Fim

“Engole o choro, menina!” Ela entrou em casa, pensando naquela frase, lembrando-se daquela época... De como tão pouco tinha mudado em sua vida. Tivera um dia exaustivo de trabalho, recebera várias repreensões. De tanto a chamarem de incompetente, ela acabou por se convencer de que realmente era. E também não era boa em nenhum de seus passatempos. Gostava de desenhar, mas não tinha talento. Gostava de cantar, mas não possuía uma bela voz. Gostava de praticar esportes, mas era muito lenta. Então resolveu parar de gostar.

“Engole o choro, menina!” Tirou o casaco, atirou-o sobre o sofá, colocou a bolsa em cima da mesa. Estava tão cansada... Cansada de acreditar que poderia ser diferente, que as coisas poderiam mudar para melhor, que ela poderia aprender a lidar de uma maneira mais tranquila com tudo... Quando era criança, era mais fácil acreditar, porém ela perdera essa habilidade com o tempo. Acreditava em Papai Noel, mas ele nunca apareceu. Acreditava em amizades, mas elas nunca duraram. Acreditava em sonhos, mas eles nunca se concretizaram. Então resolveu parar de acreditar.

“Engole o choro, menina!” Subiu as escadas a passos lentos e pesados. Suas ações eram tão mecânicas que não sabia mais por que as realizava. Não conseguia mais visualizar seus objetivos, tamanhos eram seus fracassos... Estava em pedaços. Vivia por suas habilidades? Não as tinha. Vivia por suas crenças? Não as possuía. Vivia somente por definição biológica. Então resolveu parar de viver...

“Engole o choro, menina!” “Eu não consigo, mamãe!” Entrou no quarto, remexeu na gaveta, pegou a arma. Lágrimas desamparadas de desesperança rolavam incessantemente por seu rosto pálido e inexpressivo. Era tão reprimida que sentia que a qualquer momento poderia implodir. Sentou-se na cama, olhou ao redor, com a vista embaçada. Engoliu o choro. Apertou o gatilho. E fim.

Nicole Ayres
Enviado por Nicole Ayres em 04/04/2011
Código do texto: T2889271
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