Uma linda criança

Que coisa linda era ver aquele garoto brincar, correr e fazer peraltices. Era um lindo garoto de cinco anos de idade; idade das perguntas constantes, da ingenuidade e das descobertas. Ele vivia perguntando o porquê de tudo e tudo era motivo para mais perguntas. Sua energia ultrapassava os limites de tudo, se o deixasse ele faria de seu dia um dia inteiro de brincadeiras e travessuras “como é bom viver” falava ele em conversas descontraídas com seus pais. Pais esses maravilhosos que nunca deixavam nada faltar ao garoto; não faltava o pão de cada dia, os brinquedos, a escola, o carinho e o afeto. Isso é o amor incondicional dos pais pelos seus filhos.

Mas esse garoto não conseguia entender o porquê de certas obrigações. O porquê ter de levantar cedo para ir para a creche, o ter de comer legumes, verduras e muitas outras obrigações. Por que seu pai não ficava em casa mais dias da semana com ele já que ele afirmava que amava ficar em casa para os dois brincarem? Por que seu pai só comprava as coisas se tivesse dinheiro? Para que o dinheiro? Não podia simplesmente comprar sem dinheiro? Por que os adultos inventavam tantas coisas para se prenderem se a vida era tão simples?

Ele adorava brincar de pega-pega, amarelinha, esconde-esconde e tantas outras brincadeiras. Às vezes o dia chegava ao fim, mas ele ainda tinha energia de sobra para brincar a noite inteira se deixassem. Não entendia o porquê ter de comer tanta comida se o doce era mais gostoso. Ás vezes ficava imaginando uma floresta com árvores enormes de troncos de chocolate, folhas doces e que os frutos fossem deliciosas balas; rios de todinho e pedras macias onde se pudesse recostar enquanto se comia todas essas delicias.

Que mundo fantástico existia na linda cabecinha desse garoto, ele não entendia o porquê de seus pais serem tão bons e ao mesmo tempo não falarem com certos vizinhos que eram tão legais para com ele; sendo que ele brigava com seus coleguinhas brigas que pareciam que eles nunca mais iriam voltar a se falar e, dentro de pouco tempo eles agiam como se nada nunca houvesse ocorrido entre eles e, eles voltavam a ser bons amigos. Por que os adultos não eram assim? Por que eles escolhiam esse mundo? Que graça tinha trabalhar, trabalhar e trabalhar?

A ingenuidade dele era como a de todas as crianças de sua idade. Quando gostava de uma coisa gostava mesmo e falava, mas quando não, ele exprimia seu sentimento doesse a quem doesse. A sua sinceridade era a flor da pele, era só perguntar e ele não hesitava em responder com veemência: “gostei” ou “não gostei” e todos riam de seus comentários por se tratar de uma linda criança.

Havia momentos em que ele queria crescer e ser igual a seu pai, em outros ele sonhava em ser criança para sempre. As vezes o atormentava a idéia de que ele ia crescer e que seu pai ficaria velhinho e se aproximaria da morte. Nesses momentos reflexivos ele dizia a seu pai: “não quero que você fique velhinho, eu que você assim para sempre” e seus olhinhos lacrimejavam. É incrível, mesmo uma criança de cinco anos pode meditar sobre coisas profundas e sentir angústia quando pensa na complexidade da vida. Tinha uma fascinação e um amor platônico pela “tia” da escola e pela mãe. Tinha uma veneração extrema pela mãe e às vezes tinha ciúme até de seu pai com ela. Ele a achava um ser sublime acima do bem e do mal.

Como era simples e objetivo o seu modo de ver e sentir as coisas. A seu ver o mundo era perfeito se os adultos não o estragassem tanto. Ele não sabia dar nome a todas essas emoções, mas sabia que elas existiam e estavam lá em seu intimo. Sentia tristeza e alegria, dor e alivio paz e conflitos, mas nada disso nunca o fez pensar em desistir dessa linda vida. Como era doce viver.

Chegou uma segunda feira, mais uma entre tantas outras. Seus pais o acordaram bem cedo com todo carinho, sua mãe o beijava docemente enquanto seu pai fazia cócegas pelo seu pequeno corpo. Ele acordou se debatendo e dando risada, hora segurando as mãos do pai, hora soltando-as para que ele fizesse mais cócegas. Levantou-se a muito custo, mas de bom humor. Foi ao banheiro, tomou banho, trocou-se de roupa (pois já aprendera a fazer isso sozinho) sentou-se á mesa e tomou café com seus pais. Depois assistiu um pouco de desenho na TV até que a perua escolar chegasse para levá-lo á creche.

A perua veio e ele se despediu de seu pai como sempre com um abraço terno sincero e forte, subiu ao portão com sua mãe e se despediu dela também com o mesmo afeto entrou no carro escolar e lá se foi. teve um dia normal na escola; com todas as atividades de praxe e com todas as felicidades também. Ma ao sair para ir rumo a perua houve um descuido do condutor do veículo que deixou com que ele escapasse de sua mão e corresse rumo á rua no momento em que ia passando um carro que o pegou em cheio.

A noticia chegou ao serviço de seus pais como algo devastador. Seus pais nunca haviam recebido notícia tão ruim como aquela em suas vidas, aliás, sobre suas vidas, pois aquele garoto era o verdadeiro motivo de suas vidas. Cada um, de seu serviço correu direto para o hospital onde se encontraram e se abraçaram e juntos chorando como nunca tinha chorado souberam que seu lindo filhinho estava internado em estado de coma na UTI. Passou-se uma semana sem que nada mudasse em seu estado de saúde e a cada dia os pais tinham mais esperança de que tudo ia se resolver e que seu amado filhinho ia se recuperar daquele que seria seu primeiro grande e terrível obstáculo.

O pai que era cético pedia por orações e, a mãe que nunca deixou de acreditar em Deus não parava de orar por um segundo. Todos os dias dessa semana que se passaram eles não desgrudavam do leito de seu filhinho amado. Eles olhavam seu corpinho inerte naquela cama respirando e pensavam o porquê não tinham sido mais presentes ainda na vida de seu filho. Quantas vezes tinham brigado com ele injustamente por um momento de stress do dia-a-dia? Mas se ele se levantasse daquele maldito leito tudo iria ser diferente. Eles teriam mais tempo ainda com ele, seriam mais complacentes e mais ternos ainda com aquela criaturinha que mudara suas vidas para sempre.

Mas a semana se passou e apesar de toda esperança e fé o garoto veio a falecer. A mãe o pai e os avós não conseguiam acreditar no que seus olhos viam. Aquele corpinho ali parado em um caixão era inconcebível a todos os parentes e amigos. Aquele “anjinho” ali sem vida chocava a todos e ninguém conseguia acreditar no que os olhos enxergavam. A mãe do garoto a todo momento abraçava e beijava aquele corpinho como se ali ainda estivesse aquele pequeno ser que tanta alegria trouxera aquela família. “O que será de mim agora” pensava ela; o pai não conseguia nem pensar, quase não saiu de seu lugar a não ser uma ou duas vezes para contemplar o rosto do verdadeiro amor de sua vida.

Chegou a hora de enterrar o garoto; dezenas de pessoas seguem aquele pequeno caixão; em sua maioria calada, porém alguns ousam cochichar sobre o ocorrido, outros olham feio os que cochicham, mas os pais do garoto não prestam atenção em nada. Abraçados eles seguem pensando em tudo o que ocorreu e tentando imaginar como será as suas vidas sem seu filho amado? Chegou a hora de descer o caixão; o desespero dos pais que esperavam que o filho ainda pudesse se levantar no último momento chega ao auge, a mãe desmaia e o pai inconsolável se lança aos braços d um amigo que o tira dali em esta de choque.

Os dias e os anos se passaram e não foi achado o motorista que abalou profundamente uma família sem ao menos prestar socorro. Será que ele tem filhos? Os pais nunca se recuperaram e nunca se recuperarão do choque que sofreram, mas a vida continua. Em suas memórias o seu filhinho amado ocupará para sempre um lugar todo especial e nunca ninguém conseguirá por mais que se tente apagar os momentos de felicidade que aquele garoto proporcionou aqueles pais. O que fazer diante de tudo isso? Apesar de perderem grande parte de suas vidas eles continuaram a viver; nem tudo na vida é perfeito.

ronaldo moraes
Enviado por ronaldo moraes em 20/12/2009
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