O SEQUESTRO

- CLÉA MAGNANI

30 de dezembro. Naquela manhã Silvana acordou mais cedo. Teria muito o que fazer. Sua filha Cristina sairia da Maternidade na parte da manhã, Leandro, seu genro, a iria buscar; e ela, que passara os dois dias anteriores com a Cristina, iria preparar o almoço e aproveitar para levar o carro da filha com o qual ela havia voltado para sua casa na véspera. Arrumou o almoço para Mário, o filho solteiro que morava com ela desde que ficara viúva, e foi para a casa da filha, no mesmo bairro. Logo conheceria sua primeira netinha. Chegou antes do casal. Deu as primeiras ordens à empregada da filha, Elvira, que havia trabalhado em sua casa por anos, e agora estaria ajudando a jovem mãe em suas atribuições de mãe de primeira viagem, e foi preparar o almoço. Assim que Cristina desceu do carro, Silvana pegou a netinha e correu para dentro a fim de conhecê-la. Ludmila seria seu nome, era linda! Loirinha como Cristina, e certamente teria também olhos azuis como a mãe e o avô que não a conheceria... Todos os cuidados com o bebê foram passados para Cristina, mas Silvana fez questão de dar o seu primeiro banho em casa. Foi um dia maravilhoso, quando Silvana pode relembrar os cuidados que teve com seus dois filhos mais velhos e com Cristina, sua princesinha. À noite, ainda inexperiente, Cristina precisou de ajuda para dar de mamar, e para trocar Ludmila. E para isso sua mãe ficou na casa da filha, para ensinar e ajudar. Pela manhã, todos dormiam até mais tarde. Elvira tinha as chaves, entrou, arrumou a mesa e estava saindo para buscar o pão quentinho para o café da manhã da família, quando dois homens encapuzados a fizeram voltar para dentro da casa. Foram até o quarto onde Silvana dormia, e a tiraram da cama de pijamas, e a levaram com eles. Elvira gritou desesperada, Leandro e Cristina acudiram e não entendiam o porquê... O que estariam querendo de sua mãe? Elvira dizia que nada conseguia ver, pois os dois usavam capuz. Passaram o dia todo atônitos. O Delegado que os atendeu dizia para estarem atentos aos telefones, pois certamente ligariam. 3 de janeiro, à noite ligaram para a casa de Leandro dizendo que Silvana estava bem, que só queriam um polpudo resgate, e que não avisassem a polícia. Se fizessem tudo direitinho como eles exigiam, Silvana poderia passar seu aniversário, 6 de janeiro em sua casa. Caso contrário eles nunca mais veriam sua mãe. Concordaram. Prepararam o resgate e foram ao lugar indicado, do outro lado da Cidade, para levar o dinheiro em notas dentro de um saco de lixo que seria deixado ao pé de um coqueiro existente no local. Leandro e Mário imaginavam que sua mãe estaria lá para ser libertada contra o pagamento, mas não foi assim. Horas depois receberam outra ligação dizendo que, como agiram de acordo com o exigido, aguardassem por outro telefonema. A angústia era imensa. Cristina, com o choque, não conseguia mais dar de mamar. Cláudio, o outro filho, passou a ficar na casa de Cristina que era sócia de Virgínia, sua esposa, em uma empresa. Na verdade, era Cristina o alvo do sequestro. Como seu carro passou 2 dias com sua mãe enquanto ela esteve na Maternidade, quando viram o carro no jardim da casa, imaginaram que Cristina estivesse em casa, e agiram.

Finalmente um telefonema na madrugada do dia 5 de janeiro. A voz dizia que poderiam preparar a festa de aniversário, que Dona Silvana iria voltar para casa naquela manhã.

ARISTEU FATAL

Os sequestradores eram altamente qualificados. Silvana foi levada para um local desconhecido, pois também não pode ver o caminho já que lhe colocaram um capuz. Ao chegar na casa aonde ia ficar, tiraram-lhe a venda e ela pode enxergar que se tratava de uma bela mansão, recém construída, numa bonita chácara, isolada de qualquer outra propriedade. Ao adentrar na sala, viu que não era a única mulher que ali se encontrava.

Estavam outras quatro senhoras, todas bem arrumadas, chorosas e sobressaltadas, demonstrando também terem sido sequestradas. Era uma sala muito extensa, luxuosamente decorada, com diversos ambientes, sofás de diversos tamanhos e cores, uma lareira, luzes indiretas, toda acortinada, tudo com enorme bom gosto. Ao centro, havia uma extensa mesa com tampo de vidro, onde estava servido um café da manhã, tipo colonial, com bolos, tortas, pães de diversos tipos, sucos, frutas. Sentadas, as senhoras uma longe das outras, pareciam estar num encontro entre amigas, tirando, é claro, o fato de terem sofrido atos de violência, sem, contudo, haver qualquer tipo de lesões ou machucaduras. O ambiente era guardado por duas mulheres, bem vestidas, bonitas, em posições estratégicas. O único aspecto que diferenciava o local de um outro qualquer, seria o fato de não possuir sequer um meio de comunicação externa, TV, telefones, intercomunicadores. Somente as guardas possuíam celulares. Enfim, as sequestradas estavam num lugar tranquilo, sem nenhum tratamento violento. Ao contrário, pareciam estar em um resort de primeira categoria. Os sequestradores jamais apareciam. Suas ordens eram transmitidas às guardadoras, através do celular. Silvana, como as demais, chorava, com medo. Sentou-se num dos sofás apreensiva, encurvada, rosto nos joelhos, com as mãos tampando os olhos. Só pensava em Cristina e a netinha. A filha deveria estar preocupadíssima com o que estava acontecendo, com sua mãe vítima de sequestro. Amanhã, seis de janeiro seria seu aniversário. Cristina tinha preparado tudo para comemorar. Será que os bandidos foram sinceros, iriam cumprir a palavra? Não era possível a hipótese de eles deixarem de devolver sua mãe, sã e salva, após pago o resgate!

ALBERTO VASCONCELOS

Desde o momento em que a polícia foi notificada, um veículo com rastreador de sinal telefônico ficou estacionado em frente ao portão e vários policiais estiveram presentes na residência fazendo perguntas sobre o ocorrido. Entre eles havia uma linda jovem, vestida com jaleco de enfermagem com as divisas de Tenente estampadas nos ombros, extremamente gentil e sempre presente em todos os procedimentos feitos com Ludmila, banho, aleitamento, troca de roupas e era sempre a primeira a chegar junto ao berço da pequena cada vez que ela chorava. Em conversa com Cristina, disse ser mãe de gêmeos e que tinha muita prática no trato com recém-nascidos, o que, por diversas vezes foi demonstrado. Passava das três horas da madrugada do dia 6 de janeiro quando mais uma vez o telefone tocou e todas as atenções se voltaram para o novo comunicado dos sequestradores, Ludmila chorou e a gentil policial antes de qualquer outra pessoa foi até o berço e levou a pequena para o banheiro. Findo o telefonema dos sequestradores com mensagem de voz da vítima e a indicação de onde Silvana poderia ser encontrada, Cristina foi ao banheiro, mas não havia ninguém lá. Ludmila e Marilu, a pretensa policial, sem qualquer comunicação haviam desaparecido para sempre.