Borboletas na Janela

O dia acabara de amanhecer, ela levantou-se e caminhou para perto do beiral da janela, sentiu-se fraca, porém feliz por poder caminhar um pouco.

Afinal, já faziam dias que ela mal conseguia erguer a cabeça, as fortes dores estomacais que lhe acometiam diariamente tiraram-lhe completamente o apetite e alimentar-se era mais um suplício que um ato prazeroso.

- Já nem me lembro mais quanto tempo estou nesta cama – pensou Iolanda.

Ainda sentindo-se muito enfraquecida, interrompeu sua caminhada até a janela e parou ali mesmo, sentando-se em uma confortável poltrona branca que havia próximo a seu leito.

Apesar de sua aparência abatida e enfraquecida, seu rosto marcado por grandes olheiras, possuía contornos delicados, de uma jovem que ainda não completara 25 anos.

Ficou olhando em direção à janela que não conseguira ainda alcançar, e notou a presença de uma linda borboleta, suas asas eram de um lindo azul brilhante, com contornos em tom mais escuro e leves manchas brancas.

Pousando sobre o vidro da janela, ela mexia de forma cadenciada suas belas asas, como que exibindo-se à Iolanda, que a admirava boquiaberta por sua beleza.

Iolanda sorriu para si mesma, lembrando do tempo em que era uma garotinha, cheia de vitalidade e alegria.

Recordou-se das claras manhãs de primavera em que caminhava de mãos dadas com sua mãe, atravessando o pomar de sua casa, sentindo o doce aroma das frutas maduras.

- Como era doce minha vida – pensou ela – sempre ao lado de minha querida mãezinha.

Deixando um pouco de lado seus pensamentos, ela observou outra borboleta pousar ao lado da borboleta azul.

Esta era toda laranja, rajada de preto e branco, e ficou bem próxima da outra, também mexendo suas asas em um balé único e harmonioso.

Elas estavam próximas uma da outra, como se estivessem se beijando, Iolanda perdeu-se novamente em lembranças.

- Lembro como se fosse hoje, o dia em que fui ao parque com Luís, ele sempre foi tão atencioso comigo, aquele dia as flores estavam cheias de borboletas de todas as cores e matizes.

Este dia em especial, foi marcado pelo pedido de noivado que seu namorado Luís lhe fizera, para ela foi inesquecível, o sol iluminava as árvores, e uma leve brisa soprava em seus rostos.

Já namoravam a dois anos, e Luís planejava casar-se com ela antes de completar três anos de namoro.

- Aceita se casar comigo – disse-lhe o rapaz

- Claro que sim, é tudo que mais quero desta vida – respondeu-lhe sem exitar.

Os dias e semanas seguintes foram de alegria e descontração, planos feitos com amor e carinho, todos os cuidados com detalhes como vestido de noiva, igreja e floristas, já estavam sendo tomados por Iolanda, que vivia seu momento de sublime alegria.

Após dois meses, em uma manhã porém, Iolanda acordou com uma sensação ruim no estômago, levantou-se depressa e correu para o banheiro de seu quarto onde inevitavelmente colocou para fora todo o alimento que houvera consumido na noite anterior.

- Iolanda, você está bem minha filha?

- Sim mamãe, estou apenas com forte dor no estômago.

- Abra a porta do banheiro, quero vê-la – disse aflita sua mãe.

Dona Marisa, mãe de Iolanda ajudou sua filha a caminhar até sua cama e ligou urgente para o escritório de seu marido para que o mesmo viesse ao seu socorro para levarem a filha ao hospital mais próximo.

Abandonando novamente seus pensamentos Iolanda voltou a observar as borboletas que agora formavam um trio.

Juntou-se às duas existentes, uma terceira borboleta de um tom suave de amarelo, esta menorzinha, aproximou-se também das outras duas borboletas, e ficaram muito próximas, como se estivem unidas, ligadas, formando uma aquarela viva de lindo colorido.

- Por que ? Indagava ainda a moça em pensamento,- por que naquele dia em que minha vida estava tão linda, meu sonho de casar com Luís estava se concretizando, por que tinha que acontecer isto comigo?

Quando seus pais a levaram ao hospital, ela ficou internada para exames, pois seu estado havia se agravado acentuadamente.

Seu noivo foi chamado, e imediatamente dirigiu-se ao hospital para visitar sua amada.

Dias se passaram, e a conclusão dos exames foi como uma bomba a explodir nos corações de todos daquela família, a jovem Iolanda estava então, diagnosticada com uma forma altamente nociva de câncer no estômago.

A dor apossou-se de todos, e sentimentos de revolta misturaram-se com dor e esperança de que tudo passasse como um sonho ruim.

Mas o que passou foram os dias, e Iolanda internada naquele quarto de hospital viu-se prisioneira de tratamentos dolorosos e pouco eficazes para combater o mal que havia tomado conta de seus jovens órgãos.

Ela já nem contava mais os dias e apesar das visitas diárias de seus pais e de seu noivo, a triste rotina estava tirando-lhe o resto de forças que ainda tinha.

- Essas borboletas- pensou Iolanda- são como meus pais e Luís, as três estão próximas a mim, me olhando e velando por mim, mas da mesma forma como não consigo caminhar até a janela para tocá-las, sinto que nunca mais poderei me juntar a eles três como gostaria novamente de fazer.

Sentada naquela poltrona branca, olhando enternecida para as três borboletas na janela, a luz que iluminava os olhos de Iolanda foi mansamente se apagando, livrando-a de tanta dor e sofrimento, a exemplo da lagarta que transforma-se em crisálida para surgir em liberdade como borboleta, livre das amarras que lhe prendiam, Iolanda deixou este pobre casulo para alçar vôos mais altos.

Fim.