Chiclete de Urtiga

A gente só conhecia os doces feitos em casa, que eram vendidos em tabuleiros na porta da escola, ou na feira de sábado, ou ainda na porta da igreja, onde aos domingos as crianças da cidade faziam catecismo. Quando não tinha doceira em nenhum desses lugares, era só ir à casa de Dona Nena ou da Preta Maria, que lá sempre tinha.

Um dia a bodega de Severiano trouxe uma novidade: chicletes. Vinham duas pastilhas branquinhas embaladas em uma caixinha amarela, os tais “Chiclets Adams”. Depois de mastigar a pastilha docinha, sobrava uma borracha quase sem sabor que não se dissolvia fácil, aí os meninos passavam um bocado de tempo mascando aquilo. Pareciam vacas mascando capim. O problema que aquele doce era muito caro, e os meninos pobres (quase todos os meninos da cidade) não podiam comprá-los.

Mas a invencionice deles superou esse obstáculo. Um dia, uma turma estava caçando passarinhos com baleadeira (estilingue) na beira da Lagoa de Baixo, onde havia uma capoeira cheia de urtigas. Era daquelas urtigas grandes, quase arbustos. Logo observaram que quando feriam o caule da urtiga, saia uma seiva branquinha, que depois de algum tempo secava e ficava com a consistência de borracha.

- A gente tapa buraco de cabaça rachada com isso, pra não vazar água. – disse uma lavadeira ao filho.

Sentindo a consistência da seiva, o moleque lembrou-se do tal chiclete, colocou na boca e começou a mascar.

- Nossa! É igualzinho ao chiclete Adams.

- Cuidado, menino. Pode ser veneno.

- É não, mãe. Não se tapa cabaça com isso? E a gente não bebe a água da cabaça? Então, se fosse veneno, envenenava a água. E é docinho.

A novidade logo se espalhou, e foi assim que os meninos substituíram os caríssimos chicletes de caixinha pelo chiclete natural de urtiga. Num dia davam pedradas nas urtigas para escorrer a seiva. Dia seguinte iam pegar, já no ponto de borracha. No entanto, no nordeste quase nada dura para sempre, e as urtigas não resistiram à seca daquele ano, acabando com aquela fonte de chicletes.