À espera de um ônibus

Quando desci do primeiro de dois ônibus que pego pra chegar à minha casa, uma menina que trajava blusa branca me chamou a atenção. Juntamente com ela havia um rapaz de camisa vermelha. Conversavam em modos de segredo. Na verdade, cochichavam. Mas meu foco não se manteve neles, concentrei-me logo em procurar, dentre os ônibus que passavam, aquele que eu pegaria para terminar o trajeto até a minha casa.

Pouco tempo se passou, talvez uns três minutos, e chegou um rapaz vestindo camisa amarela. De início, manteve-se longe, de costas para o casal que se comunicava em tons de segredo. Mas, decorridos mais uns cinco minutos, chegou uma menina de blusa verde. Juntaram-se, formando um segundo casal, e se apresentaram ao primeiro. Aparentemente, nem precisaram de palavras no primeiro momento, utilizaram gestos discretos para se comunicar, parece que havia algum tipo de código combinado para se reconhecerem. Daí em diante, ficaram os quatro a conversar de maneira discreta.

Avistei o ônibus que me levaria ao meu destino. Meu coração se alegrou. Recomeçaria a viagem à minha casa; o momento de me entregar ao descanso tão esperado estaria muito próximo. Fiz o sinal para que o motorista parasse, mas não parou; passou direto, estava cheio. Fiquei a olhar enquanto ele ganhava distância.

Nada eu podia fazer. Lamentar, talvez. Mas de nada adiantaria. Nesse momento, olhei para o céu, parecia se aproximar uma chuva daquelas tempestuosas. Não me lembro de como estava o céu quando cheguei naquele lugar há poucos minutos, concentrei-me apenas em pegar minha condução. Mas agora minha atenção se voltou para o céu, percebi que as nuvens estavam bem carregadas, preparadas para despejar água sobre minha cabeça. Essa possibilidade me assustava porque sobre a parada de ônibus não havia cobertura e eu também não tinha guarda-chuva. Se outro veículo com destino ao meu itinerário não viesse logo, eu poderia tomar um banho, a probabilidade era grande.

Eu não queria reclamar da chuva porque, embora ela fosse desconfortável para mim, não seria ruim para a cidade. Então percebi que minha revolta deveria recair sobre aqueles incumbidos de cuidar do transporte público. Essa foi a solução que impulsivamente encontrei para o impasse. Mas, logo em seguida entendi que, embora essa mudança de foco da minha ira parecesse inicialmente resolver a questão, novamente percebi que não era uma alternativa boa. Isso porque meus lamentos não seriam ouvidos pelas pessoas certas. E mesmo que elas me ouvissem, minha voz não teria força suficiente para causar nelas algum impulso modificativo. Nesse caso, eu poderia lamentar tanto contra a chuva quanto contra os políticos, meus reclames serviriam apenas como desabafo, seriam uma espécie de atividade terapêutica. Se bem ou mal fizessem, o efeito se faria observar apenas sobre mim.

Nesse momento, chegaram três mulheres. Altas e lindas. Uniformizadas, vestiam roupas pretas com logotipo de empresa. Pararam à minha frente e ficaram a tagarelar.

Em seguida, chegaram dois homens, bem vestidos, trajes de executivos. Ficaram a uns três passos à minha frente, em silêncio.

Repentinamente, avistei ainda longe, mas se aproximando, outro ônibus da linha que eu queria pegar. Meu coração se alegrou novamente. Dois ônibus em intervalos tão curtos, não poderia este último estar cheio também, pensei... Mas estava, o motorista ignorou meu sinal e passou direto.

Surgiu-me a vontade de dizer um palavrão, mesmo que em silêncio, só no pensamento. Na verdade eu o disse, minha mente se lembrou ativamente de uma palavra feia. Mas, novamente me acalmei por lembrar que meus lamentos seriam inúteis.

Enquanto isso, algumas pessoas que já se encontravam no recinto quando eu cheguei iam, pouco a pouco, pegando o transporte que as levaria a seus destinos, esvaziando o local.

Quatro homens chegaram, mas logo se percebeu que não buscavam transporte público; se identificaram como policiais aos dois homens que trajavam roupas de executivos. Deram-lhes voz de prisão, que foi recebida sem resistência. Rapidamente chegaram duas viaturas policiais e os levaram. Os demais presentes se comportaram como se fosse um fato corriqueiro. Eu me assustei um pouco.

Olhei novamente para o céu. Meu olhar se moveu em reação a dois pingos de chuva que caíram sobre a minha pele. As nuvens estavam escuras, não se podia esperar outra coisa que não fosse uma boa chuva.

Logo em seguida, um carro com um logotipo de empresa, o mesmo logotipo que podia ser visto na roupa das três mulheres, apareceu e as levou.

Nesse momento, olhei em volta e percebi que restavam comigo somente um grupo de cinco pessoas e os dois casais com roupas coloridas. Mas não ficaram por muito tempo. Rapidamente passou um ônibus que levou esse último grupo de pessoas. Imaginei que a chuva pegaria a mim e aos dois casais, mas não. Um carro branco logo apareceu e os levou.

Pelos dez minutos seguintes, àquele local não chegou nenhum passageiro. E meu ônibus não passou. Mas a chuva veio. E forte. Não esperei para me molhar. Quando a chuva deu sinais inequívocos de que cairia mesmo, eu saí, corri até um estabelecimento comercial próximo, uma loja de pneus, para me proteger. Logo que me abriguei, o céu desabou, fazendo um grande e agradável barulho. Olhei rapidamente para a avenida em cuja margem eu estava há poucos instantes e ainda vi passar o ônibus pelo qual eu esperava. Aparentemente não estava cheio. Não tenho certeza sobre isso porque a chuva embaçava um pouco a visão. Passou rápido, foi-se embora.

Mesmo sob a forte chuva, o movimento de carros na avenida continuou intenso. Fiquei por alguns minutos a olhar para aquilo e a imaginar como seria se eu já estivesse em minha residência; poderia agora estar no banho. Ou talvez já o tivesse tomado e estaria vendo TV. Passados alguns poucos instantes, acordei do sonho de já estar em casa e pensei em outra hipótese. A de eu ter meu próprio carro. Se possuísse um, talvez já estivesse mesmo chegado ao meu destino, ou estaria muito mais perto dele do que efetivamente estava agora. Voltei a pensar em refazer as contas, em realocar alguns gastos para sobrar mais alguns reais, que poderiam ser direcionados para o pagamento da prestação de um automóvel. Seria a conquista de minha liberdade, não dependeria mais do transporte público.

Passados uns quinze minutos desde que cheguei à loja de pneus, a chuva continuava a cair. Agora, com uma intensidade bem menor. Já se viam pessoas circulando pelas ruas sob o abrigo de guarda-chuvas. Minha atenção que até então esteve focada no lado de fora se voltou para dentro da loja. A primeira coisa que vi foi um carro suspenso, sem as rodas. Um senhor, baixinho e barrigudo, bem vestido, observava atentamente a parte de baixo do automóvel. Inspecionava cada detalhe. Pela curiosidade e pela postura, concluí que era ele o proprietário daquele veículo. Olhou para mim e fez um comentário qualquer; se me lembro bem, era sobre a importância de manter pneus adequadamente conservados para minimizar os riscos de se trafegar em pista molhada. Concordei com ele com um leve balanço de cabeça e com uma palavra evasiva qualquer, não me lembro qual.

Meu olhar voltou-se novamente para a rua quando ouvi uma voz de um vendedor de guarda-chuva. Senti-me tentado a comprar um. Olhei para a chuva e avaliei que com aquele tipo de proteção eu já poderia voltar para o local onde pegaria minha condução. O vendedor percebeu minha hesitação e parou diante de mim. Comprei. O preço era bom, a qualidade era ruim, mas eu tinha comigo dinheiro suficiente para fazer aquela compra e para pagar a tarifa do transporte público.

Bem protegido da chuva por minha nova aquisição, retornei para tentar a sorte. Logo que cheguei, avistei novamente um ônibus com o itinerário que eu queria. Estendi a mão e imediatamente percebi pela seta que piscava à direita que agora eu não ficaria para trás. Começou já a mudar de faixa. Mas, enquanto eu estava concentrado em sinalizar ao motorista que queria embarcar, outro veículo, que já estava bem mais próximo de mim, também mudou de faixa. Era um daqueles de passeio bem grandes. Passou ao meu lado em alta velocidade e, quando as rodas passaram sobre uma grande poça de água que estava à frente do ponto de ônibus, meu banho de água suja foi inevitável.

O ônibus parou e entrei. Havia poucos passageiros. Paguei o valor da tarifa, passei pela catraca e me sentei bem atrás em uma das muitas cadeiras desocupadas. Sentia-me desconfortável pela roupa molhada, mas satisfeito porque em breve poderia tomar um banho quente e descansar. Já não pensava mais em ver TV. Após o banho, meu destino seria a minha cama.

Revisão de Luana Vargas