Minhas estações

Hoje eu percebo que, quando tudo começou, eu estava no outono. Mal sabia eu o que o inverno traria... E caminhando por aquela longa estrada, eu ia observando as folhas secas. Algumas ainda presas; outras caídas ao chão. O céu estava escuro, mas não fazia tanto frio. Eu via esquilos correndo pelo caminho e sentia o cheiro da natureza esquecida pelo sol. Quanto mais eu andava, mais frio eu sentia. E o mais triste era o meu despreparo diante de tudo aquilo. Eu não tinha sequer um pulôver para enfrentar o rigoroso mostro de gelo que me aguardava. De repente um vento forte tomou conta do local. A tranqüila brisa deu lugar àquela agressiva onda de gelo. Eu estava sozinho no meio daquela estrada. Acreditando estar totalmente desprotegido, eu quase sucumbi. Apesar da força da tempestade de neve, eu tentei continuar caminhando. E cada ponto era branco como gelo. O céu agora era escuro e pesado, coberto por nuvens de medo. Eu queria voltar para onde estava o sol, mas o clima umbralino tentava matar as minhas esperanças. Eu sentia falta da redoma na qual eu vivi por tanto tempo. Sentia falta também de algo que fosse conhecido e amistoso. No meio da escuridão, havia lá em cima um único ponto de luz. Pude notar algo brilhando bem longe, como uma vela na ventania. E quanto mais brilhava, mais eu me lembrava do sol escondido por trás de tudo aquilo. E a tormenta continuou por algum tempo e o frio era tanto que eu quase fiquei entorpecido. Então, eu parei de caminhar e me entreguei a tudo aquilo, perdendo a consciência. Não sei analisar o meu sono; só sei que o meu inconsciente me protegeu daquela triste realidade. E eu devo ter dormido por alguns dias, semanas, meses... Quando acordei, algumas coisas haviam mudado. A neve que cobria a velha e longínqua montanha estava derretendo, enquanto o chão já não estava tão escorregadio. Notei que eu não sentia mais tanto frio e o meu relógio já marcava 15 para setembro. Eu esperei mais um pouco até que a leve brisa retornasse e árvores se recuperassem da agressão do inverno. Elas eram como eu; estávamos no mesmo processo de regeneração. Por dentro, eu tinha fome, mas não queria comer algo. Eu tinha ganas de viver, sabendo que, depois de tudo aquilo, eu estava mais forte mas, infelizmente, não poderia voltar a ser quem eu era. Outro ser estava ali naquela paisagem; ele era amadurecido, ainda que continuasse solitário. E nenhum espelho poderia refletir seu verdadeiro eu. Então, as folhas das árvores se renovaram e surgiram lindas flores. O frio havia ido embora e um leve e agradável calor tomara conta do local. A estrada estava mais bonita e os animaizinhos corriam e voavam alegremente. Eu continuei a caminhada e um sorriso tímido brotou do meu rosto. Apesar disso, o dia ainda não estava completamente ensolarado e eu temia a instabilidade. Fui andando mais um pouco e logo adiante eu vi um lindo buquê de flores jogado ao chão. Eu o peguei e vi que havia um bilhete de perdão sem assinatura. Era como se o tempo se desculpasse com a natureza pela bagunça que fizera. Palavras de conforto entravam pelos meus olhos e mexiam com o meu coração, como se tivessem sido escritas para mim. Continuei a caminhada; agora com o tal buquê nas mãos. Eram flores azuis e diferentes de todas que já havia visto. Lindos miosótis. E dali a pouco, o sol voltou a brilhar como nunca. Ele parecia abraçar a tudo e a todos. O calor havia aumentado e eu havia finalmente chegado aonde queria. Eu sorria junto com a natureza, que estava em festa com a volta do astro-rei. E ver toda aquela mudança não me fez esquecer as outras estações, mas valorizar ainda mais aquela na qual eu estava. Mesmo sabendo que ela não duraria para sempre, eu estava dentro de sua ciclicidade e isso me trazia certo conforto. Então. Eu agradeci de coração pela oportunidade de crescer nos bons e maus momentos.

Tom Cafeh
Enviado por Tom Cafeh em 28/11/2015
Reeditado em 28/11/2015
Código do texto: T5463684
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