O PEQUENO CIRCO DA MAIOR IDADE*

"CIRCO DA MAIOR IDADE! ÀS 23:00hs"

O anúncio o deixou intrigado. Escrito em cartolina, por cima de um portão de ferro antigo, todo enferrujado, e com uma criança na frente trajando um terninho abarrotado e anunciando a atração.

- Meu Deus! Se fosse planejado não seria tão século XIX! Menino, que é isso aí?

- Um grande show! Algo inacreditável! Eu e meu irmão montamos para sustentar nossos avós.

- Sério? São dez para as onze, vou querer assistir. Quanto custa o ingresso?

- 10 reais

Pagou e o menino o conduziu para dentro da casa. Esta era um casarão antiquíssimo, caindo aos pedaços. O levou até um quarto enorme, separado por uma cortina. Cerca de quinze cadeiras de plástico formavam uma pequena platéia. Havia sete pessoas nela. O menino de terno voltou:

- Respeitável público! Que o show comece!

As cortinas de abriram e apareceu um casal de idosos, com seus lá 70 anos, deitados em uma cama. De repente o velhinho se virou e murmurou:

- Vaca, mocréia!

A velhinha se virou e ainda dormindo também balbuciou:

- Corno! Eu ainda coloco veneno na sua comida! Desgraçado!

- Não sei como não te encho de porrada, velha maldita!

E ladeira abaixo ia a conversa sonâmbula, indo abaixo do nível do mar. A platéia gargalhava. De repente passou outro velhinho, este de andador, puxando um pequeno torpedo de oxigênio e com um cigarro e um isqueiro nos dedos. Quando percebeu que as pessoas estavam alí, levou o dedo indicador à boca:

- Shiii!

E voltou a andar até uma sacada onde acendeu o cigarro. De vez em quando acendia o fogo e colocava o cateter de O² perto. Sorria ao ver a chama aumentar.

De onde ele veio apareceu uma senhora de bengala e pijama:

-Oh seu véio teimoso dos diacho! Se acha que eu num sei que cê foi fumá...

Quando percebeu que estava sendo vista parou perplexa. Seu olhar se perdeu no nada. O menino anunciou:

- Agora na passarela, no desfile de roupas de banho, a linda representante de São João de Passo Fundo! Vejam a elegância, a beleza e, cá entre nós, as curvas, desta linda moça!

Ele viu uma metamorfose na idosa. Ela se arqueou, começou a andar como uma miss, acenando e mandando beijos. O menino lhe entregou um ramalhete de flores murchas. Ela fez cara de envergonhada e depois passou a se abanar e agradeceu se curvando. Voltou ao quarto. O velhinho da sacada ria a larga. Isso quando conseguia parar de tossir. A impressão que dava era que ia ter um treco a qualquer momento. Ao fundo se ouvia:

- Vai fazer meu café, lazarenta!

- Vou fazer e jogar no seu pinto murcho, véio do caralho!

Os risos dos outros espectadores só aumentavam enquanto ele só conseguia chorar.