NO MEIO DOS OLHOS

O que eu podia fazer? Não tive escolha, a arma tava ali. No chão. Esperando para ser empunhada. O malandro caído no meio fio, ainda atordoado da queda. O que você faria, hein? Foram segundos. Não tinha outra opção se não pegá-la e apontar pra ele. Bem. No. Meio. Dos. Seus. Olhos. Sério!, no calor do momento você teria feito o mesmo. Certeza! São nessas horas, amigo, que todo bicho fica manso. Todo machão vira menino. Todo ateu vira cristão. É divino. E quando você tem a vida de alguém na ponta do dedo, o mundo parece estar em suas mãos. Como se você pudesse controlar cada átomo existente no planeta. Eu podia enxergar o suor escorrendo em câmera lenta por toda a cabeça até parar no bigode escroto do camarada. As veias estourando no canto da testa. Eu podia sentir o arfar acelerado da sua respiração. E tive somente alguns segundos para decidir se puxava ou não o gatilho. Mãinha teria orgulho de mim. Não consigo te dizer com precisão se sentia raiva. Muito menos medo. Minha mão tremia mais que as pernas do delinquente. E quando eu pensei ter decidido, meu corpo agiu sem que eu tivesse controle. Pow! O estouro foi forte. Quando entendi tudo, já estava no chão. Deitado com a cara no asfalto. As Havaianas surradas do que chegou por trás eram verdes. Talvez até já tivessem sido azuis. Ele chutou a arma da minha mão e me olhou por alguns segundos. Tenho certeza que ele não tinha dúvidas do que fazer. Que não observava o suor que me escorria o rosto ou as veias que me rasgavam o canto a testa. Nem sequer olhava o buraco que atravessara o abdômen. Então, eu amansei. Já ele, não hesitou. Apenas mirou no meio dos meus olhos e gritou “filho da puta!”.

Gonzaga Neto
Enviado por Gonzaga Neto em 28/12/2016
Código do texto: T5865211
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