Primeiro Conto

Dia 25 de dezembro de 1967 foi um dia de felicidade para Seu Jorge, não porque era Natal, mas foi neste dia que ele ganhou o maior presente que poderia ter ganhado em toda sua vida, neste dia nasceu seu primeiro e único filho, que recebeu o nome de José.

Criado como todo ser humano, Seu Jorge acreditava que o homem nasceu para procriar. E ter um filho seria a maior prova de sua virilidade para com o resto da sociedade.

Seu Jorge foi nascido e criado na pequena cidade de São Sebastião do Agreste, um povoado de três mil habitantes distribuídos pelas imensas fazendas que existiam na região, aos dezoito anos de idade casou-se com Maria da Consolação. Mudou-se logo após para Jurupará uma cidade maior onde começou seu trabalho de carpinteiro com o qual pode sustentava sua família.

Antes do nascimento de seu filho Seu Jorge já havia comprado para o mesmo uma camisa do seu time de futebol preferido e foi a primeira que o pobre menino usou. Assim que chegaram em casa pegou-o no colo e saiu pela cidade mostrando a todos, amigos e familiares, o seu lindo filho, não que era lindo o menino, mas pai é pai.

O sossego não durou muito tempo, José que nasceu chorando parece não ter aprendido outra coisa na vida a não ser chorar. Foram noites e noites perdidas em função da criança, e quando Seu Jorge já não agüentava mais resolveu mudar do quarto e ir dormir na sala, porque senão não daria mais conta de trabalhar.

A sua cama, o seu leito matrimonial foi a primeira de tantas outras coisas que Seu Jorge perderia em função deste grande presente. Sua segunda perda foi a atenção e o carinho de sua mulher que agora já eram todos de José, que passou a ter ciúmes do pai, e era uma manha desesperadora quando Maria da Consolação se aproximava de Seu Jorge.

Seu Jorge trabalhava dia e noite para manter a família, foram fraudas e mais fraudas, leites e mais leites, remédios e mais remédios, um dinheiro que investido em uma poupança já daria para ele até comprar um terreninho para construir sua tão sonhada casa própria.

Mas não Seu Jorge era um homem, um cristão, tinha que ter um filho.

José cresceu e foi para a escola, agora Seu Jorge achava que os problemas diminuiriam, mas estavam só começando.

José não se adaptou na escola, na verdade, não iria se adaptar em nenhuma escola, pois não gostava de estudar, nunca gostaria. Matou muitas aulas, repetiu muitos anos, brigou com muitos meninos, retrucou muitas professoras, enfim foi a continuação de um tormento que não parecia ter fim.

Seu Jorge já mais do que desgostoso da vida com tantos problemas, perdeu a sua paz e a tranqüilidade que tinha quando ainda eram só ele e a esposa, um tempo em que parecia um amor, um namoro eterno.

Seu Jorge passou a escrever alguns poemas saudosistas deste tempo, embora sem estudo, ele conseguia passar para as folhas de caderno o que sentia, e um de seus poemas mostro-lhes agora.

O tempo não acalma o sentimento

Que remete ao quadro de minhas memórias

Paisagens de um amor que não cheguei a viver

Este sentimento tão revolto quanto a tormenta

Dilacera o meu corpo

E me deixa perdido

Entre as sementes de sonhos

Que não puderam brotar...

Saudade, saudade...

O que tens feito de mim?

Quando José completou seus 15 anos começou o maior e último tormento que levaria Seu Jorge a perder o que mais tinha de valor. José se embrenhou pelos caminhos das drogas. Foi terrível, foram dias, noites, semanas, meses e anos de agonia, de luta na esperança de que um dia todos acordassem e vissem que era apenas um pesadelo toda esta história.

Inicialmente ninguém percebeu, com o passar do tempo José começou a passar dias fora de casa sem dar noticias, posteriormente começaram a sumir objetos de pequeno valor, na verdade a casa não tinha nada de muito valor mesmo, até chegar a ponto de José começar a bater nos pais para lhe angariar dinheiro para sustentar sua droga.

A vida de Seu Jorge já não existia mais, ele era um nada, e assim se sentia diante de tão grande tragédia. Seu Jorge sempre foi um homem forte, esperançoso, mas sua garra jazia no tumulo da desesperança.

No dia 01 de janeiro de 1987 numa luta tremenda para não apanhar do filho que já era um homem bem mais forte que ele, Seu Jorge ao tentar correr caiu da escada que dava para o quintal da casa, vindo a falecer instantaneamente devido a um traumatismo craniano.

Neste dia Seu Jorge perdeu o seu maior e mais precioso bem sua vida...

José nunca foi preso... e Maria da Consolação faleceu de desgosto um ano depois...

Willian Figueiredo
Enviado por Willian Figueiredo em 19/10/2007
Código do texto: T701238
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