A VIDA EM UM GALINHEIRO

É interessante como a gente passa uma vida em contato com algumas coisas e não nos apercebemos de certos detalhes atinentes a elas.

Eu, por exemplo, de alguma forma sempre convivi com a realidade de um galinheiro por perto. Quer na casa de meus pais, ou em casa de parentes e vizinhos. Mas isso não foi suficiente para que eu observasse algumas nuanças, que só agora me ocorreram.

Estou realizando trabalhos de pintura na casa de uma senhora que, por mero deleite, cultiva o salutar prazer de criar galinhas.

Reservou ela um espaço no quintal e ali mandou instalar um galinheiro, no qual mantém um galo e quase duas dezenas de galinhas.

Como estou sempre por perto, vez por outra ouço uns cocoricós mistos de dor e de fuga de uma ou outra galinha.

Então paro por uns instantes e fico a observar o comportamento delas.

Aquele ambiente que a um desatento pode parecer sereno, no qual se tem a impressão de que reina absoluta tranquilidade, na verdade o que impera é a lei do mais forte.

Quando uma galinha passa pelas outras, recebe uma bicada de uma, cocorica apavorada, dá uma corridinha, busca proteção em outra galinha ou no galo, que se mantém indiferente àquela aparente injusta perseguição. Tudo em vão. Nem assim ela escapa de receber outras bicadas, continuando a fuga de cá prá lá e de lá prá cá.

Se uma galinha ou pintinho pega um alimento, as outras correm atrás tentando apoderar-se dele, principalmente se esse alimento for uma suculenta minhoquinha.

Percebi certo dia, que o galinheiro estava mais agitado do que o normal. Então, ao me deter para observar a movimentação, constatei que aquele exemplar que tanto apanhava estava mudando as penas. Motivo pelo qual parte do seu dorso se encontrava descoberto, o que aguçava ainda mais nas outras o desejo de bicar sempre naquele lugar. Local que por sinal já estava em carne viva.

Fiquei com muito dó daquela galinha que não tinha para onde correr, nem onde se refugiar.

Condoído pelo sofrimento da penosa, relatei o fato para a dona da casa que me asseverou com autoridade: “quando tem uma galinha trocando de pena, as outras gostam de bicar o ‘canudo ’”.

Para meu espanto ela me disse também que “aquela galinha gosta de provocar, é muito escandalosa e é a única que não bota”.

Assim, conclui: então ela gosta de dar uma de dondoca e talvez por isso as outras a perseguem?!

A senhora aquiesceu e me disse: “todo ser vivo, quer seja vegetal ou animal, é inteligente. Eles têm as suas leis, costumes e artimanhas”.

Concordei com ela e retomei reflexivo aos meus afazeres.

Rafael Arcângelo
Enviado por Rafael Arcângelo em 18/11/2014
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