Os espelhos de Narciso

Fabricio era pobre, “tadinho dele”, era o que diziam ao ver aquele menino vindo com os sapatos melados de lama, descendo daquele ônibus que o trazia daquele bairro distante, que só.

Na escola, era sempre o protegido dos professores quando discutia com Maurinho, o menino petulante do bairro nobre que a mamãe vinha levar e trazer de carro todos os dias.

A vida estava na sua direção certa, até que, a professora Olga, movida por um sentimento de resolução, quis visitar esses dois meninos e suas famílias, para tentar resolver essas brigas de adolescentes sem sentido algum.

E lá foi a professora Olga para a casa do Fabricio. O bairro era distante, mesmo. E chegando lá, tal foi seu espanto quando olhou à frente da casa com o jardim bem cuidado, margaridas bem cuidadas nas janelas, piscina limpíssima, aguardando os dias mais quentes do ano.

Pensou que estava no lugar errado, porém o aceno de Fabricio não deixou dúvidas de que era lá que ele morava. Entrou na casa e... ar-condicionado em todas os cômodos da casa, que continha uma mobília copiada de novela.

E lá, sentada na poltrona mais confortável que sentara, a professora Olga ouviu da mãe de Fabricio de onde vinham suas rendas: Ah sim, de duas pensões que eu tenho, sabe, né professora, tem também alguma ajuda a mais do governo e eu não pago imposto, água, luz, condomínio, isso diminui bastante minhas despesas, consegui reformar a casa e ainda comprar esse carrinho aí que está na garagem.

Dona Olga sabia que o veículo valia mais que um comum do preço popular, porém fez não saber de nada e logo deu um jeito de ir embora, pois seus pensamentos egoístas a deixavam estupefata com sua realidade de andar de carro popular, sem ar e direção hidráulica e ainda ter a vida de trabalhar pra pagar conta, resumindo, toda aquela lista que a mãe de Fabricio relatara e que ela já sabia decorada.

Naquele dia, encerrara seu expediente, deixaria para visitar Maurinho outro dia... Confusão de ideais de vida afrontavam sua essência.

Ana Nery Machado

04/2014