Não se esqueça de Penélope

Não sou um conquistador, mas não pude deixar de perceber a garota loura que estava no restaurante. Dizem que as louras são raras, que são todas falsificadas e que a única forma de termos certeza é leva-las para cama para ver os seus pelos sexuais. Sendo morenos estamos diante de uma loura falsa. Mas isso não importa. Ela era loura sim, e cheirosa. Estava sozinha e sentada numa mesa bem defronte a mim. Logo nossos olhares se cruzaram, e, tomando coragem, fiz sinal que viesse sentar na minha mesa. Sorriu, com grandes dentes brancos e não aceitou. De longe, indicou que eu é que deveria ir para sua mesa. Hesitei por um momento, mas fui. Não sabia que estava começando um pesadelo.

O seu nome era Penélope, como descobri mais tarde. Estava um pouco de porre, com um sorriso estranho no rosto. Pediu um uísque, enquanto eu, pedi uma pizza pequena e um chope.

São Paulo era um lugar estranho, onde eu passava a semana trabalhando por falta de coisa melhor. Jantava todos os dias em algum restaurante nas proximidades da Brigadeiro Luiz Antônio. Depois me recolhia a um hotel fuleiro, com cheiro de poeira e goteiras.

Aquela loura seria a minha primeira conquista se não estivesse embriagada. Logo percebi a sua agressividade. Ria alto, falava palavrões, e quando ofereci um pedaço de pizza para minorar, um pouco, o seu teor etílico, esmagou a minha pizza com a mão e jogou no chão. Que furada! Mas, cavalheirescamente, permaneci na mesa tentando conversar com ela.

De longe o gerente fez sinal me chamando. Fui até lá e ele me informou que chamaria a polícia, que a minha acompanhante estava perturbando o ambiente familiar de seu restaurante. Pedi calma ao gajo e retornei à mesa.

Conversei, calmamente com ela, como se fosse o seu psiquiatra. Alguma coisa devia tê-la ofendido muitíssimo. Mas ela se recusou a entrar em detalhes. Pedi o seu telefone, para encontrá-la no dia seguinte, quando estivesse melhor da bebedeira. Ela escreveu com um lápis de sobrancelha num guardanapo.

Pedi licença para ir ao banheiro e, no caminho, deixei o telefone com o gerente, instruindo-o a ligar.

Voltei a mesa e conversei com ela, que já estava mais calma. Após uns dez minutos surgiu do nada um sujeito forte, vestindo um paletó sobre uma camiseta, como se tivesse saído com pressa. Estava com cara de brabo. Ele disse:

- Vem, vamos embora!

- O que você está fazendo aqui? – disse ela espantada.

Mas levantou-se e o acompanhou.

Eu estava me sentindo o último dos traidores. Paguei a conta, e junto com o troco veio o guardanapo com o telefone. Estava escrito: “Don’t forget Penélope”.

E não esqueci, até hoje.