Ziguezagueando 22

Ziguezagueando 22

Não teve mais notícias de Hugo. Na conversa, comentou onde trabalhava, qual era seu endereço, sitou somente o nome do edifício, e a localização aproximada da feira.

Tocava a vida sem cobranças, sabia que aquele encontro foi feito para ser somente o encontro. Hugo era homem solitário. Ela, não diferente, tinha aprendido viver dos próprios recursos no interior, mesmo minguados, o básico, kit de primeiros socorros , o arsenal para não desistir da sobrevivência e cair na tristeza, tinha garantido, era uma adestradora do próprio emocional. Isto bastava.

O que experimentou naquela noite, de tão bom, indizivelmente bom, não merecia destaque para ser acarinhado na mente. Como perfume caro, passou ser usado de pouquinho como lembrança. A estratégia de ida não autorizava baixar guarda para instabilidade emocional.

A vida andava, os dias indo e vindo, o Sol, acarinhando a Lua, numa dança que ditava encontros e desencontros, refletindo seu calor,a energia nela em vários ângulos; minguante, crescente, nova, cheia, no eixo imaginário, que somente ele sabe para onde vai, levando ela e o resto, atraídos sob o império de sua vórtice.

Talves a Suprema providência, Deus, Aquele que nunca foi mas sempre É, princípio universal que rege as coisas e seres na criação, aquele que arquitetou a realidade para acontecer, fez o Sol, a Terra, a superveniente e intermitente Lua, tudo para servir a suprema Obra, que é o criado em todas as suas extensões e profundidade.

Deu como condição para existência, manutenção e perpetuação, o pré-requisito de que a natureza funcione dentro da dual e inarredável força feminina e masculina, tanto comentadas pelas culturas míticas, místicas e religiosas dos tempos. E o mesmo quando criou o homem e a mulher.

A Terra segue, no contato e força concedida pelo Sol, que acarinha-a, em estado oposto do dia, na busca do alinhamento, sempre na lei incansável da atração, ditando os encontros.

Hugo, depois da noite com Jovita, não teve leitura alguma que pudesse trazer em palavras o mistério, o secreto inexplorado que aquela mulher despertou nele. Havia sido convertido no mistério, mesmo sem ter informações práticas de quem ele era. Conheceu Jovita por outros sentidos, diversos dos cinco do corpo. Encontrou um certo limite para sua solidão.

A pequena se tornou uma pedra no caminho do solitário, agora, havia uma pedra no caminho, não como tropeço, mas ornamento que o incomodava pela sua definição do ser. Jovita era pura na sua representatividade, não tinha véu que a encobria, não para ele. Tinha uma descomplicação tremenda no agir que era justamente o veneno de que precisava para cura da sua estagnação afetiva. Até para trazer a tona suas feridas, seus fracassos, a beleza, o encantamento de Jovita, o surpreendeu. Tornava-a indecifrável, escrutínio secreto, irrevelado, gigantescamente belo. Não tinha arma para lidar com aquilo.

A autossuficiência, aquela que trazia como troféu, naquelas poucas horas que manifestou, ficou dispensável, preterível, e ao mesmo tempo, compelia-o tomar atitude para completá-la em sua essência, que assim como ele, estava manca, abandonada.

Márcia Maria Anaga
Enviado por Márcia Maria Anaga em 23/06/2018
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