SEMANA SANTA DE ANTIGAMENTE

 
Com o passar dos tempos os costumes vão mudando, atualmente quase não ouvimos mais falar em guardar um dia santo.
   
Ainda lembro-me no meu tempo de criança dos dias santos de guarda, dentre eles a semana santa era a mais respeitada, sexta feira da paixão então, era dia de jejum e de silêncio, ninguém na fazenda trabalhava, não se ouvia musica no rádio e à tarde quase todo mundo ia à cidade, para acompanhar a procissão do Senhor morto, que naquele tempo se fazia com duas filas na rua todos com uma vela na mão.
   
Um detalhe que minha mãe sempre falava quando estávamos nos arrumando para ir à cidade: por uma roupa usada, não era dia de estrear roupa.
   
Meus pais contavam muitas estórias que também ouviram falar de fatos acontecidos por castigo pelo desrespeito a sexta feira da paixão, mas eram estórias que se ouviam na época que ninguém sabia de onde surgiu e nem com quem aconteceu.
   
Também falavam que no tempo que eram jovens era mais rigoroso ainda, na sexta feira santa, as mulheres não penteavam o cabelo, não varriam a casa, não moíam café, não faziam serviço nenhum apenas a comida ainda com simplicidade, carne nem pensar.
   
Meu pai Leopoldo, gostava de contar histórias vividas por ele e dentre tantas que ele contou, tinha muitas de semana santa. Nascido em 1917 sua juventude na década de trinta, havia alguns costumes muito interessantes, como o pessoal das fazendas na grande maioria, bem dizer todos, salvo raras exceções eram católicos participavam fielmente de todas as cerimônias da semana.
     
Na sexta feira da paixão iam à cidade para participar da procissão e toda a cerimônia deste dia com muito respeito ,era dia que se encontravam com amigos de outras fazendas.
     
Depois que passava da meia noite voltavam para casa, mas vinham aprontando pelo caminho, quebravam cerca para que os animais escapassem do pasto só para dar trabalho para os donos, roubavam galinha ou porco más também como uma brincadeira, depois faziam uma festa e todos comiam juntos inclusive o dono do animal.
   
Outro costume era de malhar o Judas, este era feito na sexta feira, pegavam uma roupa velha, calça, camisa e paletó enchiam de capim, palha de milho, faziam também uma cabeça de pano com um chapéu velho e deixava pronto para no sábado de aleluia. De manhã era colocado em um pau, como um poste e ás dez horas ele era destroçado.
   
Mas da sexta para o sábado os rapazes da fazenda gostavam de aprontar algumas, e colocavam o Judas encostado à porta da casa de uma família quando esta era aberta ele caia dentro da casa assustando quem abrisse.
     
Naquele tempo a maioria do pessoal era os chamados colonos, que tocavam café de porcentagem com o patrão e plantavam cereais, então todas as famílias tinham animais de trabalho, cavalos ou burros de sela ou de carroça.
     
Então escolhiam um animal geralmente quando o dono não gostava de brincadeiras e amarravam o Judas em cima do cavalo, este amanhecia andando no pasto carregando o espantalho feito no dia anterior.
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Meu pai dizia, que em uma fazenda que morou tinha um velho bravo que dizia que no cavalo dele ninguém colocaria o Judas, ele tinha uma pequena cocheira do lado da casa onde tratava seus animais.
     
Para prevenir na sexta feira à tarde pegou seu cavalo prendeu-o na cocheira, colocou um cabresto com um cabo de corda cumprido, fez um buraco na parede do quarto que era de madeira, passou a corda e da sua cama de vez em quando puxava a corda, o cavalo mexia com o pescoço e a corda ia e voltava, ele sabia que o cavalo estava lá, mas os rapazes foram com cuidado tiraram o cabresto do cavalo, fincaram uma vara verde no chão e amarraram a corda, quando o velho puxava a corda a vara envergava e voltava e ele passou à noite tranqüilo puxando a vara.
     
No outro dia quando acordou viu a vara fincada no chão e a corda amarrada, o homem ficou muito bravo e a hora que viu seu cavalo com o Judas amarrado em cima aí sim ficou doido e queria matar quem tinha feito aquilo, mas ninguém contou e as escondidas riram muito do velho.
   
No sábado de aleluia às dez horas o povo se reunia em frente à colônia, onde já estava colocado o Judas para malhar, davam tiro de espingarda, de garrucha, batiam com vara até derrubá-lo no chão e estraçalhá-lo.
     
Um ano Leopoldo e alguns amigos foram encarregados de fazer o Judas, aí tiveram uma idéia que deu muito que falar, a hora de fazer a cabeça pegaram cuidadosamente uma caixa de marimbondo taparam a saída dela e enrolaram com pano colocaram o chapéu e puseram no lugar já amarrado em cima no poste, para que ninguém mexesse mais.
   
Na hora de malhar o Judas como de costume teve os tiros aí começou aparecer algum marimbondo e ferroar os homens, quando derrubaram no chão e rasgaram sua cabeça foi uma correria danada os marimbondos atacando, todos correndo e se batendo como louco.
   
Foi muito divertido para eles que ficaram de longe só olhando, as pessoas que participaram da malhação de Judas não gostaram muito não, mas por fim levaram na brincadeira e acabou tudo com muitas risadas.
   
Hoje a semana santa não é mais comemorada como antigamente, alguns costumes ainda perduram para os católicos praticantes, pelo menos de quinta para sexta feira santa, e até que amanheça o sábado de aleluia, como o de não comer carne e não fazer festas com danças e musica.
   
A vida moderna não permite-nos guardar os dias santos como antigamente diante da evolução dos tempos, da tecnologia e das mudanças nas formas de relacionamento entre a sociedade, ficaram inviáveis tais costumes, mas não deixa de ser interessante e agradável poder recordá-los.
João Batista Stabile
Enviado por João Batista Stabile em 18/04/2014
Reeditado em 24/11/2020
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