Magnétika- cap. 15

Voltamos para dentro da casa; seu Jô estava bravo e desanimado, mas não relatou a situação para Dona Zulmira imediatamente; tomou a sopa em silêncio, mas ela sabia que havia algo errado:

-O que foi?

-Nada!- Disse , emburrado.

Eles tinham chegado ali há muitos anos, vindos de longe, sem ter onde morar; acharam aquela casa abandonada, limparam, fizeram uma ligação de luz, outra de água, pintaram as paredes, plantaram, criaram galinhas . Seu Jô sempre ajuntava livros velhos e, melhor, lia todos. Com isso conseguiu, com um amigo sendo fiador, alugar uma portinha na parte de cima, perto da faculdade, onde as pessoas vinham buscar livros pedidos nas aulas a preços mais baixos.

Era muito estimado pelos alunos e pelas pessoas apaixonadas por "sebos", mas se dizia um "velho alfarrabista"; era um nome bonito e pomposo e... era como sustentava sua grande família.

Agora tudo poderia vir abaixo; imaginava-se tendo que pagar dois aluguéis, um já não era barato. Esse é nosso país, em que um naco de terra ou um teto para morar é pago a preço de ouro. Nem vou falar das extensas terras que esse país tem.

Nos meses seguintes tiveram a visita indesejável das pessoas da construtora que queriam resolver tudo amigavelmente; dariam até uma mísera indenização à família, como se isso fosse algo digno de nota :"não temos obrigação, pois é uma invasão; com os outros sim; estamos sendo generosos"

Seu Jô nem ouvia; ia enrolando,até as máquinas chegarem. Dona Zulmira ficava apreensiva, mas baixava a cabeça e não dizia nada. Os menores nem sabiam do que se tratava; os maiores tinham uma ideia do que acontecia. E a vida continuou normal por um tempo.