O SUICÍDIO DE UMA ROQUEIRA

Desde a primeira vez que estive com ela pareceu-me complicada. Interrompeu a melhor parte do contato para me dar uma bronca. "Não me chama disso... Não gosto! Que isso não se repita!" disse-me ela.

Não vou discorrer aqui sobre a minha maneira de fazer sexo virtual, mas confesso ter ficado chateada, chocada até. Num mundo de exibições virtuais, em que a Internet se transforma nas quatro paredes de um quarto tudo deveria ser aceito, pelo menos é o que acho e pratico..

Mas insisti, e desculpei-me numa outra vez. Falou-me que já tinha esquecido e que deixasse pra lá.

Naquele outro dia tinha voltado de um show onde substituíra o guitarrista de uma banda de rock. Fiquei sabendo então dos seus dotes musicais, e da intimidade que tinha com a guitarra. Lésbica assumida fazia questão de marcar posição diante dos meninos da banda, que insistiam em dar em cima dela. Nesse dia, contou-me, foi para um quartinho atrás do palco trocar beijos e carícias com uma namorada que arranjara na hora, para perplexidade do resto da galera. Pura ousadia e contestação.

E assim fomos conversando até madrugada e cansadas nos despedimos.

Até que veio uma terceira vez.

Estava deprimida, chorando até. Perguntei se tinha brigado com a namorada disse que não. Tinha sido um amigo da banda, uma punhalada pelas costas como classificou.

- "Estou me sentindo muito mal!" falou.

Já intuindo o que tinha sido perguntei:

- "Saiu da banda ou tiraram você?"

Não deu outra.. Tinha sido tirada do lugar que era sua maior paixão, de uma maneira inesperada para ela.

Indaguei como tinha sido, mas não quis falar.

- "Se tens talento e gostas do que faz vais superar. Agora é sentir a dor pra não esquecer, e não deixar acontecer de novo. É assim que se cresce!" contemporizei.

Minha tentativa de querer tirá-la daquele transe parecia não dar certo.

Ainda triste falou-me da sua vontade de querer morrer. Tentei impedi-la.

- "O que é isso! Não vale a pena... Tens paixão no coração e tesão no corpo. Uma chama melhor que essa não pode haver! É só um dia... Resista a ele!".

Loucura esta de estar a alhures de distância dando uma de CVV pela Internet.

- "Eu não quero sofrer mais... Quero mesmo é morrer!" desesperada exclamou.

Fiz uma última e maternal intervenção:

- "Morre não... Você é tão bonita, tão cheia de vida, tão rock'n roll...".

E continuei:

- "Estivesse ao teu lado te dava um colo gostoso, botava você colada nos meus seios para suas mãos afagar, tipo mãe zelosa..."

- "Vê eu... Passei fome perdi minha mãe e meu pai construí minha vida praticamente sozinha, e hoje estou aqui conversando com você... Sobrevivi... Estou sã e salva!" tentei confortar oferecendo-lhe o meu exemplo.

- "Duas coisas levam a vitória: raiva e fome. Tire dessa experiência de hoje a raiva que te conduzirá a vitória. Mostre que você tem talento, e que eles não sabem o que perderam..." filosofei querendo lhe animar.

- "Não tenho força nem vontade..." retrucou ela.

Nesse momento lembrei-me de um filme do Bruce Wills em que ele pula do alto de um arranha-céu com um suicida maluco, a contragosto do cara que estava somente querendo se exibir.

- "Então se entrega! Se gostar de droga tome uma overdose... Se tiver remédio para dormir tome um vidro... Se encontrar uma arma atire contra a cabeça... Ou então vá pra beira da lagoa, e mergulhe. Antecipe o mais rápido possível o teu final para não ficar sofrendo. Foda é ficar sofrendo por uma coisa que tem remédio" falei.

Como já estou ficando acostumada com as maluquices e as neuroses que se passam no meu mensseger, não dei ouvido para a sua última e inesperada decisão:

- "E quer saber... É o que vou fazer agora!!! Boa idéia! Tenho remédio faixa preta aqui pra eu tomar amanhã de manhã, e vou tomar tudo agora!!!" completou de uma maneira desafiadora e impertinente, comum a toda jovem.

- "Espero que tenhas sucesso... Foi bom te conhecer" encerrei a conversa.

- "Adeus então... Estou indo!" foi a última frase dela nessa nossa conversação.

Fiquei pensando... Será que ela morreu mesmo... Acho que não!

Ou será que foi mais uma dessas tentativas de golpe pela Internet para que eu, desesperada lhe desse o número do celular, ou coisa assim.

Fui dormir tranqüila. Tinha cumprido a minha parte.

(Do Livro Digital "Diário de Uma Safada" - Coleção "Cadernos Devassos")

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