos seus descendentes; ele pode passar princípios sólidos que serão cultivados ao longo dos anos e mesmo que a vida não dê a guinada que ele quer ele poderá construir o seu mundo melhor.

E o mais importante diante de tudo isso é ele não achar que o excesso de informação fará bem a população, pois isso só os levará ao buraco, pelo fato de ser através do excesso de informação que nós elite os confundimos da forma que nós queremos e, se um deles abre os olhos nós temos a forma certa para fechá-los. Ou quando um bandido se rebela o estado está pronto a pará-lo e puni-lo. De forma que esse rapaz que abriu os olhos seria mais feliz se ele entendesse que a mudança de pensamento é que faz a diferença e não as atitudes que a seu ver são revolucionárias, pois não temos medo de um programado para morrer, pois como foi dito ele morrerá e não alcançará seu fim.

Bom chega de escrever e me preocupar com problemas alheios.

20:34

ronaldo moraes
Enviado por ronaldo moraes em 07/12/2009
Reeditado em 07/12/2009
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