CELEBRIDADES - capítulo do meu livro "Taxi, vida e historias(reais) de um taxista no Rio de janeiro
CELEBRIDADES
Tenho puxado assunto com o passageiro, minha cabeça
gira muito com a escrita desse livro, fico excitado e necessitado
de falar. Quem acenou para eu parar foi o Ângelo Antônio,
o ator. Estava levando compras para a casa de sua mãe em
Copacabana. Ele sentou no banco da frente e sem a menor
cerimônia puxei assunto, na lata:
– V ocê é um dos atores que mais admiro, vi o filme sobre
a vida do Zezé Di Camargo e Luciano, você estava demais.
E tem mais, não me leve a mal, é casado com a mulher mais
bonita da TV Brasileira, a Letícia Sabatella.
Ele deu uma gargalhada, sou muito cara de pau.
– É? Obrigado, acontece que não sou mais casado, somos
apenas bons amigos.
– Sou teu fã, estou escrevendo um livro sobre as histórias que
acontecem dentro do táxi. Posso colocar teu nome, que você foi
meu passageiro? Desculpe escancarar, estou muito empolgado.
– (Risos) Pode sim, é uma boa idéia, se for bem escrito
deve ficar interessante.
E matraca, matraca, matraca, tagarela, blá, blá, blá, ele
ria muito. Foi um encontro simpático, parece que saiu satisfeito.
Agora aqui entre nós, tomara que ele não leia, a Letícia
Sabatella é um mulherão, com todo o respeito, um sonho de
consumo, meu DEUS do céu, o que é aquilo?
Com a atriz Dona Ruth de Souza
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Teve também a corrida com a Débora Duarte, ela acabara
uma novela com o maior sucesso, falei feito papagaio, disse
que era seu fã e, claro, não perdi a oportunidade de falar deste
livro. Na verdade eu só ando falando nisso! Ela gostou da
idéia, achou ótima e me incentivou muito a seguir adiante,
que o assunto dava pé. Conversamos e levei-a ao restaurante
Antiquarius, no Leblon. No caminho ela contou-me que estava
desempregada, que seu contrato com a TV Globo chegara
ao fim e estava correndo atrás. Pediu-me para esperar ela
almoçar e acabar uma conversa com o empresário.
Eu queria ser assim também, desempregado e almoçando
no Antiquarius. O taxímetro ficou rodando com o carro parado.
No final das contas continuamos a conversar até seu destino na
Praça Nossa Senhora da Paz. Ela é muito legal, tratou-me com a
maior intimidade e a corrida deu 60 reais, coisa boa.
Bem recentemente embarcou também o André Gonçalves,
ele estava com uma loiraça, puta merda! Que mulher! Eu o
achei muito parecido comigo quando tinha a idade dele, bem
que podia fazer um filme sobre esse livro. Ele tem o perfil certo.
Vê se pode! Convidei-o para fazer o papel do meu personagem
em um filme sobre a minha vida, é por essas e outras que me
chamam de maluco...Ele topou na hora! Nem cobrei a corrida,
estava indo para perto da minha casa no Horto Florestal.
Já transportei muita gente famosa. Alguns entram, indicam
o destino e, muito obrigado! Com outros o papo acontece,
às vezes vão mais além e ficam meus colegas, chamam
sempre ou então já conhecia antes de ser taxista e passaram
a ser meus clientes amigos. É o caso, por exemplo, das atrizes
Dona Ruth de Souza e Dona Léa Garcia, que são duas
das maiores atrizes do Brasil e que o preconceito racial não
permitiu que tivessem o reconhecimento que merecem. Acho
que deveriam estar num pedestal. Tem também a vereadora
Leila do Flamengo, que sempre me ajudou nas horas difíceis,
me conhece há anos.
Impossível esquecer da Elza Soares, que conheço desde
quando dava aula de natação para ela e seu filho, filho do Garrincha,
infelizmente falecido em um acidente. Sendo eu um
botafoguense roxo, ou melhor, preto e branco, ficava emocionado
porque dava aula para a Elza Soares (para mim é a maior
cantora deste país), e pro filho do Garrincha, meu maior ídolo.
E não é que o moleque virou o melhor nadador da academia?
Era um centro esportivo na Rua Barão da Torre, em Ipanema,
a “Ipanema Sport Center” que hoje não existe mais.
Ficava quase esquina com a Rua Farme de Amoedo. Lá eu
fui salva-vidas e dava aulas de natação, também tinha o arrendamento
do barzinho onde fazia sucos e sanduíches naturais,
essas coisas. Conheci e convivi com muita gente, Scarlet
Moon, cujos filhos eu dava aulas de natação, a Leilane do RJTV
também mantinha seu filho nadando, e, é preciso repetir,
a Elza Soares, pela qual tenho muito orgulho e carinho.
Foi no dia-a-dia da academia que acabamos por desenvolver
uma amizade a ponto d´ela freqüentar minha casa na
época que eu morava nos EUA, quando tinha ido fazer uma
temporada de show de uns 30 dias. Não sabia que eu morava
lá e só ficou sabendo porque eu havia visto seu nome em um
prospecto, uma propaganda de uma casa de shows chamada
Scorpios, em New Jersey. Fui até seu hotel depois de me
informar onde ela ficaria e rolou a maior festa, matamos as
saudades. Ela dizia:
– A gente não tem muito que fazer! É hotel o dia todo e
duas horas de trabalho a noite, fico muito só.
Talvez nem tivesse idéia do tamanho do sucesso que fazia
por lá, eu sabia, eu ouvia, muito se falava dela, os gringos do
Jazz adoravam e ainda adoram sua voz. Foram dias felizes por68
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que brasileiro no exterior só pensa em feijão, feijoada e os amigos
do Brasil, dá sempre saudades. No Brasil eu ainda a transportei,
mas não a vejo faz algum tempo e hoje sinto saudades.
Outra grande figura é a Luiza Brunet, que também conheci
nesta academia e, talvez ela negue, não que eu a conheça, isso
não! É que eu sei do segredo do que ela usava e deve usar até
hoje para ter aquela pele. Claro que não vou dizer o que é, nem
sei se ela já fez isso publicamente, só posso revelar que era um
produto a base de mel, só falo até aí, coisa de índios lá da sua
terra. Passava no corpo todo e depois entrava na sauna a vapor
ficando lá até derreter. Nos horários que ia, a sauna nunca estava
ligada, mas o dono, o Octavio Guimarães, que não era bobo,
me autorizava a ligá-la para a Luiza. Nunca vi de perto corpo
mais bonito, não tinha maldade, éramos como irmãos, juro!
A mulherada que freqüentava a academia, fina flor de
Ipanema, sentia, como não podia deixar de ser, uma ponta de
inveja porque, como se não bastasse, ela acabara de ganhar
um concurso muito importante nos EUA, tinha sido considerada
algo assim como a mulher mais bonita do mundo
e estava famosa, e, olha, naquela academia só tinha mulher
bonita, acima da média, eu ficava doidinho.
Cansei de fazer sucos naturais no barzinho, ela entrava
por trás do balcão, tínhamos intimidade ali dentro da academia,
mexia na geladeira pra ver o que queria comer, pode
perguntar a ela.
Gosto muito da Luiza Brunet, pessoa de aparência sofisticada
mas de uma simplicidade muito legal. Pode ser famosa,
rica, mas para mim e para quem a conhece de perto, tenho
certeza, podemos afirmar: Brunet é da galera, do povo mesmo.
Beijão, Luiza!
Vocês não vão acreditar, é praticamente impossível, mas
vou contar porque tenho várias testemunhas: fiquei amigão
do Ron Wood, guitarrista dos Rolling Stones, tirei a maior
onda com a cara de todo mundo aqui no Brasil, foi no camarote
da Brahma, na passarela do samba durante um desfile
de carnaval.
A Mariana Guimarães era modelo, da agência Ford Models,
ela ainda não era atriz e o antigo dono da Ford, Antônio
Velasques, deu um jeito ou comprou, não sei bem, um carro
alegórico da Mangueira para colocar as modelos de sua agência
desfilando. Quando eu soube disso eu fiquei remoendo as
idéias, sabia que ela iria ficar no camarote da cervejaria até a
hora do desfile, eu tinha que dar um jeito de ir também, ela
é filha do Gino.
– Pô, Gino, dá um jeito de eu entrar no camarote também..
– Dá não! Eu só vou porque ela é menor de idade, a entrada
é muito controlada, tem crachá com foto e tudo, é feito
na hora e o nome tem que estar na lista. Metade do Rio de
Janeiro quer ir também neste camarote.
Ainda está pra ser construído um muro que eu não consiga
atravessar, mas o camarote da Brahma é coisa difícil. Resolvi
tentar... Foi mais fácil que pensei, tinha um cara indo embora
logo no início, estava passando mal e me deu seu crachá, ele
era loiro, nada a ver com a minha cara, mas, como tinha feito
amizade lá na entrada com um segurança, fiquei capinando
por ali até rolar uma oportunidade. Peguei o crachá, coloquei
pendurado no peito ao contrário e tentei. Deu certo!
– Porra, Nelson, o que você está fazendo aqui dentro,
como conseguiu entrar?
– Meu nome é Nelson Maluco, meu camarada! Esqueceu?
Tá me desconhecendo?
– Você é doido mesmo, se te pegarem, vou logo avisando,
nem te conheço...
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– Sem essa! Eu disse que era segurança da Mariana... Cara!
Olha só aquela mesa! Rango de montão... Vou cair matando.
– Maluco! Você já entrou, vê se pega leve, tá legal? Olha
a merda que vai fazer. Vou sair de perto de você, vai acabar
me enrascando.
O fato era que eu estava lá dentro e o camarote era do cacete!
Fui direto beliscar a mordomia, bebida à vontade. De repente eu
vislumbro o Ron Wood e sua esposa, uma loira encarquilhada, ao
lado do Gino com a Mariana perto, tinha um segurança em volta.
Mesmo no camarote o cara tinha segurança. Chego junto:
– Qual é, Gino. Que parada é essa?
– O cara e a mulher dele estão empolgados, ela quer desfilar
num carro alegórico qualquer, parece que o dono da
Ford Models vai bicar uma vaga. O Ron Wood soube que a
Mariana vai também e se chegou, mas eu não sei inglês, não
entendo porra nenhuma do que ele fala.
Eu não quis nem saber, cheguei junto arranhando um inglês
e disse que era tio da Mariana. O Gino com cara de
babaca tentava conversar me usando com interprete. Eu não
traduzia nada do que ele dizia, falava o que me dava nas ventas,
disse merda em cima de merda, inventei muita coisa e o
Ron Wood achava a maior graça, botava a mão no meu ombro
e falava com o Gino que, malandramente, tocava o “lero”
pra frente fingindo entender. Não parece, mas é mais maluco
que eu, já aprontamos muito nesta vida. O fato é que fizemos
uma espécie de grupinho, não durou muito tempo mas foi o
suficiente pra chegar um repórter em mim perguntado:
– Vocês conhecem o Ron Wood?
– É... É amigo de família...
– Amigo de família? Como assim?
– Amigo de família, nunca ouviu falar nisso? Toda família
tem amigos... Dá licença...
– Eu sou repórter, será que você não conseguiria uma entrevista
exclusiva com ele? Me daria a maior força no jornal..
– Olha aqui, meu irmão, se tem uma coisa que o Ron
não gosta é misturar canal. Somos amigos e não misturamos
amizade com essas coisas, ele está aqui com a esposa e não
quer ser perturbado. Eu e meu primo não somos as pessoas
mais indicadas pra isso, não adianta nem insistir, me dá licença...
– Quem é esse cara, maluco? O que vocês estavam
falando?
– É repórter e quer que a gente arrume uma entrevista
com o Ron Wood. Eu disse que somos amigos de família dele,
que não vamos pedir entrevista nenhuma. Presta atenção, eu
e você, sacou? Se chegarem junto você confirma, vê se não
vacila!
– Puta merda, maluco, você vai acabar botando a gente
em cana... Quer saber? Foda-se, vou curtir essa doideira também.
O resto da noite foi só mordomia, fizemos o maior sucesso.
Uns três repórteres tentaram chegar no cara através da
gente, tinha um que era Norueguês, acho. Vinha garçom servir
na boquinha. Muita gente estava receptiva com a gente
no camarote só porque éramos amigos do Rolling Stone. E o
Ron Wood não sacou coisa nenhuma, nem percebeu a armação,
estava todo contente com o carnaval e sua mulher desfilando.
Foram meus 15 minutos de fama, ou melhor, minhas
várias horas de fama. Acabei saindo com uma mulheraça no
final, ela pagou o motel e tudo, tinha um carrão importado.
Quando olho para trás custo a acreditar, não me perguntem
como eu consigo esse tipo de coisa, só sei que na hora sai
uma embolada e acaba acontecendo. Quando ficar velhinho
vou ter do que me lembrar.
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