Petits récits de la vie moderne

Pequenos contos da vida moderna

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L’assassin d’amour

(o assassino do amor)

Não deve se furtar dos detalhes, velho assassino, saiba que o sangue é tua vida, nossa vontade esta no tempo presente, e um romance as vezes só serve de plano de fundo para os crimes, teus crimes. Desocupa a sala de estar, leva o cadáver do morto ao teu quarto, vê no espelho teu olhar esguio escapar e percorrer as dimensões futuras como num salto de felino, que as garras cortam coração. Ao teu alcance, esconde a faca bruta, embebida ao sangue da impostora, da que teu nome difamou. Guarda a faca dentro da barriga dessa mulher, esconde o corpo nessa casa que não queres mais nem em sonho. Consuma o resto frio deste amor que sobrou, carbonizando-o num imenso cigarro de frustrações e ilusões.

Caroline avec le désir et les pommes

(Caroline com desejo e as maçãs)

Ela deixava o corpo movimentar-se ao vento, as vezes, quase em vão. Segue a tênue linha do sol, como o vegetal que procura a luz. Mas são nas noites quentes que Caroline morde a maçã, prova o amargo profano que a este fruto foi concebido, e cria asas, sai voando. É a serpente voando a cidade, saindo do campo, indo contra a luz, procurando corpos cansados, com dentes carregando seu veneno, com prazeres e doenças que nos fazem perder a cabeça. Caroline entra no seu beco preferido, escuta todos os ruídos da noite, sente o cheiro de quem procura por prazer, de quem obedece seus instintos. Abre a porta do seu Inferno particular, um pomar obscuro, queimando em mil demônios. Aos poucos os sodomitas, os hereges, os profanos, sátiros, judeus comedores de carne, os portugueses naufragados, chegam com olhos apagados, e Caroline abre a porta do seu Inferno e oferece-lhes a maçã, que irá corromper sua virtude. E a cidade cresce durante a noite, como num tremendo carrossel gigante que roda em torno de um pomar e, em torno de Caroline.

Au revoir, belle parole

(A bela que falava adeus)

Sentava em um bar a tarde e pedia gim tonica com duas finas fatias de limão, em seus lábios vermelhos de batom prostituto, estava sempre um cigarro aceso, cuja fumaça pairava sobre o rosto e inclinava seu olhar ao mistério. Via ao seu redor a tarde se desmembrando com suas nuvens e raios ultravioleta e, ao chegar da noite esticava suas belas pernas apertadas dentro de um vestido preto e saia dizendo “adeus” ao garçom. Mas sempre voltava no outro dia. No bar restava um lamento misterioso de silencio, que se misturava ao cheiro de seu perfume e a fumaça deu seu cigarro. Naqueles tempos passados, o bar era freqüentado só por gente muito rica, tinha uma vista para o jardim perfeitamente organizado com rosas, orquídeas, e outras plantas que lamentavam sua partida sempre ao despertar da noite. Houve um dia, em que a bela disse adeus e não voltou. O bar veio a falência um mês depois.

La faim bourgeois

(O burgues faminto)

O burguês senta na mesa e um banquete lhe é servido. Janta sozinho para não se preocupar com a divisão do alimento, que lhe é tão valioso quanto o ouro. Ordena que jarras de vinho sejam lhe trazidas e que o frango deve retornar ao forno por mais, no mínimo, meia hora. Devora aquilo que vê pela frente sem fazer descrição ou julgar sua fome. Ao passo de meia hora o frango volta e já saciado, devora metade do frango e deixa toda uma sujeira para trás. Levanta da mesa posta e diz que podem se alimentar agora dos seus restos, mas que o frango que o vinho vão com ele para o quarto, pois ao deitar na sua cama e contemplar o belo saco de ouro desenhado no teto, sempre sente fome. Noite passada, ao fazer a mesma coisa, morreu engasgado com um pequeno osso da galinha, os empregados nada ouviram porque estavam ocupados em devorar os restos de comida que o burguês deixou.

Reny Moriarty
Enviado por Reny Moriarty em 23/08/2010
Reeditado em 24/08/2010
Código do texto: T2454980
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