Como se não houvesse amanhã

Ele tinha combinado com ela às 19:45 no Parque Independência. Ela estava atrasada. Ele estava adiantado. Havia muitas pessoas por lá. Andando abarrotados, uns tropeçando nos outros. Sem rumo, de lá para cá. Jefferson se incomodava com isso e se perguntava para que tanta gente? Porque estavam ali para atrapalhar o seu encontro. Como ele a reconheceria se nunca haviam se visto antes? Ele já estava arrependido de marcar esse encontro com a Andressa. Porém já estava ali. Depois de se conhecerem vitualmente em um aplicativo de encontros ele estava ali, colocando mais uma vez sua confiança em alguém que não mereceria sua confiança.

Estava irritado consigo mesmo, e também com ela por tê-lo enganado. É golpe. Repetia em sua mente sem parar. É golpe. 19:57 e nada dela aparecer. Nada de dar as caras. E a ansiedade? Como conter a ansiedade. Ela havia prometido tanta coisa a ele? Ela prometera a sua mão, o seu sonho, o seu desejo. Mas agora estava tão atrasada que essas promessas começavam a se esvair de seu ser. Jefferson olhava aquele monte de gente andando sem parar, em sua frente, uns o acotovelavam. Será que eles sabiam que Jefferson fora enganado?

Uns macacos, ele repetia em sua mente. Uns macacos! Gritava de dentro de si. 20:04. Cadê essa mulher que havia garantido que estaria lá às 19h45? E que horário é esse? Por que não haviam combinado um horário certo? Ela devia estar ainda em sua cama. Nem havia se levantado. Devia ter cochilado e esquecido a hora. Devia estar comendo, jantando. Ela devia estar se olhando no espelho para ficar bonita para ele. Devia ter se arrependido também de marcar esse encontro. Não sabia.

O que aconteceu com ela? 20:16. Um ônibus parou na rua do Parque. Crianças desceram. Todas correndo de um lado para outro, a professora estava tentando arrumar uma fila, em vão. As crianças estavam certas. Nada de obedecer a qualquer ordem vigente. Correndo, brincando, brigando. Eram crianças de todos os tipos. Do outro lado da rua, tinha alguns bancos e pessoas sentadas pensativas, filosofando sobre a vida. Programando os seus dias em suas mentes. Decidindo separar-se de suas esposas ou maridos.

20:32. Andressa não deu sinal de vida. Teria morrido? Teria perdido seus pensamentos? Estaria ela com outra pessoa? Jefferson não sabia o que pensar mais. O suor no rosto. Estava cansado de tanta demora. Ligou seu celular e pensou em ligar para ela? Porém, e se ela pensasse que ele estava incomodando-a? E se ela pensasse que ele estaria invadindo alguma privacidade? E se ela ficasse furiosa? Temeu. Não ligou. Não tomou atitude nenhuma a não ser esperar.

Estava tarde. 21:01. Já chega. Vai cancelar o encontro. Muitas pessoas estavam em sua frente. Contra ele. Julgando-o. Ele se sentia pequeno diante de tanto julgamento. Estava irritado com tantas palavras contrárias a ele. Essa multidão não estava nem olhando pra ele. Nem o percebiam, porém sua mente dizia o contrário. Qualquer movimento e ele estava pensando em brigar com qualquer um desses macacos. Ele por vezes decidiu ir brigar com algum desses. Porém, quando estava perto ele desistia. Medo. Medo de apanhar, medo de pensar que algum pudesse dizer qualquer palavra. Acovardava-se. Ele não era de briga. Mas queria ser. Era covarde demais pra isso.

21:10. Uma sombra surgiu de trás dele. Era uma sombra de mulher. Ele virou-se para o outro lado. Será que era ela? Ela se apresentou. Era Andressa. Estava exatamente como ela tinha dito que estaria. Usaria um vestido provocante. Vermelho, como ele disse que gostava. Batom combinando. Um óculos escuro na cabeça só pra ele identificá-la.

- Oi Jeff. Tudo bem com você? Demorei muito?

- Não, de maneira nenhuma. Eu acabei de chegar.

E continuaram a conversa, como se estivessem conversando no aplicativo. Como se não houvesse amanhã.

Eduardo Eide Nagai
Enviado por Eduardo Eide Nagai em 05/12/2023
Reeditado em 05/12/2023
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