O HOMEM DO FACÃO
Chegou ao portão, encostou o saco cheio de coisas que podem ter valor, bateu palmas, olhando para o final de um dos lados da rua.
Quando o dono da casa surgiu, disse que capinaria a calçada, bem direitim, naquele mesmo momento, por 10 contos.
Viu o moço olhar para o facão e depois para o mato que crescia na calçada; percebeu que o moço, que mastigava um pedaço de carne, parecia desconfiado. Insistiu, com palavras e com o olhar. O outro concordou.
Antes, o senhor pode me arrumar um copo d’água?
O outro foi buscar. E ele começou a capina.
A água veio, e quatro grandes goles secaram dois copos. Sentiu um alívio profundo e quase sorriu. Havia muitas coisas em seu íntimo precisando de alívio. Voltou à capina.
Em alguns minutos terminou. Pegou o saco e chamou de novo o dono da casa. Este lhe entregou 4 reais a mais que o combinado. O homem do facão reagiu com gratidão, quase sorrindo, quase conseguindo esconder as coisas que dentro dele precisava urgentemente de alívio.
Partiu para o lado da rua que olhava quando parou no portão. O saco nas costas, o facão na mão e os não-sei-quantos vazios no íntimo, impossíveis de esconder e de preencher com os 14 contos que agora brilhavam em seu bolso.