Diário

Comprei um diário, sabe, resolvi recomeçar do começo, afinal, tudo começou assim, anos atrás quando eu morava... Ah, não importa onde eu morava mesmo, (baixinho) mas é na mesma cidade que eu moro hoje sim hihihi. Mas a verdade é que vi um diário esses dias, capa bonita, jeitosa que só ela, “um tal de Picasso”, disseram pra mim, botei a mão no queixo e lembrei de quando tinha um diário, tudo começou ali, tudo meu se encontrava ali, desde a braveza do Vô João até a surdez da Vó Zefa. Então, como estava dizendo, eu comprei um diário pra começar de novo, é, um diário, pra contar histórias e estórias de vida e de morte matada, porque não? Histórias e estórias que a gente gosta de ouvir, de contar, de sonhar, porque não? Não via a hora de chegar em casa, mas tava na hora do almoço do trabalho, “e essa hora que não passa, preciso escrever no diário”, fui trabalhando sem tirar os olhos do Picasso, “caramba, mas essa figura é bonita demais, acho que vou mandar pintar um quadro igual a esse”, aí chegou a hora e fui a passos largos pra casa, “mas que coisa que não chego logo em casa”, confusão na porta, cadê a chave? Achei. Abri a porta, fechei-a por dentro com pressa e respirei fundo. “Uffa, consegui.” O telefone tocou: PLIN PLIN PLIN! “Oi Mariquita, eu posso te ligar depois?” Mariquita: blábláblá, meia hora depois, Mariquita desligou. “Agora sim.” Sentei, pousei o diário sobre a mesa, lancei a caneta e... bateram na porta: TOC TOC TOC. Ah não, agora não ... TOC TOC TOC. “É a sindica, uma hora na conversa, não.” Desesperei, corri a caneta somente com uma oração: “Escrevi no Diário.” Levantei pra abrir a porta. Anos atrás, eu tinha mais tempo.

Ana Nery Machado

07/12/2010