Nostalgia

Sentado na varanda, olhando o horizonte, ele nem sente o tempo passar, perdido nos seus pensamentos. De repente a esposa, companheira de tantos anos, interrompe aquele momento de solidão da alma.

– "Pensando no que, meu velho?" – Ela pergunta, querendo entrar no mundo interior do marido.

– "Pensando na vida" – ele responde ainda absorto nos pensamentos.

– "Que vida, meu amor?" – com doçura ela insiste.

– "Na nossa vida, na vida que passou. É tudo tão rápido. A vida é tão ligeira".

– "É, a vida é muito rápida" – ela concorda, meio que pavimentando a estrada a fim de que ele se solte.

– "Chega a ser até engraçado. A gente trabalha, se esforça pra criar os filhos, pra fazer tudo certo, pra poder ter o direito de descansar, de ter o direito de gozar a vida, e quando esse dia chega, a gente descobre que na verdade queria aquilo que passou. Aquilo que a gente não pode ter mais".

– "Mas o que é isso, meu velho. Não fica assim" – ela fala preocupada com a tristeza que ele deixa transparecer.

– "Sabe, minha velha. Eu tô com uma saudade danada das crianças. Ainda agora eu tava escutando o barulho deles correndo pela casa, bagunçando tudo, e você correndo atrás deles tentando fazer eles ficarem quietos".

– "Você lembra o dia em que o Paulinho caiu da escada?" – ela pergunta alimentando a memória do marido.

– "Não tem como não lembrar. Você quase morreu de susto. E os teus gritos assustaram toda a vizinhança. A casa ficou cheia de vizinho querendo saber o que tinha acontecido".

– "E eu não tinha motivo pra gritar?"

– "Mas não precisava tanto. O menino nem chegou a quebrar nada".

– "É que eu vi ele caindo. O tombo foi muito feio. O Paulinho parecia que era de borracha, caía já levantava, parecia que nem sentia dor..."

Ela para e pensa por um instante – "Agora, susto mesmo foi quando ele teve meningite. Foram noites inteiras sem dormir do lado da cama dele no hospital".

– "Isso eu nem gosto de lembrar, que medo de perder o menino! Já se passaram tantos anos e o meu coração ainda se aperta quando eu lembro daquilo".

– "Graças a Deus que já passou! E ele tá aí, um homão forte e bonito".

– "É verdade, puxou o pai!" – ele fala pra provocar a mulher.

– "Ah, é! E a mãe, o que é que ele puxou?"

– "Sei lá. Deve ter puxado algum defeito" – ele diz se divertindo com a frase.

– "Ah, é! Que maravilha! Os defeitos são da mãe e as qualidades são do pai. Você continua o mesmo. Quem não te conhece é que te compra".

– "Você sabe que eu te amo, minha velha!" – fala sorrindo para esposa, que retribui com um beijo na face.

Em seguida, a alma volta a refletir e o seu olhar novamente se perde no horizonte, enquanto ela se assenta na cadeira ao lado e prepara agulhas e linha para começar a tricotar. Ficam assim por um tempo até que ele quebra o silêncio.

– "Velha!"

– "O que foi?"

– "Quanto tempo faz que a Claudia não dá notícia?"

Ela pensa um pouco e depois arrisca:

– "Acho que uns vinte dias".

– "Vinte dias, não. Já faz dois meses. A última vez que ela ligou foi logo depois do dia dos pais. A Cláudia esqueceu de ligar no domingo e ligou na terça".

– "Ah, meu velho, não fica triste, não. A Claudinha é muito ocupada, a vida dela é muito corrida. Ela não faz por mal".

– "Não tô triste não. Eu tô é com saudade"!

Ele faz um breve silêncio, as lágrimas estão prestes a rolar pela face, com a voz embargada, quase que sussurrando, diz:

– "Velha!"

– "O que foi?"

– "Faz pipoca pra mim, faz".

– "Pipoca? Que é que deu em você pra querer comer pipoca?"

– "É que o cheiro da pipoca me faz lembrar as crianças e me dá a impressão que elas continuam por aqui".

Com os olhos marejados de lágrimas, ela se levanta e sai em direção à cozinha.

Laerte Cardoso
Enviado por Laerte Cardoso em 21/05/2010
Reeditado em 21/05/2010
Código do texto: T2270306
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