TEMPO QUE ESCREVE SEM CANETAS

...e pedimos uma cerveja neste bar nalgum lugar movimentado da cidade, e são vários os bares com suas tantas amostragens humanas. Somos e estamos diante às cores da vida; vida que flui e que nos atinge sem percebermos os efeitos do atingir; vida que dentro de seu sentido é o sentido de ser, de refletir-se nas pequenezas no debulhar do tempo; tempo que escreve sem canetas, registrando os fragmentos do percurso nas amplas paredes das vias cerebrais, e nas paredes do bar observo os rastros da história em fotografias antigas que dialogam e falam da importância do lugar; lugar onde estamos neste agora tão efêmero, a sorrir, a descontrair-nos nesta noite de sexta um tanto agitada. E sorrimos entre amigos, e durante a conversa meus amigos conduzem o fio do dialogo para o conflito de suas vidas, e não quero me intrometer, mas vejo que, ansiosos, querem alguma palavra de salvação, e não sei como me posicionar pra não tender especificamente a um determinado lado, e vou pisando em espinhos pra discorrer sobre minhas visões na abstração que de fato vai deixar minha tendência, e curvo-me para o mais distante que posso da conturbada relação, e a noite escorre, e escorremos mais e mais doses em nossos organismos colados a este outro casal que se porta ao lado como se não estivesse se distraindo, perante a imobilidade e o mutismo visível, e não é difícil visualizar que a química do casal é um tanto estranha, vaga, mesmo assim, eles seguem submersos ao som circundante, e nós finalmente desviamos nossas falas sobre outros assuntos e até falo que prefiro continuar com o tipo de relação que levo, pois relações são um tanto complexa, e logo vejo que falei algo que nos joga dentro do mesmo terreno anterior, e fujo, fujo para o banheiro para não colocar mais lenha na fogueira que já havia se dissipado em cinzas, e quando volto discorro sobre um acontecimento na cidade, sobre um terrível crime que aconteceu próximo de onde trabalho, digo que dois colegas que trabalhavam juntos se desentenderam e um dos sujeitos sem pensar disparou cinco tiros no outro, que morreu simultaneamente, e ficamos por instantes pensando nessas ações desencadeadas que modificam estradas; estradas interrompidas pelos impulsos, e não foi nada fácil ver os olhos da viúva que chorava sobre o corpo do marido, assim como complicado foi pensar sobre o futuro das crianças tanto do pai assassinado como do pai preso em flagrante, que agora verá o sol sobre as grades da penitenciaria. E nos despedimos, e eles se foram para seus mundos, e a noite ainda não acabou, segue tão agitada e até penso se entro nesta boate pra dançar um pouco, e logo solto meu corpo ao toque da música, e de olhos fechados viajo pra qualquer lugar, e compro mais uma bebida e danço como se não houvesse nada melhor pra fazer, e não há, agora não! Agora eu me embriago com o fervor do meu corpo e da minha mente, enquanto sinto um corpo se roçar ao meu, e nos beijamos e nosso envolvimento é simultâneo, e vibramos, até que a noite dá sinais do seu fim, e com mais um beijo sabemos que foi prazeroso, muito prazeroso saborear a intensa farra de nós...
Valdon Nez
Enviado por Valdon Nez em 29/03/2015
Reeditado em 03/04/2018
Código do texto: T5187860
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