A balança
A farmácia estava situada dentro de um pequeno centro comercial que tinha como loja principal um supermercado de uma importante rede nacional.
O centro comercial estava disposto, estrategicamente, em um entroncamento de três ruas. Nele havia dois acessos ao imóvel e entre eles, a lanchonete do supermercado, uma lojinha de flores artificiais, uma locadora de vídeo e a farmácia.
Era rotina os clientes deixar os seus veículos no estacionamento e penetrar naquele estabelecimento pela porta lateral.
As mulheres faziam suas compras, fartavam-se na lanchonete e, com as suas consciências e estômagos pesados, entravam na farmácia para se pesar.
A balança daquela farmácia estava postava ao lado da porta principal de entrada. Pelo lado de dentro, é claro. Ela ficava paralela ao caixa separada por uma distância de 1 metro e meio, aproximadamente.
Talvez, por isso o caixa era sempre questionado sobre a condição de funcionamento da balança. Esta constância fez com que ele afixasse um banner acima da balança e bem visível na sua escala de pesos. O cartaz dizia: ‘A balança está ótima, obrigada’.
Mesmo assim, não era raro uma mulher, insatisfeita com o seu peso, voltar-se para o caixa e perguntar:
- ‘A balança esta boa?’
O caixa prontamente lhe respondia, apontando o cartaz:
- A balança está ótima, obrigada.
Certa feita uma mulher relativamente alta, magra, esbelta e com o corpo bem distribuído pelo seu esqueleto subiu na balança e acompanhou a evolução do ponteiro na escala de peso. O ponteiro generoso indicara-lhe o peso com precisão. Satisfeita com o resultado aferido pela balança ela se volta para o caixa, abre um sorriso e lhe diz:
- ‘Realmente, a balança está ótima’.
Tão logo a mulher deixa a farmácia balançando exageradamente o seu quadril, outra mulher aguardava a sua vez para se pesar. Ela era ligeiramente mais baixa do que sua antecessora, mas apresentava o corpo um pouco mais cheio.
Ela subiu na balança, e ansiosa aguardava a evolução do ponteiro. A balança indicara-lhe o peso, mas a mulher inconformada se voltou para o caixa e perguntou-lhe:
- A balança está boa?
- A balança está ótima, obrigada. – Respondeu-lhe o caixa, laconicamente, indicando o cartaz postado acima da balança.
- O senhor me acha gorda? – Insiste a mulher, perguntando para o caixa.
- De forma nenhuma, senhora! – Aos meus olhos a senhora está nos ‘trinques’. – Respondeu-lhe o caixa, com um sorriso cínico estampado no rosto.
- Obrigada. Mas só lhe perguntei se estou gorda porque ‘aquelazinha’ que saiu daqui agora pesou menos do que eu.
- Sério? - Perguntou-lhe o caixa, desmanchando o sorriso. – Não me pareceu que ela pese menos do que a senhora! – Completou o caixa, tentando ser gentil.
- Por isto, desconfio que esta balança não esteja muito boa. – Disse a mulher sem ter certeza na sua colocação.
- Anotarei a sua reclamação senhora. Outra vez que a senhora retornar a nossa farmácia a balança estará melhor ainda.
A mulher se dirigiu para a saída quando o caixa acrescentou-lhe:
- Às vezes, o acúmulo de líquido no organismo altera o peso da pessoa.
A mulher captou a mensagem do experiente caixa e apenas lhe disse:
- É. De fato, pode ser apenas acúmulo de líquido nas células do corpo.
Outro fato que vale a pena ser lembrado foi quando a jovem obesa penetrou no recinto da farmácia e se dirigiu diretamente para a balança. Ela retirou o celular do bolso traseiro da calça jeans e o colocou dentro de sua bolsa de pano. Colocou a bolsa no cabide da parede logo acima da balança. Em seguida tirou as sandálias dos pés e subiu na balança. O ponteiro deslizou generosamente. Ela incrédula observava a marca do ponteiro quando ele parou de deslizou e apontou o peso da mulher: 110 quilos. Um senhor de idade aguardava paciente que a mulher descesse da balança, mas como ela parecia relutante ele falou:
- Viu como não é culpa das sandálias.
- A jovem olhou para o velho e desatou uma sonora gargalha. Não disse nada, apenas riu muito. Quando ela saiu do recinto ainda sorria à vontade. O senhor idade de ombros e comentou:
- O par de sandálias dela não pesa 200 gramas. Com certeza ela abusa das frituras e dos refrigerantes.
E nós dois também sorrimos muito com a cena.
E aquela senhora de classe média aproximou-se do balcão e pediu uma caixa de sibutramina (Plenty). Enquanto o balconista conferia a receita médica ela lhe perguntou se o medicamento tinha muita contra indicação. O balconista para não perder à venda respondeu que todo medicamento tinha restrição – até mesmo um sonrisal.
Insatisfeita com a resposta do balconista ela perguntou para o caixa:
- É verdade que este medicamento tem sérias restrições senhor caixa?
- De fato senhora! A sua bula só falta sugerir um plano funerário para os usuários desse tipo de medicamento. Inclusive, alguns usuários reclamam que ele causa forte dependência química.
- Valha-me Deus! E o que devo fazer, senhor?
- A senhora tem doméstica na sua casa? – Pergunto-lhe.
- Tenho duas. - Ela responde sem vaidade.
- Então se a senhora me permite uma sugestão não consuma esse tipo de medicamento. Dispense as domésticas, arregace as mangas de sua camisa e limpe a sua casa a senhora mesmo.
- É uma excelente ideia! O problema é que trabalho dois expedientes.
Recolho-me a minha insignificante função e apenas complemento:
- Aí, realmente, a coisa se complica senhora.
Ela observou o olhar de reprovação que o farmacêutico me dirigia e acrescentou:
- Mesmo assim agradeço a sua sinceridade, senhor caixa.
- Por nada, senhora, foi um prazer.
***