AMOR À CARTOMANTE

Às vezes, quando eu estou por aí e me deparo com o dia a amanhecer, o sol singelo aparecendo lentamente no céu e os pássaros a cantar pelas árvores, sempre fico mais feliz!

É incrível como pequenas coisas podem fazer uma grande diferença na nossa vida.

Era assim que Ricardo se sentia naquela tarde, ao ouvir a cartomante declarar que a mulher o amava e o livro era a porta para o amor. Saiu da sala escura radiante. O coração batia acelerado na sinfonia do amor. Agora, era real, ele sabia que Mariana o amava.

No ônibus, abriu a mochila, tirou um caderno e decidido começou a escreve – “era hora de revelar seu amor”.

Caro leitor, não sei se já se deparou com uma situação assim: Sentir a alma leve e as palavras escorregarem suavemente pelo papel.

E com a competência dos poetas escancarou seu amor e apresentou mil razões por que a amava – era linda, meiga, morena, inteligente. Tudo é perfeito quando a gente ama. Você há de convir comigo que os defeitos só aparecem depois. E olhe, todo mundo têm os seus.

Sonhou os sonhos dos amantes naquela noite. No dia seguinte, chegou cedo à escola, abriu novamente o caderno e acrescentou uma ou duas frases. Gelou ante a decisão de assinar – não assinou, afinal a cigana declarara que a mulher o amava.

Resoluto, dobrou a confissão, e a pôs no livro que comprara há alguns dias desde que descobriu que a amada desejava lê-lo, e o depositou junto a uma rosa sobre a carteira de Mariana.

Quando a aula iniciou, ficou pensando como a garota reagiu, não conseguiu se concentrar na aula, pouco interessava saber PG ou Interjeição ou mesmo ótica e biologia.

Há dias assim, se deseja que o tempo passe, almeja-se o futuro, mas o presente insiste em permanecer. A gente parece refém da própria angústia e se sente frágil diante da vida.

O tempo custou, mas passou e quando o sinal tocou, seus passos atropelaram a porta e antes que a primeira criatura aparecesse no corredor, ele saiu apressado, avançou à porta e com um sorriso sem graça ficou esperando a vida acontecer.

Um a um todos passaram, menos ela. O corredor ficou vazio, de repente seu mundo ficou confuso: “cadê ela?”. Cabisbaixo seguiu pelo corredor, entrou na sala e viu no chão a rosa esmagada e no lixo o papel que embrulhava o livro.

Regressando pela biblioteca, viu na praça da escola Mariana sentada, ouvindo música no MP3. Ficou hipnotizado, não sei dizer com exatidão o que aconteceu dentro dele, mas você que já viveu uma paixão avassaladora me entenderá.

De repente, não mais que de repente o celular toca. Duas ou três palavras e a jovem saiu correndo pelo corredor e desceu as escadas. Um jovem a esperava com um livro na mão, falaram-se carinhosamente e se beijaram e lá se foram pela rua como dois amantes abraçados. Ficou apenas olhando pela janela.

É triste quando depois de tanto esforço e dedicação, nossos sonhos caem pelo chão como uma vidraça que se espedaça. Mas o coração sempre agüenta, ele também foi feito para sofrer!

A verdade só veio anos depois: Rodrigo se apoderara do livro, jogara a rosa no chão e o papel no lixo. Mariana nunca soube do amor de Ricardo e ele sofreu por acreditar nas aparências.

Às vezes, em noites tristes, Ele sonha com Mariana e a cartomante dizendo: “A mulher te ama e o livro vai te revelar” – É engraçado como a gente acredita em cada coisa!

Fander Miller
Enviado por Fander Miller em 05/12/2007
Reeditado em 23/05/2008
Código do texto: T765963