ETERNA JUVENTUDE

Amanhã será um dia muito especial para ela, mas uma dúbia sensação a deixa agitada. Alegria, sim, pelo próprio dia: quinze anos. Tristeza, também, pois será mais um ano em sua vida: ela se arrepia toda quando pensa em envelhecer.

Sentada na poltrona, as pernas cruzadas, ela olha nervosamente para o relógio de pulso. Onze e meia. Mais meia hora e completará quinze anos. Nascera precisamente à meia-noite. Está ansiosa, inquieta. Quatorze anos por mais meia hora?

Curioso esse medo de envelhecer. Na flor da juventude, quando todas as coisas belas da vida lhe sorriem, quando está desabrochando para a vida, eis esse medo insensato de se tornar uma velha. Não sabia ela que muitos anos teria de crédito pela frente? Com esse belo rosto isento de rugas, a lembrar um quadro renascentista, com esses olhos vivos, brilhantes, essa boca tão insinuante, com todos esses atributos tão bem merecidos, pensar na velhice por quê?

Ela não consegue disfarçar o nervosismo. Anda de um lado a outro do quarto. Debruça-se à janela, espia a rua deserta, retorna ao sofá, pega um livro qualquer, faz que o lê, atira-o longe, fuma um cigarro (a inocente menina fumando?), outro cigarro, e mais outro.

No teto, uma lagartixa miúda andava de um canto a outro, à cata de insetos. Ela percebeu esse vaivém do animalzinho e se comparou a ele: também andava para-cá-para-lá-para-cá-para-lá. Admitia, sim, a diferença: o vaivém da lagartixazinha tinha razão de ser, era natural, sem a menor ansiedade. O dela, não. Vagava perturbada pelo quarto, os nervos à flor da pele. Chegou mesmo a invejar o bichinho, aquele animalzinho tão insignificante, tão repulsivo, que parecia competir de maneira desigual com ela. Só no espaço de cinco minutos, contou cerca de seis moscas e outros dois insetos que a lagartixa capturou. Poderia ser impressão sua, mas seria capaz de jurar que percebeu um ar de contentamento na face daquele bichinho.

Por um momento, deixou de olhar para o teto e voltou os olhos ao relógio. Onze e quarenta e cinco. Um frio gelado lhe percorreu todo o corpo. Nesses breves, longos instantes que antecediam à data tão ansiada (ansiosa?), sua mente se povoou de reflexões bobas sobre sua própria existência. E cada vez mais um nervosismo insano parecia dominá-la.

Quando tinha dez anos, o avó, ao vê-la triste após apagar as velinhas do bolo de aniversário, tentou alegrá-la, filosofando sobre a vida e a maneira de se lidar com ela. Os anos passam inexoravelmente, como a água passa debaixo da ponte e como passa o vento por entre as folhagens: sem que possamos perceber. Quando menos esperamos, já estamos maduros, endurecidos por nossos conceitos duvidosos, presos numa carcaça velha. É quando nos lembramos dos (verdes) anos que ficaram para trás, quando (ó candida estupidez!) tentamos reviver a juventude que despencou há muito no poço de nossa existência insatisfeita. Hoje se é jovem, a tinta ainda fresca. Fechamos os olhos e, ao abrirmos, vemos o moço risonho transformado num velho taciturno. Assim é a vida, minha linda. Momentos magníficos, momentos amargos, que passam por nós como num lampejo. Bons, maus, devemos vivê-los plenamente. Que chato seria viver eternamente num mar de rosas, não acha?

O avô era um sábio. Passara os últimos anos de vida na tentativa de entender as inquietações humanas. O longo tempo de estudo não foi suficiente para encontrar as respostas tão procuradas. Serviu-lhe apenas para levá-lo a uma clínica psiquiátrica, onde terminou seus dias. Mas o avô morrera há vários anos. Ela é quem estava ali angustiada com sua vida e com o tempo que se esvaía segundo a segundo.

Tornou a olhar para o relógio. Onze e cinquenta e nove. Desesperada, o corpo todo banhado em suor, atrasou o relógio em algumas horas e, satisfeita, dormiu o sono tranquilo dos sonhadores.

Há uma semana que, trancada no quarto, vinha atrasando o relógio.