BIOGRAFIA

- Não, agora não.

- Vá estudar matemática, menino. Tô mandando!

- Não...não...e não!

- Suas notas de geometria tão mais vermelhas do que num sei o que!

- Não gosto de geometria.

- Então, aprenda a gostar!

- Quero escrever...ser um grande poeta.

- Mas isso não dá certo.

- Por que, mamãe?

- Não dá dinheiro.

- Não quero dinheiro. Quero ser poeta.

- E vai morrer de fome, menino?

- Não sinto fome!

- Por que te dou de comer.

- Olha o que eu fiz...

“No meio do caminho tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

tinha uma pedra

no meio do caminho tinha uma pedra”.

- Não gostei...Repetiu a mesma frase várias vezes...Você num é poeta, e isso não é poesia. Nem rima tem...

- Não sou mesmo poeta. Eu disse que quero ser!

Em todos os dias acontecia a mesma discussão entre Carlinhos e sua mãe Marieta. Esse garoto de apenas dez anos adorava rabiscar alguns papéis com versos soltos, sem rima e métrica alguma. No entanto, Dona Marieta o obrigava a gostar de tudo, exceto de poesia.

- Você tem que ser médico. Um doutor. Rico. Famoso. Conhecido em todo o mundo.

- Não gosto de ir ao médico!

- Não precisa gostar.

- Mas...

- Nada – interrompendo Carlinhos – cala a boca!

- Papai, quero ser poeta.

- Você será meu filho.

- É mesmo, papai? Quando?

- Sempre.

- Sempre?

- Você será sempre um poeta.

- Olha o que eu fiz...

“João amava Teresa que amava Raimundo

que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili

que não amava ninguém.

João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,

Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,

Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes

que não tinha entrado na história”.

- Ficou ótima. Está muito bonita.

- Ouvi essa história lá no mercado.

- Só tem um problema...

- Você se esqueceu de assinar o seu nome embaixo.

- E precisa?

- Seria bom pra identificar que foi você quem escreveu.

- Coloco o nome completo ou apenas “Carlos”?

- Coloque completo. Fica melhor!

Carlinhos escreveu o seu nome em letra de forma, como se quisesse que todos percebessem, acabara de sentir-se eleito um poeta.

“ass.: CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE”

- Ficou legal, papai?

- Está ótimo!

- Não coloque essas besteiras na cabeça do menino!

- Foi ele quem colocou. Mas...qual o problema?

- Poesia não dá dinheiro!

- Ele não precisa. É apenas uma criança.

- Já sei a quem ele puxou!

David Cid
Enviado por David Cid em 07/08/2007
Reeditado em 03/04/2008
Código do texto: T596062