O Gato

O gato estava faminto. Como não havia comida perto de onde se encontrava, partiu à procura de alimentos. Um sol escaldante, a pino, jogava luz e calor sobre o quintal. Ele seguiu em frente com seus passos lentos. No caminho perseguiu uma lagartixa que ao pressentir o perigo, fugiu rapidamente e se enfiou por baixo de uma telha. Ele escalou o primeiro muro. Por cima do segundo continuou caminhando, molengamente, e quando ia escalar o terceiro, apareceu bem a sua frente uma enorme cerca elétrica que o fez parar a caminhada.

Ficou indeciso. Mas os gatos são curiosos e exploradores por natureza, principalmente, quando andam em muros e telhados a procura de alimentos. Queria entender o porquê daquela cerca. Olhou-a, um tanto desconfiado com cara de poucos amigos. Acostumara-se a andar livremente sobre os muros até com cacos de vidro. Estranhou. Aí, aparece em sua frente aquele muro idiota, coroado por uma cerca de arame, em vez de cacos de vidros, estes bem mais difícil de andar.

Depois de examiná-la concluiu que era uma cerca muito fraca e por isso não havia motivo para ter medo. Seria fácil passar por ela. Não havia motivo para se esquivar. Já conhecera cercas mais perigosas, até mais fechadas, e com arame farpado. Os bigodes pontudos ficaram tensos, as orelhas esticadas em posição de sentido, o rabo em alerta. Mas ao notar, do outro lado da cerca, a figura de um rato, teve a sua fome ativada. Era o que precisava fazer, almoçar um rato. A presença da cerca não o impediria. Tinha que atacá-lo, imediatamente. Com um olhar oblíquo, mediu a distância entre ele e o rato. Só precisava passar pela cerca para conseguir o que desejava. Seria fácil. A cerca em pé, tramando desmanchar o desejo do gato.

Ele deu três passos e parou. Retesando as patas traseiras e as dianteiras ficou a observar a cerca, preparando-se para pular. Parou. Então,Viu que bastava passar por entre os fios de arame para conseguir atravessá-la e pegar o rato e, saciar sua fome. Gato e cerca, não cabem num mesmo muro.

Enfiou-se por entre os arames da cerca, confiante. Todavia, ao se meter por entre os fios, tocou o rabo em um deles, ouviu um ruído esquisito e, simultaneamente, foi atingido por uma descarga elétrica, como se fosse um soco no estomago e despencou-se sobre o quintal. A cerca era um perigo permanente, mas o gato não sabia. Durante a queda, não conseguiu se virar para cair de pé, como faz sempre todo gato quando cai, e caiu de costas, estatelado no chão. Sua queda foi grande. De cima do muro, a cerca orgulhosa festejava o grande feito, cumprira sua missão de evitar que algum intruso invadisse o seu quintal.

O gato ficou espichado no chão. Ferido, não conseguia se levantar. Com queimaduras profundas nas patas e bocas, as costelas doendo, as pernas doendo, sentia o estertor da morte. Já não se movimentava mais, o coração disparado. Entrou em convulsão, contorcendo-se, enquanto uma fraqueza tomava conta do seu corpo. Antes que pudesse compreender o que tinha acontecido um filete de sangue saiu de sua boca. Aos poucos, sua respiração foi ficando lenta e parou de vez. Tentou respirar e tudo escureceu. E assim, o gato morreu de estômago vazio