Meu pai, um ex-caçador

Meu pai...

Este homem, hoje com 64 anos, já fez quase tudo na vida.

Na sua juventude, foi um cara que gostava muito de pescar, de caçar, de beber, enfim, adorava (e ainda adora) a vida no campo, mas da caça, ele quer distância, e eu vou contar o porquê.

Quando ele tinha 28 anos, saiu com os amigos para um rancho na beira do Rio Pardo, chegando lá, fizeram o mesmo ritual de sempre: preparar as armas, o silibrim (espécie de lanterna), os cartuchos, a canoa, o motor de popa, a fisga, os remos, e tudos mais.

Saíram umas nove da noite e foram descendo o rio, com o motor desligado; meu pai era o piloteiro, isto é, o cara que fica na popa e comanda o barco, que rema na descida e manobra o motor na subida do rio, outro tripulante, ia no bico da canoa, usando o silibrim pra iluminar o barranco, e no meio ia o atirador, o que literalmente, mata a caça.

Quando eles já estavam desanimando e iriam voltar subindo o rio, o foco de luz descobriu uma capivara, mais que depressa, o atirador mirou e acertou, porém, a capivara não morreu de pronto, pois o tiro pegou na paleta, e nisso, o atirador carregou novamente a arma, quando meu pai disse:_ não precisa atirar de novo, pega a fisga e acerta o pescoço que ela não tem como fugir.

Acontece que a capivara tinha caído em uma galhada na beira do rio, e o atirador, afoito e imprudente, deixou a espingarda armada no canto da canoa, com o cano virado para trás, e ao passar sob os galhos, uma infelicidade, a arma disparou e meu pai foi atingido.

A sorte foi que o tiro pegou no ombro e o iluminador era médico, mais que depressa eles voltaram ao rancho e meu pai disse que dava para ver os pedaços de osso de seu ombro e o tiro queimava feito brasa.

O médico, grande amigo de meu pai, estancou o sangramento como foi possível e rumaram para a cidade mais próxima, que tinha mais condições.

Meu pai usava uma bota até o joelho, e a mesma se encheu de sangue, e precisou ser cortada no hospital para poder ser tirada.

O médico de plantão, disse na hora que meu pai iria perder o braço direito, pois o osso havia sido dilacerado com o tiro, então, o médico que estava com meu pai, mandou transferi-lo para um hospital de Ribeirão Preto. Lá, um grande ortopedista, fez uso de platina, evitando que meu pai tivesse o braço direito amputado.

Meu pai ficou 14 meses internado em um hospital, sofreu três cirurgias, ficou mais um ano com gesso e fez várias sessões de fisioterapia, todo o tratamento durou mais ou menos 4 anos e alguns bagos de chumbo ainda estão em seu corpo, pois foi impossível retirá-los.

Meu pai não caçou mais, até os passarinhos que ele prendia na gaiola, resolveu soltar, e diz que quando o tempo muda, e esfria, já que na época que ele sofreu este acidente estava frio, os chumbos doem em seu corpo.

Mas ele acredita que, apesar de ter perdido metade dos movimentos do ombro, foi ajudado por Deus, pois o tiro pegou no ombro e não no rosto ou no coração.

Apesar de tudo, ele nos ensiou, a mim e ao meu irmão, a usarmos armas, a sermos prudentes e saber para onde apontá-las, como guardá-las e a não subestimá-las, e principalmente, a não maltratar os animais.

BORGHA
Enviado por BORGHA em 23/01/2008
Reeditado em 23/01/2008
Código do texto: T829870
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