Pedro Amansador de Abelhas

O alvoroço começou à tarde na Igreja Batista de Alagoinha. Um enorme enxame de abelhas invadiu o local, o Pastor cancelou o culto de logo mais à noite. Os curiosos permaneciam ali, observando as abelhas, entre eles algumas crianças. Parecia que as abelhas estavam se recolhendo para passar a noite, formando uma enorme bola zunidora pendurada numa das ripas do telhado. Num dado momento a ripa se quebrou, espalhando abelhas para todo lado. Foi uma correria só.

Pedrinho, uma das crianças que estava mais próxima, logo foi envolvido pelo enxame. Paralisado de medo, viu seu corpo ser coberto pelas abelhas, que estavam pousando nele, principalmente no ombro e nas costas.

- Vai ver que as abelhas foram atraídas pelos seus cabelos cor-de-mel. – Pilheriou um dos curiosos.

Maria Rita, uma amiga dele escurinha como Zé Leite, que também estava ali, começou a chorar apavorada.

- Fique longe! – disse Pedrinho trincando os dentes, pois temia que as abelhas entrassem em sua boca. – … mas não vá embora. Estou com medo!

Zé Leite teve uma idéia.

- Vou chamar seu Chico Abelheiro. Ele mora aqui perto e vai saber o que fazer. Não se mexa!

Não precisou. Seu Chico Abelheiro já estava chegando, chamado pelo Pastor. Num carrinho de mão trazia um caixote e alguns apetrechos.

- Salve ele, seu Chico! – implorou Maria Rita entre soluços.

- Fique calma. Tem perigo não. Quando estão assim, em enxame, elas não picam. Vou dar um jeito.

Nisso alguns moradores vinham chegando. Uns traziam trapos embebidos em querosene, outros tochas já acesas.

- Vamos fazer bastante fumaça. Quem sabe assim espanta elas. – Disse um, que parecia ser o líder da turma.

- Para trás! – Gritou seu Chico. – Não pode alvoroçar as abelhas, senão elas começam a ferroar todo mundo. Levem essas tochas para longe daqui, rápido!

A turma logo obedeceu a seu Chico, que era o homem mais entendido de abelhas do lugar. Ele então voltou-se para o menino e as abelhas, observando-os por alguns momentos. Pegou o caixote e colocou bem perto. Abriu a tampa. Lá dentro havia algumas grades e um pedaço de favo de mel. As abelhas começaram a se alvoroçar, mas seu Chico não se importou. Com uma vassourinha macia começou a varrer lentamente as abelhas para dentro do caixote. Tão logo caiam lá, voavam de volta ao corpo de Pedrinho, até que seu chico exclamou:

- Achei! – e varreu uma abelha diferente das outras para dentro do caixote. – É a abelha-rainha!

Como mágica, todas as abelhas começaram a entrar no caixote, formando uma bola em torno da rainha. Em poucos minutos Pedrinho estava livre delas. O povo que mantinha-se longe, foi se dispersando. Somente Zé Leite, Maria Rita e Pedrinho ouviam interessados a explicação de seu Chico Abelheiro.

- Essas abelhas formaram enxame para procurar um lugar para fazer colméia. Todas seguem uma abelha-rainha, e quando encontram um espaço adequado começam a trabalhar, umas fazendo cera, outras fazendo favos da cera e outras colhendo néctar e pólen das flores. A abelha-rainha bota ovos para criar novas abelhinhas, e assim o enxame cresce e produz bastante mel.

Maria Rita estava mais calma.

- Puxa, Pedrinho, você é mesmo um amansador de abelhas. Nenhuma te picou!

- Fiquei morrendo de medo… eu queria mesmo era amansar uma abelhinha preta! – Sorriu, já calmo após o susto.

- Essa já está amansada…

Quando escureceu, todas as abelhas haviam se recolhido ao caixote. Seu Chico colocou-o dentro de um saco e o levou para seu sítio. As crianças se foram, contar a aventura aos outros.

Apesar do susto, Pedrinho e Maria Rita se afeiçoaram às abelhas, e nos fins de semana iam ao sítio de seu Chico ajudá-lo. Anos depois, já adolescentes, firmaram namoro. Uns diziam que combinavam como café com leite, outros diziam que combinavam como mel e torrada, ele loirinho, ela escurinha. Juntos comerciavam o mel de Seu Chico, em princípio na feira de Alagoinha, depois em Pesqueira e Arco-Verde, e quando tinha bastante, iam à Caruaru. Aprenderam muito sobre abelhas e, quando adultos e já casados, montaram um apiário no sítio dos pais de Maria Rita, na Laje do Carrapicho. Ao morrer, seu Chico deixou para eles suas abelhas.

Seus filhos foram mandados a São Paulo para estudar, mas tinham mel nas veias, e não demoraram a montar apiários de abelhas italianas no interior de São Paulo. Produziam mel de floradas de eucalipto, de laranjeiras, e de flores silvestres, conforme o local do apiário, e também aprenderam a produzir mel com própolis e geléia real.

Pedrinho e Maria Rita produziam méis especiais, de abelhas jataí, mandaçaia, uruçu, tiúba e jandaíra. Uma indústria farmacêutica passou a comprar toda a produção de mel de uruçu e mandassaia para fabricar o “Mel Rosado”, um mel medicinal muito utilizado em crianças.

Foi assim que Seu Pedro e Dona Maria Rita se tornaram conhecidos produtores de mel no agreste Pernambucano, e sua descendência em São Paulo.