Os dois irmãos.
 
 
Era quase seis horas da tarde, tudo estava calmo naquela praça, o sol já estava se despedindo cobrindo a encosta com os seus belos raios dourados, o vento corria lentamente, quase uma caricia para refrescar os nossos sentimentos.
Ao lado estava um casal de passarinhos, namorando num velho galho, fazendo os seus  barulhinhos de amor, sem saber o que pensar, me sentia uma rainha olhando para todo o meu reinado ali, onde podia eu desfrutar de toda aquela beleza.  Entre as flores variadas brincavam as belas borboletas, fazendo vôos de encantar, beijando as suas amadas flores, os aromas viajam livremente e tudo perfumando.
Aquela beleza era tão sublime que me senti dentro de um belo quadro retratado pelo mais arrojado pintor, mas deparei-me a pensar que o maior Artista era o meu Criador, ele criou todas as coisas perfeitas, cheias de magia, cheias de puro encanto, pois Ele nos criou, como  seres pensadores, seres viajantes, seres conquistadores do seu eterno amor...
Respirei fundo tentando tirar os pensamentos da minha cabeça, pois nunca busco o total entendimento, sou ainda tão pequena na minha aprendizagem, que prefiro já não me questionar apenas aprender a esperar pelos momentos certos que tudo virá até mim.
Olhei anestesiada por aquele momento, vi um belo menino sentado num banco de jardim, olhando para mim, com uns belos olhos negros, grandes e curiosos demais, ao seu lado estava outra criança mal vestido meio arreliado, quase chorando...
Olhei aquele quadro, mas algo me incomodou, olhar do menino, que não tirava os olhos de mim, sorri abrindo um espaço para que viesse até mim e assim aconteceu, levantou-se e arrastou o seu irmão mal humorado em minha direção.
Ajeitei-me no banco para lhes dar mais espaço, peguei na bolsa e procurei uns caramelos, que logo calou o mais pequenino e até ganhei um lindo sorriso e um beijo.  O mais velho deveria ter entre oito a nove anos, eram de origem cigana, povo que vinha da Romênia e que já estavam a muitos anos no meu país.
Entre a conversa deitada fora, vi um menino já crescido demais, que cuidava de seu irmão, pedia pelas ruas, pedia nos semáforos, ele tinha que levar dinheiro para o acampamento senão levava de cinto de couro e dormia ao relento. Segundo ele tinha muitos mais irmãos, mas eles faziam a outra parte da cidade, aquele pequenino era o que ele mais amava e não se desgrudava dele.  
Os olhos daquela criança eram tão profundos que eu ainda hoje os sinto a olhar para mim, a forma que ele falava era tão calma, tão resignada, que me encheu o coração de amor. Jamais ele falou que não amava seus pais apenas que eles eram doentes e sentiam saudades de seu país.  Na conversa soube que o seu pai bebia muito, a sua mãe andava lendo a sina das pessoas, mas todos quase fugiam de medo dela, pelo seu aspecto desmazelado...
Ele falou que havia noites que nada comia para dar ao seu irmãozinho, mas que tinha que levar moedas para casa, senão o pai ficava enfurecido, ainda me lembro das suas mãozinhas, agarrando o seu irmão que comia caramelos sem parar... Tirei algum dinheiro e lhe dei, mas os levei até a uma pastelaria e os fiz lanchar, como era agradável os ver comer, parecia que estavam comendo o maior manjar do mundo e quantas vezes eu vi ali crianças fazendo cara feia á comida, que paradoxo de vida e que injustiça...
Felizes eles foram embora, naquele dia bem mais cedo, sabiam que levam já o suficiente para que os seus pais ficassem felizes e eu fui para casa tentando esquecer toda aquela triste história.
Os dias passaram os meses também  até que chegou o Natal e logo veio o Ano Novo na véspera, lembro-me de passar do outro lado da estrada que passava ao lado de triangulo e algo me incomodou, olhei para trás e me pareceram aqueles meninos do parque, não tinha como voltar para trás e afastei os pensamentos de grande preocupação com aquelas crianças...
A noite correu normal, típica do ambiente de festa, mas que eu não gosto muito sempre entendo que é a nossa cultura.  Voltei para casa sem fazer o mesmo percurso e sim outra estrada menos perigosa e acidentada.
No dia 2 de Janeiro vejo o jornal local, onde tem como noticia de primeira pagina, as duas crianças que morreram na entrada da cidade, tentei conter as lágrimas, tentei enganar-me a mim mesma, não eram elas, não podia ser elas, as minhas mãos tremiam, queria soluçar e não conseguia, estava precificada demais, aconteceu e podia ter evitado.
Se eu já não gostava de passagens de ano, as passei a odiar as mesmas, os meninos não foram para casa, pois não tinham moedas para dar aos pais e ficaram por ali na esperança de ganhar algumas, mas noite fez-se muito fria, o transito abrandou e eles se sentaram juntinhos para se aquecerem do frio e adormeceram.
Um carro veio desgovernado e galgou o triangulo matando os dois meninos, morte estúpida, morte horrível mesmo...
E a vida nos trouxe aqueles dois seres de luz até nós, logo ela os levou, para mim eles trouxeram um ensinamento brutal que devemos dar valor a tudo o que temos como também sempre ajudar e a amar incondicionalmente, pois no amanhã nós poderemos não estar mais aqui!
Betimartins

Betimartins
Enviado por Betimartins em 03/07/2013
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