Nalu sonhadora

Nalu parecia ser uma menina comum aos olhos dos outros, mas na verdade não era bem assim. Ela não tinha nenhuma característica física que a diferenciasse das outras garotas de 7 anos, mas havia nela algo muito especial; algo que ninguém notara: sua supercapacidade de questionar.

Certo dia, ao sair com sua mãe, passaram por uma movimentada avenida de São Paulo, onde se via um caos em todos os lados: carros buzinando freneticamente, motoqueiros se esgueirando pelo pequenos corredores que se abriam entre os automóveis, camelôs desesperados por venderem seus famosos produtos “ ching lings” e gente caminhando apressada a todo instante. Foi quando a pequena Nalu avistou um senhor barbado na calçada oposta, jogado à própria sorte; tão esfarrapado quanto uma boneca de pano mais que usada. Imediatamente, a garota parou de andar e fixou seus olhinhos brilhantes naquele pobre coitado. Seria ele um bruxo? Um profeta, talvez? Ou apenas um homem com estilo diferente? Ela não sabia, mas estava decidida a descobrir.

A mãe, apressada, notou que a menina soltara sua mão, então logo disparou:

- Nalu, minha filha, vamos logo senão perderemos sua consulta no dentista!

- Mas mamãe, aquele homem...

- Não tem mais nem menos, dê-me sua mão e vamos.

- Só vou se a senhora me dizer quem é aquele homem!

- Ahn...? Homem, que homem Nalu?

- Aquele ali ó... do outro lado da rua. Ele parece tão só.

- Nalu, Nalu... É apenas um mendigo, como eu poderia conhecê-lo?

- Não sei mamãe...Pensei que... talvez a gente pudesse ir lá e conversar um pouco, ele deve estar tão triste. Ele sente frio, fome, será que ninguém o ajuda??? – gritou a garota, indignada com a situação que via.

- Você é criança demais para pensar nessas coisas, ele é só mais um mendigo e nós estamos atrasadíssimas. Pare com a gracinha e vamos AGORA! (O relógio já marcava duas da tarde, sendo que a consulta era às 13h15).

A contragosto, a pequena Nalu de cabelos negros obedeceu sua mãe. Puseram-se a caminhar novamente. Contudo, a imagem daquele velho não lhe saia da cabeça. Quem seria ele? Como se chamaria? Teria uma família? Como chegou naquela situação tão solitária? Eram tantas perguntas que lhe passavam em mente, que a menina não conseguia nem pensar numa resposta possível para nenhuma delas. Ela não entendia o porquê de todos o ignorarem, nem sequer olharem para ele como gente, tratavam-no como se fosse um mero cachorro sarnento que ninguém quer por perto. Revoltada, dizia para si mesma que jamais seria como aquelas pessoas que por ali passavam, sem sentimentos por aquele pobre homem, afinal, será que os compromissos delas eram mais importantes que olhar para aquele velho e fazê-lo feliz por um minuto, nem que fosse com um simples bom dia? Será que sua consulta no dentista era mais importante que encontrar uma solução para aquela situação? Mais uma vez derrotada, não compreendia. Só sabia de uma coisa: um dia o encontraria e poderia ajudá-lo de alguma maneira (uma ideia muito simples para um pingo de gente que não sabe nada da vida). Todavia, jamais voltaria a vê-lo; e mais: esqueceria-se de tudo que um dia refletiu e se tornaria uma pessoa comum, como todas aquelas que ela julgava serem sem corações.

À noite, dormiu serena, sem saber que sonhar é tão doce e atingível quando se é jovem... e que com a idade afastamo-nos completamente daquilo que um dia fomos e acreditamos.

Natalí Sorrentino
Enviado por Natalí Sorrentino em 05/07/2013
Reeditado em 30/07/2015
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