SOBREVIVÍ
Era uma daquelas tardes chuvosas
no mês de Fevereiro de 1988.
Eu e um casal amigo,
fomos para uma de suas muitas propriedades
de família abastada, no município de Caucaia,
nas proximidades da Praia de Icaraí, Ceará.
Estacionamos o automóvel até onde a estrada
afunilou em uma trilha estreita.
Dali em diante, fomos em fileira,
com máquinas fotográficas,
em trajes de banho e chapéus.
Essa propriedade na verdade era deserta
e meu amigo mal conhecia,
já que seu pai não havia construído
nenhuma edificação de apoio.
Era mato mesmo,
e nós, no afã da mocidade,
em busca de aventuras,
gostávamos de fazer caminhadas
nos fim de semanas.
Em outras empreitadas já havíamos subido
a Serra da Rajada (Maranguape)
entre pedras e riachos,
comendo manga,
parando pra tocar uma viola,
proseando com os moradores nativos,
e visitando uma propriedade onde outrora
havia sido local de senzala:
- Escravos eram maltratados
com correntes e tudo mais.
Fazíamos perguntas,
nos sentíamos repórteres
em começo de carreira.
Levávamos à sério
nossas pesquisas e descobrimentos.
Tudo era fotografado!
Dessa vez,
queríamos apenas fotos selvagens
em meio à fauna e flora,
alguns mergulhos num riacho próximo,
e finalmente voltarmos para a propriedade
confortável no sítio Camurupim.
Ao vermos aquele riacho
cheio das chuvas da temporada,
não resistímos e mergulhamos na água
e foi aí que tivemos a triste idéia
de nos deixarmos levar pela correnteza.
Concluímos que retornaríamos
ao local de partida pela margem,
e finalmente estaríamos no sítio
antes do anoitecer.
Só que a situação não foi bem assim...
Na verdade nos perdemos feio,
ficamos à procurar nossos pertences,
já que a chave do automóvel estava
dentro de um dos chapéus...
Não conseguímos
encontrar o carro estacionado,
ou o caminho de volta,
nem mesmo as nossas roupas,
toalhas e a chave.
Foi aí que vimos a enrascada!
Começou a chover muito,
e já passava das 17:30h,
escurecendo rapidamente.
No meio do pântano,
com os pés atolados em lama e plantas,
encharcados e tremendo pela chuva torrencial,
eu parei,
quase chorando em desespero argumentei:
- Amigos,
agora perdidos sem saber o que fazermos,
cansados e sem rumo,
vamos orar ao Deus de todas as coisas,
ao Amigo fiel nos tempos difíceis,
ao Supremo dos impossíveis!!
E em meio ao caos,
clamamos em uma curta oração.
Naquele momento uma voz suave
falou-me ao coração:
- Filha, ao terminar a oração,
aonde teus olhos avistar,
é por onde tu irás!!
Assim, ao abrir meus olhos,
fixando num ponto à minha frente,
falei aos meus amigos:
- O caminho é por aqui, vamos!!!
Pensei intimamente meio temerosa:
- E se essa voz não for a tua voz Senhor,
e sim, a minha? Aonde nós iremos?
Mas na benção do Criador,
era sua voz sim,
sua inconfundível carinhosa, voz!
Encontramos a trilha de volta!!!
Somente em trajes de banho, descalços,
molhados, cansados,
encontramos a rodovia escura.
E naquela noite gelada e chuvosa,
no molhado asfalto andamos,
andamos e andamos...
Às 22 hs chegamos no sítio Camurupim.
O pai de meu amigo assustado nos recebeu,
com toalhas e um quente jantar...
E nos exortou!
Nossos pés estavam em frangalhos.
Todo o nosso corpo doía e tremia de frio.
Nossas almas porém,
estavam gratas imensamente
pelo cuidado de Deus.
No outro dia,
ao buscar o carro e nossos pertences,
vimos com mais clareza,
o quanto andamos naquela noite...
Ah, tantos perigos!
Com certeza havia anjos do Senhor a nos guiar!!
"Clamarei ao Deus altíssimo,
ao Deus que por mim tudo executa.
Ele do céu enviará seu auxílio,
e me salvará..."
(SALMO 57: 2 e 3)