A casa de Dona Maria

Lá estava Maria lavando as meias de seu marido, uma de cada vez. A cada par enxaguado eram lágrimas junto às águas.

Maria era uma típica dona de casa. Subordinada ao marido. Não estava infeliz com a vida que levava. Ela amava cuidar dos filhos e ter tempo de arrumar seu lar. Os dias se passaram lentamente desde quando se casara com Alberto. Claro, ela havia se casado com o amor da sua vida, ou era nisso em que ela acreditava. Alberto, antes deles se casarem sempre levava flores, e a enchia de mimos... Ah, Alberto não era mais o mesmo. As pessoas mudam, porém Alberto tinha se desvencilhado de seus princípios...

Alberto era doce, carinhoso, amava Maria, queria ter três ou quatro filhos. Tinha um olhar carinhoso, uma energia esplêndida. Sonhava em ter uma casa, e aos 27 anos já estava estável. Já tinha um bom emprego em um escritório de advocacia. Era um bom advogado, nunca havia perdido nenhuma causa. E aos 48, ainda não tinha perdido causas, havia perdido apenas a alegria de viver. Ele não se interessava por Maria, e agora ele acreditava que ela deveria obedecê-lo e realizar todas suas vontades. Pobre Alberto.

Seus dois filhos já haviam se ingressado na universidade e ambos saíram de casa. Dona Maria e Seu Alberto viviam em uma casa que era grande demais só para eles. A animação dela era arrumar a casa, afinal passava o dia organizando as coisas, sabia logo de manhãzinha o que deveria fazer naquele dia e o que comprar para casa. Pensava no almoço e na janta, e em como iria se arrumar para seu marido.

Alberto nesse dia havia chegado estressado. O caso que estava era complicado. Mal deu bola pra lasanha que Maria havia preparado.

Simplesmente, chegou, banhou-se, jantou, e por fim deitou-se.

Maria, já tristonha, terminou de lavar a louça e foi ao tanque lavar as meias que estavam sujas.

E voltamos às águas junto às lágrimas.

Ela estava descontente com a atitude de seu marido. Tinha ódio de quando ele não lhe dava atenção. Ele não dava valor às coisas que ela fazia. Ela por várias vezes pensou em suicídio, mas havia seus filhos e não podia deixá-los.

Alberto traíra Maria algumas vezes, porém ultimamente realmente por estar envolvido em um caso complicado e nem pensar em traição pensava. Alberto bebia com amigos, fumava e adorava uma boa conversa sobre política. Gostava da casa organizada para levar visitas, e no fundo ainda amava Maria.

Os sentimentos de ambos estavam confusos e vazios, também um namoro de 22 anos - e um casamento de 20 - por lógica estava mesmo desgastado.

Eles precisavam de uma luz, de um empurrãozinho do destino.

Contudo, não havia nada. O casamento estava por um fio, Maria sustentava como podia, porém já não suportava mais. Só lhe restavam às lágrimas, elas a compreendiam. Elas sabiam como deixar Maria em paz ao irem embora.

E lá vou eu mudar todo o final feliz. Sim, eles terminariam juntos. Mas que diabos de autor seria eu se não fosse complacente com a realidade?

Maria juntou todas suas forças, todas suas lágrimas. Pendurou as meias uma a uma, separando par a par no varal. Maria decidiu ser feliz. A noite se foi e Maria não havia adormecido se quer. A ansiedade fazia seu coração pulsar mais rápido, unhas ela não mais possuía.

Acordou antes de seu marido, preparou seu café da manhã.

Novamente, me meto na história, cheguei a refletir sobre diversas formas de Maria matar Alberto. Porém, por mais forte que Maria fosse, ela não era má, seu coração era puro. Ela não seria capaz de fazer algo tão cruel.

Alberto tomou café normalmente na companhia de sua mulher, e foi para o trabalho.

Maria arrumou suas malas, e em cada peça de roupa que pegava era uma lágrima a mais nos seus olhos, contudo era preciso mudar. Deixou aquela casa como se nunca houvesse sido dona dela.

Dona Maria, agora simplesmente Maria, estava livre de tudo que lhe fazia sofrer. Juntou seus cacos e os restos de sua personalidade, e resolveu sair do Rio de Janeiro para ir morar em Curitiba. Deixou tudo para trás.

Maria com muita fé conseguiu recomeçar. Maria é feliz, porque fez sua felicidade, e ainda está só. Ela ainda ama Alberto, todavia não pode mais viver com ele. Ele foi uma parte de sua história, porém agora a história é só de Maria.

Júlia Farolfi
Enviado por Júlia Farolfi em 05/04/2013
Reeditado em 21/04/2013
Código do texto: T4225052
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