Subemprego

Um corpo jaz no asfalto.

Caiu de moto.

"Estava vindo muito rápido", alguém diz.

(Por isso poderia ele ter sido um piloto de corridas, um líder tomador de decisões?)

"Passou entre os carros tirando fina, você viu?"

(Quem sabe ele poderia ter sido um atirador de elite, um perito com reflexos rápidos?)

Escorre pelo chão úmido da cidade um líquido escuro. Será a Coca do cliente, óleo da moto ou... Sangue?

Alguém pega logo o celular e disca pra emergência. Naquela noite, uma família vai chorar. Uma criança vai crescer sem referencial. Duas ou três, quem sabe. "Esse povo tem tanto filho, né!"

Sim! Povoam o mundo. Um mundo carente de ação e cheio de desesperança. Povoam esse mundo com gente, braços e mentes com esperança de melhoria.

Naquele corpo caído, sem opção de emprego das suas habilidades na economia, só lhe restou as manobras pelas ruas. Manobrando nos bicos e subempregos. Que bom engenheiro, operário ou administrador seria! Por que não?

Para surpresa geral, o corpo se mexe. Levanta um braço, uma perna, se põe sentado. Alguém ajuda, o povo tem bom coração. Ele faz sinal de positivo, dá uma mancada e bota a moto de pé. Geral aplaude, alguém pergunta se está bem mesmo.

Meneando a cabeça, reajeita a bag nas costas e dá partida na CG. O cliente está esperando. Sua partida dispersa a multidão num zumzum baixo, curioso.

O sol brilha e os sons da cidade são motores e algum vozerio. Um ou outro pardal pia, mas o rolar das motos e dos carros dá o tom.

Cadê a sirene das fábricas? Cadê o barulho das soldas, furadeiras, tornos? Cadê os caminhões buscando produtos e trazendo insumos? Para onde tudo isso foi?

Não sei, mas vou abrir um IFood pra pedir comida. Falou!

Eudes de Pádua Colodino
Enviado por Eudes de Pádua Colodino em 26/02/2021
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