Fábulas de Allumbra – O príncipe maldito

Fábula de Allumbra – O príncipe maldito

Era uma noite fria como todas as outras, o vento uivava por entre as frestas da madeira. A lareira crepitava e ardia enquanto uma idosa senhora aquecia as mãos com o bafo quente de sua boca ressecada. Uma velha senhora solitária sem ninguém para ouvir suas lamentações.

De súbito a porta se abre e o vento frio invade a pequena casa, alguns flocos de neve flutuam levemente pelo ar. Surge uma sombra, um jovem homem, apesar do longo casaco que lhe cobria o rosto pela metade podia se ver seus olhos bem marcados. Disse a velha senhora que estava à procura de um abrigo e que havia fugido do ataque de lobos que estava a caçar pela floresta.

A senhora percebendo a aflição do desconhecido jovem lhe cede abrigo, um pedaço de pão ressequido e um copo de vinho para lhe aquecer a alma. Por algum tempo cultivaram um breve e vago dialogo. Quando a velha finalmente adormeceu o jovem curioso começou a observar a casa daquela estranha senhora. Alguns frascos estranhos por toda parte, livros velhos e empoeirados, animais de diversas espécies e um caldeirão que fervilhava aos pés da lareira.

O jovem confuso imaginou que aquela inofensiva e decrépita senhora se tratava de uma bruxa, imaginou que por de trás daquelas rugas bem marcadas e aparente bondade, estava escondida uma maldade sobrenatural. Sacou sua espada que cintilou e vibrou a luz da lareira, aproximou-se lentamente da poltrona onde a senhora adormecera e apontou a espada em direção ao seu coração, bradou em voz alta:

_ velha embusteira, es uma bruxa negra?!

A senhora assustada, acordou e o encarou com os olhos arregalados, levantou com dificuldade e apontou o dedo de unhas tortas para o jovem convidado, dizendo;

_ e assim que agradece o abrigo que lhe ofereço!? Comeu meu único pão e bebeu de meu vinho, jovem tolo!

A velha pressentia a sua própria morte, mas nenhum destes dois infelizes seres sabia que, a velha se tratava de uma antiga feiticeira branca que fora amaldiçoada antes do termino da grande era dos deuses. E o jovem se tratava nada mais nada menos que o príncipe aventureiro Fenrir do reino de Loren. Desde crianças, os habitantes de Allumbra são ensinados a odiar bruxas, pois elas foram sempre conhecidas como almas errantes e sombrias.

Então, neste momento o príncipe ergue sua espada para lançar o golpe sobre aquela que acreditava ser uma bruxa eremita. A senhora proferiu palavras desconhecidas ao ar e disse;

_ se minha hospitalidade e vil, agora serás amaldiçoado. Não encontrarás abrigo em nenhuma casa, viverá nas florestas sob a pele de um lobo, comera o que caçar, dormira sobre a relva noturna e a lua será sua única companhia. Se conseguir libertar seu coração de pensamentos dúbios e tiver um ato real de coragem, voltara a tua forma original...

Dito isto o golpe da espada de Fenrir sufocou o grito da feiticeira, fazendo seu corpo cair inerte ao chão. Fenrir sentiu seu corpo formigar e queimar, uma dor imensa explodia em seus músculos. A pele se tornou espessa e escura, e de suas mãos pequenas lanças de prata despontavam em seus dedos que se curvavam gradativamente. Fenrir correu exaustivamente pela trilha da floresta. Seus olhos já não viam como antes, seu olfato sentia aromas nunca antes conhecidos por ele. Correu enlouquecidamente até que alcançou o leito de um rio, colocou-se a beira para ver seu reflexo naquelas águas cristalinas. Teve vontade de gritar, mas de sua boca apenas um uivo triste era ouvido, o caçador havia se transformado em sua própria caça. Fenrir o príncipe amaldiçoado por um precipitado julgamento era o lobo de olhos amarelos que fitava o reflexo noturno do rio das lágrimas.

E a cada lua cheia você poderá ouvir o uivo triste e melancólico do lobo Fenrir.

Não é o fim, e sim apenas o começo...

Taiane Gonçalves Dias
Enviado por Taiane Gonçalves Dias em 01/09/2009
Reeditado em 11/07/2010
Código do texto: T1787596
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