ABORTO - CONTINUAÇÃO

II PARTE

O ABORTO

CONTINUAÇÃO

Eu estava ansioso. Sabia do risco que Dora estava correndo em perder o Junior. Imediatamente liguei para o advogado.

Fui muito bem atendido, expliquei a situação superficialmente pelo telefone, ele se prontificou a vir até o Hospital as 16 h, e conversarmos sobre o assunto, primeiramente comigo, e depois com a paciente.

Continuei o meu trabalho. A maternidade é um local agitado, e cheio de imprevistos.

Tinha terminado de fazer uma cesárea, quando a secretaria me comunicou.

--- doutor tem um rapaz na recepção querendo falar com o senhor, disse que é um advogado.

Se há um profissional que me mete medo, é um advogado, sempre com razão em suas dissertações, sempre tirando algum dinheiro do nosso bolso, porém, aquele que agora estava a minha espera vinha para me ajudar em um caso muito complicado.

--- peça para ele subir, vou esperar na sala de exames, por favor, se chegar alguma paciente, peça para esperar um pouco. – orientei a secretaria.

Como todo bom advogado, este se apresentou de terno e gravata um sorriso nos lábios, e um jeito amigo, que me deu confiança em suas orientações.

Apresentou-se, e sentamos para conversar.

Boa parte das orientações eu já conhecia. Sugeriu algumas atitudes que eu jamais tomaria, mas queria conhecer a paciente. O horário era de visita, e pela primeira vez eu soube que a paciente estava acompanhada. Quis saber quem era, e fui informada que era a avó da criança, a avó do Junior.

Entramos no quarto. Apresentei-me e depois fiz o mesmo com o advogado.

A avó de imediato começou a chorar. E antes mesmo que começássemos a dar as explicações ela afirmou;

--- não concordo com o que ela esta fazendo, criamos todos os nossos filhos, não precisamos de ninguém, o senhor me desculpa doutor, sei que esta querendo ajudar, estou doente, mal consigo andar, mas o que ela esta fazendo é errado. Não contou para o pai que estava grávida, fez algo terrível, graças a Deus que encontrou sua ajuda. – o soluço aumentou e ela não conseguiu mais falar.

--- calma senhora, eu estou aqui para ajudar.

Dora se intrometeu na conversa.

--- doutor, o senhor prometeu que vai cuidar do meu filho.

--- prometi, e vou cumprir, porém gostaria que você escutasse o advogado que esta me acompanhando.

Foi neste instante que ele começou a falar.

--- mãe, preste bem a atenção, pois estou aqui de boa vontade, sem intuito de ganhar algum dinheiro, inclusive, não cobrei nada do doutor e nem vou cobrar. – parou por alguns segundos, molhou os lábios ressecados e continuou.

--- você tem somente duas alternativas, ou você doa seu filho, e o Conselho Tutelar o leva para a casa de abrigo, ou alguém da sua família assume a guarda. O doutor Claiton, por mais que ele queira não pode ficar com o seu filho, posteriormente, se a pessoa que assumiu a guarda, estiver de acordo, e o juiz permitir, o doutor Claiton poderá assumir a guarda, para isso seria bom se ele mantivesse um vinculo com o recém-nascido.

Dora ficou de olhos abertos, como se matutasse alguma coisa perfeita.

--- pois bem doutor advogado, então ele poderia batizar meu filho, e assim manter um vínculo, isso é possível não é?

O advogado percebeu a perspicácia da puérpera.

--- sim... Neste ponto você tem razão, mas quem vai assumir a guarda neste momento. Um tio, um parente.

Foi neste ponto que a avó, se levantou com dificuldade da cadeira.

--- o meu marido.

--- o pai não... Ele me mata mãe. – disse Dora se levantando da cama, Junior estava no peito, e acordou bruscamente. Chorou e voltou para o mamilo, como se voltasse para um manjar dos deuses.

--- eu sei filha, ele poderia até mesmo te matar pelas idiotices que você tem feito em sua vida, mas cuidara do neto como sempre cuidou dos seus. Eu falo com ele, e vamos ver o que será resolvido.

A conversa estava tomando um rumo interessante.

Eu já tinha contado para a Aline tudo o que estava acontecendo, ela veio naquele momento até o quarto e olhou a criança agora acordada, olhos azuis com do Céu.

--- ele é lindo Claiton. – disse se aproximando.

--- quer pegar. – disse Dora, ficando em pé e pondo o menino na posição para arrotar.

O arroto foi forte.

--- tá vendo doutor, ele é cheio de saúde.

--- eu sei Dora, mas o problema não é esse. Existe algo mais grave ainda.

--- como assim?

Aline pegou o menino no colo, seus olhos se encheram de lágrimas, percebi claramente que ela aceitaria a criança como uma mãe de verdade.

--- vou explicar, caso alguém da sua família não fique com o Junior, você corre o risco de perder a guarda dos outros dois filhos.

Neste momento, Dora arregalou os olhos, parecia uma leoa ferida.

--- nunca, jamais ninguém tira os meus filhos da minha guarda.

O advogado interrompeu a discussão que já estava chamando a atenção.

--- o doutor Claiton tem razão, fui eu quem explicou isso para ele. Existe uma queixa contra você no Conselho Tutelar, caso você não tenha ninguém da família eles estão com uma ordem de levar para o abrigo seus três filhos menores.

A avó ficou desesperada. A mãe de Junior também.

--- precisamos ligar para o meu marido. – disse a avó. Ele é nervoso pode até enfartar, mas não vai deixar isso acontecer.

--- quer ligar Dora? – perguntei.

--- doutor o meu celular é pai de santo, só recebe ligação.

Eu sorri.

--- tudo bem passe o número eu ligo do meu, me apresento, e peço para ele vir até a maternidade, ele já esta sabendo do neto.

--- sim. Porém não quer assumir nada. O senhor vai ter que usar uma ladainha danada para convencê-lo a vir.

Eu sabia como convencer o avo. Ela me passou o número. Eu liguei.

--- alo.

--- alo, pois não. – responderam do outro lado da linha.

--- meu nome é Claiton, sou médico da santa casa, e precisava falar com o senhor pessoalmente, será que poderia vir até o hospital.

A resposta veio com uma voz rude, agressiva.

--- estou ocupado, se é sobre a minha filha ela que resolva o problema sozinho.

--- sei. Posso lhe fazer uma pergunta.

--- claro.

--- soube que o senhor adora os seus netos. Como é o nome deles?

--- Gustavo e Priscila.

--- lindos nomes. Onde eles estão neste momento?

--- aqui em casa. O Gustavo brincando com um jogo que eu lhe dei, e a Priscila no computador, preparando um trabalho para a escola.

--- pois então senhor Ângelo, é este o seu nome, não é.

--- sim... Este é o meu nome.

--- pois então escute, e depois o senhor resolve se vem ou não conversar comigo no hospital, tudo bem?

--- tudo bem. – escutei no fundo alguém chamando. Vô vem brincar comigo.

--- já vou Gustavo, já vou. --- fale doutor sou todos ouvidos.

--- acho que o senhor adora os seus netos, sua esposa me disse, acontece que se alguém da família não assumir a guarda do recém-nascido, vocês perderão também o convívio dos seus dois netos, é isso que o senhor quer.

A resposta foi tão rápida, que eu sorri.

Assim como sorri um ganhador da Mega Sena.

--- doutor isso não vai acontecer, pede para a minha esposa vir para casa correndo, eu vou até o hospital e assumo a guarda do meu neto, por favor, nos ajude, tenho confiança em Deus de que tudo vai dar certo.

--- Já deu senhor Ângelo, venha estarei te esperando.

Eu perdi um filho, que na verdade nunca foi meu.

Os avós ganharam mais um neto.

Dora mais um filho.

E eu apadrinhei um menino lindo, de alguma maneira eu sou um pai de segunda mão.

Gente. Apesar de muitos não acreditarem, a história é verdadeira.

Ton Bralca
Enviado por Ton Bralca em 14/11/2014
Reeditado em 05/11/2016
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